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Paulo Torres Fenner

Professor de Colheita e Transporte da Unesp-Botucatu

Op-CP-47

O custo total da colheita florestal
A evolução dos sistemas de colheita florestal e da logística de abastecimento das indústrias florestais contribuiu fortemente para que o setor florestal brasileiro se tornasse um dos principais líderes globais na produção de madeira de reflorestamento.
 
A substituição do trabalho manual pelos sistemas mecanizados e automatizados, que, atualmente, predominam na maioria dos plantios florestais, proporcionou marcantes mudanças no planejamento, na organização, na administração e no controle operacional. Com a mecanização, diversos aspectos ergonômicos foram melhorados, com destaque para a redução do esforço físico, do absenteísmo e do número de acidentes de trabalho, entre outros. 
 
A redução da quantidade de mão de obra, por sua vez, tornou todo o gerenciamento mais fácil e ágil. Houve, também, um aumento na produtividade, na eficiência e na qualidade e uma redução no custo por metro cúbico de madeira. Por outro lado, a mecanização e as novas tecnologias expuseram novas restrições, problemas e desafios.
 
Sistemas de colheita florestal mecanizados com máquinas como: harvester, feller buncher, skidder e forwarder só são economicamente viáveis para grandes áreas. Além disso, para que essas máquinas tenham boa performance, a mão de obra precisa ser qualificada e altamente especializada. As árvores, preferencialmente clonadas, devem ter características específicas de casca, retidão, cilindricidade, galhosidade, diâmetro e altura. Com a mecanização, aumentou o consumo de energia e a emissão de CO2 por metro cúbico de madeira colhido. 
 
Em 2011, Becker, Fischbach e Fenner compararam sistemas de derrubada e extração de madeira e verificaram que tanto o consumo de energia quanto a emissão de gases de efeito estufa mais do que duplicaram ao substituir um sistema semimecanizado (motosserra e força animal) por um mecanizado (harvester e forwarder).
 
O setor florestal é reconhecido pelas remoções de GEE (gases do efeito estufa) e pelos estoques de carbono nas áreas de plantio e de conservação. Segundo estimativa publicada em 2016, no Relatório IBÁ – Indústria Brasileira de Árvores, os 7,8 milhões de hectares de área de plantio florestal no Brasil são responsáveis pelo estoque de, aproximadamente, 1,7 bilhão de toneladas de CO2 eq (dióxido de carbono equivalente). 
 
No entanto estima-se que, para a colheita mecanizada (harvester e forwarder) de 1 hectare de eucalipto, com 250 m3 de madeira, seriam necessários cerca de 37 mil kW de energia e seriam emitidas cerca de 3 toneladas de GEE. Se considerarmos que, no Brasil, é colhido mais ou menos 1 milhão de hectares por ano, teríamos um consumo de cerca de 37 bilhões de kW de energia e a emissão de 3 milhões de toneladas de GEE, apenas nas operações de derrubada e extração da madeira, sem incluir o transporte.
 
Embora sejam estimativas, elas servem para alertar que a busca por máquinas, veículos e sistemas menos poluentes se tornou uma questão chave para o setor florestal, especialmente neste momento, em que se discute a descarbonização da economia. A questão dos danos ao solo e ao meio ambiente é outro problema que ainda não foi resolvido. O cultivo mínimo e a eliminação das queimadas representaram um grande avanço nesse sentido. O emprego de máquinas equipadas com pneus de baixa pressão e a adoção de sistemas de colheita com o tráfego concentrado nos ramais de extração também contribuíram para reduzir os danos ao solo.
 
Porém a busca pelo aumento da produtividade vem implicando o emprego de máquinas maiores e mais pesadas, cujos efeitos sobre o solo ainda são desconhecidos. O emprego de máquinas e sistemas que têm como característica trafegar randomicamente no interior dos talhões, como usualmente acontece por exemplo com os skidders, resulta que, ao final da extração, praticamente toda área do talhão foi trafegada e compactada. Sabe-se que não é possível evitar o tráfego de máquinas durante a colheita. Entretanto quanto mais concentrado nas trilhas ou ramais, menores serão os danos causados pelo tráfego e menor será a área afetada pela compactação. 
 
Atrelado ao problema da compactação está o risco de erosão do solo. Sabe-se que, em geral, tanto no interior dos talhões quanto nas estradas florestais, o risco de erosão do solo é pequeno. Porém as mudanças climáticas expõem um novo cenário que poderá afetar a logística da colheita e do transporte florestal, afetando os preços e a disponibilidade dos recursos florestais. 
 
As mudanças climáticas vêm alterando os aspectos que mais interferem no processo erosivo, que são a intensidade, a duração e a frequência das chuvas. Chuvas mais intensas e mais frequentes aumentam o risco de erosão, especialmente nas áreas de relevo mais acidentado. 
 
Isso pode resultar em consequências tanto in site quanto off site. As consequências in site, como a perda de solo e de nutrientes, a abertura de sulcos, a deterioração das estradas e os danos às APPs, têm efeitos imediatos, pois reduzem a produtividade dos povoamentos e geram custos de recuperação. Já as consequências off site resultam no assoreamento de rios, lagos e represas, com custos ainda desconhecidos. O efeito conjunto desses diversos fatores: máquinas maiores, tráfego randômico e mudanças climáticas criam uma condição de maior risco de erosão.
 
Em suma, não se pode afirmar que máquinas ou veículos maiores são menos adequados, pois, por exemplo, caminhões com 50 toneladas de carga líquida, em geral, consomem menos combustível e emitem menos GEE por unidade transportada do que os de 40 toneladas. 
 
Muito embora o setor florestal contribua para a redução das causas do efeito estufa, é razoável acreditar que os efeitos das mudanças climáticas não serão eliminados em curto prazo. Também não é possível imaginar, em larga escala, o processo inverso da mecanização e da automação. Esse cenário revela que, além dos problemas já conhecidos pelos profissionais do setor florestal, um novo conjunto de fatores e restrições requer atenção no planejamento operacional moderno.

O desafio está em escolher o melhor sistema de colheita florestal não apenas pelo valor de aquisição das máquinas, veículos e equipamentos, ou pelo custo por unidade produzida. Mas sim a escolha deve considerar também os danos ao solo e ao meio ambiente, o consumo de energia e a emissão de GEE por metro cúbico colhido.
 
Da mesma forma, é um desafio acrescentar ao custo de colheita e transporte de madeira, que sempre foi um dos gargalos do setor florestal, os novos custos decorrentes das mudanças climáticas, da recuperação dos passivos ambientais, bem como os demais custos necessários para se adaptar à nova política econômica de baixo carbono.