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Flávio de Jesus Wruck

Pesquisador da Embrapa-Arroz e Feijão

Op-CP-40

Cultura de arroz em terras altas
A estratégia iLPF, na prática, contempla quatro modalidades de sistemas integrados de produção (iLP: Integração Lavoura-Pecuária, iPF: Integração Pecuária-Floresta, iLF: Integração Lavoura-Floresta e iLPF: Integração Lavoura-Pecuária-Floresta). Cada uma delas é composta por um grande número de arranjos ajustados às diferentes condições econômicas, sociais e culturais de quem as aplica. O cultivo do arroz de terras altas tem ocorrido em todas as modalidades que contempla a lavoura, mas, notadamente, na iLP, visando à reforma ou à renovação de pastagens.

As características relevantes que tornam o arroz de terras altas uma excelente opção de cultura agrícola dentro da iLPF são:

 
  • boa tolerância às condições químicas desfavoráveis do solo, como acidez e teor de Al3+ elevados e baixa saturação por bases; 
  • ótima adaptação aos ambientes de pastagem degradada e abertura de novas áreas, podendo atingir produtividade superior a 4.000 kg ha-1
  • ainda nos referidos ambientes, a cultura do arroz tende a sofrer menor incidência de doenças, pragas e plantas daninhas, resultando num menor custo de produção que, somado às elevadas produtividades, invariavelmente resulta em lucros superiores a qualquer outro cultivo agrícola sob essas mesmas condições; 
  • boa resposta à adubação, especialmente a ureia; 
  • em áreas com um ciclo pluviométrico mais estendido, como norte do Mato Grosso e quase toda a região Norte do Brasil, pode ser uma opção para a safrinha; 
  • permite, com facilidade mediana, a formação de consórcio com forrageiras, constituindo uma excelente ferramenta para a entrada do componente pecuária no sistema, e 
  • produz uma considerável quantidade de resíduos culturais de decomposição lenta que propicia uma boa cobertura morta de solo.
Apesar das características favoráveis, por outro lado, apresenta outras que precisam ser muito bem manejadas para viabilizá-la dentro dos sistemas iLPF:
 
  • apresenta baixa concentração da enzima redutase do nitrato até por volta dos 30 dias após sua emergência, necessitando, nesse período, de uma maior disponibilidade de nitrogênio na forma reduzida no solo; 
  • apresenta sistema radicular fasciculado e pouco agressivo, sendo muito sensível aos atributos físicos do solo, tais como densidade, porosidade e resistência à penetração; 
  • como consequência, são raras as condições do meio que viabiliza agroeconomicamente a utilização do sistema de plantio direto na cultura do arroz de terras altas; 
  • num sistema de rotação ou sucessão, é extremamente exigente em relação à cultura precedente, sendo desaconselhável a utilização do próprio arroz, milho, sorgo, capim-Sudão, entre outros; 
  • é precedente desaconselhável para outras gramíneas agrícolas no sistema de rotação ou sucessão de culturas; 
  • muito sensível à competição com plantas daninhas que, aliada a um portfólio limitado de herbicidas pós-emergentes seletivos à cultura, torna difícil o manejo das mesmas quando integradas com o componente florestal, e; 
  • mercado comprador nem sempre favorável e extremamente dependente da produção do arroz irrigado no Sul do País.
Em relação ao posicionamento da cultura do arroz de terras altas dentro da iLPF, este pode ser na safra ou na safrinha, desde que atendendo às condições edafoclimáticas da cultura. No caso da safrinha, é importante estabelecer uma estratégia que permita, após a colheita do arroz, uma boa cobertura de solo, premissa sine qua non dos sistemas iLPF. O plantio convencional é o principal sistema de cultivo do arroz de terras altas dentro da iLPF, mesmo não sendo premissa da mesma.

Isso ocorre porque, na maioria das vezes, as condições físicas do solo são desfavoráveis ao plantio direto. Em situações como na abertura de novas áreas, na reforma ou na renovação de pastagens onde o solo está compactado e/ou apresenta irregularidades impeditivas na sua topografia, o preparo do mesmo se torna indispensável. Nesses casos, medidas como preparar o solo apenas quando sua umidade estiver na faixa friável, dimensionar adequadamente máquinas e implementos de acordo com o serviço demandado e otimizar suas entradas na área são ações essenciais na mitigação dos efeitos negativos do preparo do solo.


O plantio direto, apesar de ser premissa da iLPF e condição desejável, na prática, tem sido pouco utilizado como sistema de cultivo do arroz de terras altas, em função da exigência de condições de solo e de precedentes favoráveis para viabilizá-lo. Trabalhos recentes e observações empíricas dentro de áreas sob iLPF apontam que as condições físicas de solo favoráveis ao plantio direto do arroz de terras altas são: 1. textura de solo com teor de argila variando entre 30% e 50%; 2. perfil de solo estruturado, poroso e não compactado até, pelo menos, 0,40 m de profundidade, e; 3. densidade do solo até a profundidade de 0,2 m, igual ou inferior a 1kg dm-3
 
Já as condições químicas de solo favoráveis ao plantio direto são: 1. teor de matéria orgânica superior a 2,5%, e; 2. saturação por bases entre 40% e 50% com pH em água entre 5,0 e 5,7. Por fim, devem ser consideradas as culturas precedentes e a quantidade de cobertura morta (palhada) para o plantio direto do arroz de terras altas. Os bons resultados agronômicos do arroz de terras altas em plantio direto dentro da iLPF foram obtidos quando a cultura na safra imediatamente anterior ao arroz foi uma leguminosa (soja), precedida, por sua vez, de braquiária (ou como pasto de safra ou como pasto de safrinha) nos últimos três anos, pelo menos.
 
Com relação à palhada para o plantio direto do arroz, diferentes forrageiras e/ou consórcios foram e continuam sendo testados nos sistemas iLPF:

1. milheto e B. ruziziensis em cultivo solteiro e consorciados foram os melhores;
2. os consórcios formados por feijão-caupi com B. ruziziensis e Crotalária (C. spectabilis e C. ocrholeuca) com B. ruziziensis também apresentaram bons resultados, e;
3. O consórcio de nabo forrageiro com B. ruziziensis também apresentou resultado promissor, mas ainda precisa de mais validações. Com relação à quantidade de cobertura morta, os melhores resultados foram obtidos entre 4 e 5 t MS ha-1

 
Acima disso, ocorriam problemas sérios de plantabilidade e, abaixo, não tinha cobertura suficiente para o controle efetivo de plantas daninhas na fase inicial da cultura. Ainda, alguns cuidados devem ser tomados: 

1. uso de botinhas e/ou disco de corte na plantadeira de plantio direto, e;
2. respeitar um intervalo mínimo de 30 dias após a dessecação, exigindo um planejamento impecável do sistema, pois problemas de fitotoxicidade no arroz de terras altas por exsudados 
da cobertura morta em decomposição (ácidos fracos e glifosato) são frequentes.

Por fim, com relação ao manejo fitotécnico do arroz de terras altas dentro da iLPF, cabe destacar:

 
a. cultivares mais utilizadas: BRS Monarca, ciclo longo de aproximadamente 115 dias e com ótimo desempenho em SPD sob palhada de braquiária; • BRS Pepita, ciclo curto de aproximadamente 102 dias, indicada na renovação/reforma de pastagens e, atualmente, material mais tolerante à seca disponível no mercado (recomendado para o cultivo de safrinha); • BRS Sertaneja, BRS Primavera, BRS Esmeralda, ciclo médio de aproximadamente 108 dias, excelente qualidade de grãos e recomendadas nos sistemas de plantio convencional; AN Cambará, ciclo médio de aproximadamente 110 dias, excelente qualidade de grãos e recomendados nos sistemas de plantio convencional em regiões de maior pluviosidade;
b. semeadura: deve ser a mais uniforme possível, respeitando o espaçamento entre linhas e a profundidade e a densidade de semeadura recomendada pela detentora da cultivar semeada;
c. manejo de pragas: idêntico ao cultivo tradicional, tomando cuidados especiais ao controle de cupins, formigas e cigarrinhas das pastagens quando a pecuária estiver incluída no sistema iLPF;
d. manejo de doenças: idêntico ao cultivo tradicional, tomando cuidados especiais ao controle da brusone (Pyricularia grisea), pois seu patógeno pode sobreviver e se multiplicar em algumas espécies de gramíneas presentes nos sistemas integrados. Outra preocupação é o Pratylenchus brachyurus, nematoide causador de lesões no sistema radicular das plantas e de considerável importância econômica, devido à sua ampla distribuição geográfica e ao grande número de plantas hospedeiras que, em tese, pode hospedar e se multiplicar em alguns materiais de arroz de terras altas (trabalhos não conclusivos);
e. Manejo de plantas daninhas: consiste no maior desafio fitotécnico do arroz de terras altas dentro da iLPF, notadamente quando integrado com o componente florestal. Nesse caso, a estratégia de manejo vai depender, principalmente, da idade e das espécies florestais, dos sistemas de cultivo e da quantidade de palhada no solo.