Desnecessário repetir as estatísticas que comprovam o enorme impacto positivo econômico, social e ambiental da silvicultura brasileira. Surpreende o que menos de 1% do território nacional cultivado com árvores é capaz de fazer.
Apesar de uma grande proporção da área cultivada com árvores pertencer a indústrias verticalizadas, mais de um terço dos ativos florestais está nas mãos de produtores independentes, que comercializam suas toras livremente no mercado. Para esse público especificamente, a diversificação da produção florestal, ou o manejo multiprodutos é, sem dúvida, uma estratégia interessante. Além da diminuição dos riscos pelo abastecimento de diferentes segmentos industriais, há a possibilidade de atender a nichos específicos e dispostos a pagar mais por toras de maior diâmetro, podadas ou não, e, assim, maximizar o retorno econômico do investimento.
Desbastes e podas, juntamente com a duração do ciclo de produção, são, possivelmente, os temas mais discutidos e com as opiniões mais contraditórias em qualquer diálogo sobre o cultivo de árvores. Há defensores e justificativas para os mais antagônicos posicionamentos.
Tenho certeza de que as particularidades de cada produtor florestal e do mercado onde se está inserido são fatores importantes da divergência de opiniões. Há, porém, generalizações perigosas, tidas como verdades absolutas. O resultado disso são receitas prontas, com resultados aquém das expectativas do investidor e do real potencial dos ativos.
Apresento a seguir uma breve discussão sobre duas dessas “verdades absolutas” relacionadas aos desbastes e à duração do ciclo de produção. As que me parecem mais evidentes e com sérias consequências. Penso que a discussão que segue é genérica o suficiente para englobar o cultivo de árvores em povoamentos equiâneos e monoespecíficos no País como um todo, mas destaco que minha atuação é fortemente vinculada ao cultivo de Pinus no planalto sul do Brasil, pelo qual meus argumentos devem estar mais influenciados.
Desbastar os povoamentos tem sido uma prática cada vez menos usual. Inúmeros são os argumentos para não mais realizar desbastes. Afirma-se, por exemplo, que os desbastes não são eficientes. As árvores remanescentes não crescem muito mais do que cresceriam caso o povoamento não fosse desbastado. Afirma-se também que desbastes são atividades custosas e que não compensam do ponto de vista econômico. Entre tantos outros argumentos.
Aqueles que ainda fazem desbastes, ou que faziam no passado, alguma vez perguntaram-se qual método deveria ser utilizado? Podemos afirmar que, na grande maioria dos raros casos nos quais os desbastes ainda são realizados, eles são seletivos por baixo, removendo apenas os piores indivíduos, suprimidos. Ou seja, nada mais que a antecipação da mortalidade natural. Nesse caso, o desenvolvimento do povoamento após o desbaste é semelhante a outro não desbastado, simplesmente por não disponibilizar espaço adicional às árvores remanescentes.
Por sorte, os desbastes seletivos por baixo são realizados concomitantemente a desbastes sistemáticos, cada vez mais intensos, em função da mecanização das operações, com o simples objetivo de permitir o acesso ao povoamento, mas acabam disponibilizando espaço às árvores remanescentes.
Será que não há um método mais eficiente para aumentar o crescimento radial das árvores remanescentes após um desbaste? A resposta é sim! Desbastes seletivos pelo alto são uma excelente alternativa. Diferente do que se possa imaginar, esse tipo de desbaste não é o contrário do seletivo por baixo.
O intuito de um desbaste seletivo pelo alto é selecionar árvores dominantes, com qualidade e uniformemente distribuídas para, na sequência, remover as suas principais concorrentes. Árvores concorrentes são necessariamente outras árvores dominantes e codominantes, que, de fato, competem pelos fatores de produção com as árvores anteriormente selecionadas. Árvores suprimidas já perderam essa disputa e não mais interferem no crescimento das dominantes. Motivo pelo qual sua remoção em pouco contribui para o crescimento das árvores remanescentes.
Se essa discussão lhe parece inédita, está comprovado meu posicionamento de que há uma ”receita” para desbastes institucionalizada no Brasil. Infelizmente, o método menos eficiente para o objetivo de quem cogita essa operação: concentrar o potencial produtivo do sítio em um número reduzido de indivíduos, para obter maiores crescimentos em diâmetro e antecipar a produção de toras de maior diâmetro e mais valiosas.
Com relação à duração do ciclo de produção, questiono o “quanto menor melhor”. A afirmação de que “dois ciclos de 15 anos são melhores que um de 30” parece encontrar muitos seguidores. Isso decorre da utilização de taxas de desconto equivocadamente altas nas análises econômicas dos ativos florestais.
Nada contra ter elevadas expectativas e custos de oportunidade do capital investido. Provavelmente, é o caso de alguns investidores. Mais provável ainda é que isso não reflete a realidade de vários outros pequenos, médios e até grandes produtores independentes.
Uma taxa alternativa para descontar o fluxo de caixa de ativos florestais de 10% ao ano, por exemplo, implica ter opções de investimento que remunerem mais de 18% a.a. em termos nominais (inflação de 8% a.a.). Investimentos de baixo risco, com capacidade de remunerar o capital durante longos períodos nessas proporções são raros e de difícil acesso.
Aquele que utiliza uma taxa de desconto superior às reais alternativas de investimento, fará o corte raso muito antes do povoamento ter, de fato, atingido sua maturação econômica. O predomínio da utilização de indicadores econômicos como a taxa interna de retorno (TIR) e o valor presente líquido (VPL) são frágeis e não englobam a complexidade e o longo prazo inerentes aos ativos florestais.
Um indicador mais robusto seria o Valor Esperado da Terra (VET) ou, como alternativa, a ‘teoria da máxima receita’, amplamente negligenciada no Brasil. Esta considera um ativo florestal regulado, e, por isso, todas as operações (plantio, tratos culturais, tratos silviculturais e corte raso) são realizadas, anualmente, em proporções semelhantes. Isso significa que, concluído o ano, o resultado econômico é simplesmente a receita menos o custo, independente de taxas de desconto.
O objetivo é maximizar o resultado líquido anual, sendo este constante ano após ano, sustentável como é conceitualmente o manejo florestal. A grande vantagem dessa abordagem é ter o manejo florestal como principal elemento de análise. E não externalidades, como a taxa de juros que, quando alterada, modifica completamente as decisões.
Obviamente, o maior obstáculo, nesse caso, é ter um ativo florestal regulado. Talvez seja difícil imaginar o resultado desse tipo de análise, ainda mais num contexto onde taxas de juros predominam. Adianto, porém, que o resultado é a ampliação dos ciclos de produção. Não é objetivo do autor afirmar que TIR e VPL devam ser descartados. Até porque os demais indicadores também não são perfeitos e possuem as suas fragilidades. Mas, em se tratando da análise de um investimento de longa duração, há abordagens, no mínimo, complementares, e devem ser consideradas para tornar as decisões mais robustas e adequadas às particularidades de cada caso.
Além disso, o atual modelo de negócio resulta no corte de árvores jovens, cuja seção transversal é composta quase exclusivamente de madeira juvenil. Apesar de apta para muitos usos, é certamente indesejada para fins sólidos, estruturais, mais nobres.
Lamenta-se que a população brasileira utiliza pouca madeira, diferente de outros países com cultura florestal. Caso haja maior interesse na utilização de madeira de reflorestamento para fins mais nobres, será que nossos povoamentos de Pinus e Eucalyptus forneceriam madeira adequada? Há exemplos nos EUA e na África do Sul, nas décadas de 1980 e 1990, muito bem documentados relatando sérias implicações do uso de madeira juvenil e do resultado da busca única e exclusivamente por maior produção volumétrica, sem atenção à qualidade da madeira.
No Brasil, a tendência de antecipação do corte raso é também reflexo do mercado de toras que remunera basicamente o diâmetro da ponta fina das toras, indiferente ao fato de as árvores possuírem 10, 20 ou 30 anos. Se, para os atuais usos, isso faz pouca diferença, não é o caso dos mais nobres. Receio que os raros exemplos com essas preocupações alterem suas estratégias de manejo, caso não haja uma evolução do mercado de toras. Se isso acontecer, essa matéria-prima deixará de ser ofertada antes mesmo de o mercado descobrir seu real potencial de utilização.
O intuito dessas reflexões foi mostrar que há alternativas ao atual modelo de negócio de reflorestamento no Brasil, com argumentos racionais, não apenas românticos de um entusiasta do manejo florestal.