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Kátia Regina de Abreu

Presidente da CNA e Senadora da República

Op-CP-17

Sairemos na dianteira da recuperação da economia mundial

Consolidados os indicadores econômicos do primeiro semestre do ano, é hora de avaliar os reflexos da crise financeira mundial nos diversos setores da economia brasileira. Certamente, todos os segmentos foram atingidos, com abrangência e graus diferenciados. O tempo que cada setor levará para se recuperar também será diferente, dependendo das políticas adotadas pelo governo federal para a manutenção do consumo interno e das peculiaridades de cada atividade.

No caso da agropecuária, o setor levará um pouco mais de tempo para se recuperar. O setor foi capaz de dar respostas imediatas às demandas que recebeu. Manteve a balança comercial superavitária mesmo em período de crise. Mas é bom lembrar que a nossa produção é anual, o que plantarmos agora trará resultados somente em 2010.

Os dados do PIB - Produto Interno Bruto, divulgados recentemente pelo IBGE, refletem bem esse quadro. Os setores que receberam maiores incentivos voltados à manutenção do consumo, como desonerações e crédito, ensaiaram uma recuperação ainda no primeiro semestre. A indústria cresceu 2,1%, e o setor de serviços, 1,2%, em relação ao trimestre anterior.

O setor agropecuário fechou o trimestre patinando e amargou queda de 0,1%. Esse resultado não poderia ser diferente. Nossa indústria é a céu aberto. Clima, doenças e pragas influenciam sobremaneira o resultado obtido a cada safra. Também somos extremamente dependentes de recursos de terceiros para financiar a atividade produtiva.

Foi justamente no crédito que tivemos o nosso primeiro contato com a crise. O setor agropecuário já vinha de um subsequente processo de renegociação de dívidas, contraídas em especial nas safras 2003/04, 2004/05 e 2005/06, em função de perdas em decorrência de doenças, clima desfavorável e mudanças da política econômica, que depreciou o dólar.

Todos esses eventos geraram um descasamento entre os custos de produção e a receita do setor, que se mostrou insuficiente para fazer frente às despesas de custeio das safras. O resultado era previsível. Sem um seguro rural que garantisse a produção e sem seguro de renda, os produtores rurais tiveram que renegociar os saldos devedores.

Dessa forma, aliviaram a liquidez do setor no curto prazo, mas inviabilizaram o acesso ao crédito nas safras futuras. Mas o cenário era, então, muito promissor. A demanda por insumos cresceu mundialmente, e os preços dispararam. Os fertilizantes, por exemplo, dobraram de preço entre uma safra e outra. Assim, a demanda por crédito também aumentou. Nesse mesmo período, o mercado mudou.

A agroenergia ascendeu com força, o dólar desvalorizou em todas as economias, e as commodities dispararam no mercado internacional. Foi o início da crise para o setor. O que era para ser positivo ? alta dos preços ? acabou trazendo dificuldades. Como boa parte da produção é comercializada no mercado futuro, as tradings, grandes financiadoras do setor, tiveram que cobrir as margens negociadas nas bolsas, reduzindo a oferta de crédito para o plantio da safra 2008/09.

A crise financeira mundial atingiu o setor nesse momento, agravando ainda mais o cenário. O crédito desapareceu. As dívidas alavancadas em dólar trouxeram grande endividamento às agroindústrias. O nível tecnológico das lavouras caiu. O clima, por sua vez, castigou os estados do sul do país, reduzindo a safra de grãos brasileira em 10 milhões de toneladas.

Essa é a safra da crise. Plantada e colhida com dificuldades, comercializada em período de preços cadentes, mas relativamente equilibrados pelo dólar, e com retração das compras externas, à exceção da soja. A escassez de crédito da crise é temporária, conjuntural, será solucionada quando a confiança no mercado melhorar.

A escassez de crédito para o setor agropecuário é estrutural, decorre da ineficiência da política agrícola e de um modelo já ultrapassado. Além disso, a tributação, o risco à garantia do direito de propriedade e os gargalos da logística são problemas crônicos, que minam a competitividade do nosso setor. Tal conjuntura nos faz acreditar que a atividade agropecuária levará um pouco mais de tempo para se recuperar. Mas, apesar da crise, a tendência do setor é de crescimento nos próximos anos.

O mundo passa por um forte processo de urbanização, o que, inevitavelmente, elevará a demanda por alimentos. Somos a última fronteira agrícola e possuímos áreas para o plantio sem precisar desmatar sequer um hectare. Assim, a crise ainda não acabou no campo, mas o cenário melhorou. E o Brasil, entre os países emergentes, sairá na dianteira da recuperação da economia mundial.