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Silvio Brienza Júnior e Jorge Alberto Gazel Yared

Pesquisadores da Embrapa Amazônia Oriental e do Instituto Iniciativa Amazônia, respectivamente

OpCP74

Silvicultura de espécies nativas para restauração socioprodutiva na Amazônia
No contexto global, o termo “restauração florestal” ganhou projeção a partir do lançamento da iniciativa denominada “Década da Restauração, feita pela Organização Mundial para Agricultura (FAO), em 2020”.

Desde então, termos como “restauração ambiental”, “restauração ecológica”, “restauração florestal”, ou até, “silvicultura de plantações” têm sido empregados para diversas situações. Conceitualmente, esses termos têm sido bem explorados na literatura pertinente.

A “restauração ambiental” visa recuperar ecossistemas degradados e melhorar a regulação hidrológica, proteção do solo e promoção da biodiversidade. É utilizada para “reconstruir” funções e serviços ecossistêmicos de áreas mineradas, habitats aquáticos e manguezais degradados, ou de áreas após incêndios. A “restauração ecológica” busca restabelecer as condições naturais próximas ao estado original. Envolve reintroduzir espécies nativas, restaurar habitats naturais e processos ecológicos naturais, podendo ser aplicada em áreas degradadas por atividades antrópicas e nascentes suprimidas.

A “restauração florestal”, como segmento da restauração ecológica, foca em restaurar a estrutura de florestas, as funções ecológicas, a biodiversidade, os processos biogeoquímicos, a proteção do solo e os serviços ecossistêmicos associados. A “silvicultura”, por sua vez, é a prática de plantar, manejar e colher árvore com objetivos comerciais.

“Restauração florestal” e “silvicultura de árvores nativas plantadas” podem promover o desenvolvimento rural mais sustentável. Neste artigo, desejamos abordar especificamente o que chamamos de restauração florestal socioprodutiva, que integra a restauração florestal com benefícios socioeconômicos, ou seja, o viés social é adicionado para promover a criação de empregos, a melhoria das condições de vida de comunidades locais com fortalecimento de economias regionais.

Conhecimentos e tecnologias da Embrapa na Amazônia podem apoiar a abordagem socioprodutiva de adequação ambiental de estabelecimentos rurais, destacando seleção de espécies nativas, sistemas de plantio, manejo de florestas antropizadas e zoneamento topoclimático de espécies para indicação de áreas mais adequadas de plantio.

Algumas espécies nativas da Amazônia têm mostrado aptidão em diversos sistemas produtivos. Um exemplo clássico é a castanha-do-brasil, uma excelente espécie para plantios homogêneos a pleno sol, plantio misto associada às outras espécies florestais ou em sistemas agroflorestais.

A sua madeira é adequada para a indústria madeireira, mas o seu uso principal é a produção de frutos, até porque é uma espécie protegida por lei. Outras espécies, como paricá, tachi-branco e quaruba-verdadeira também apresentam potenciais em diferentes contextos, como reflorestamentos, sistemas agroflorestais e enriquecimento de áreas de manejo de florestas naturais.

A escolha do sistema de plantio de espécies nativas está intimamente ligada ao sucesso do seu uso. Com a falta de domesticação para a maioria das espécies, observa-se que algumas são mais propícias para plantios homogêneos a pleno sol, enquanto outras se destacam em sistemas de sombra ou agroflorestais. Alguns exemplos de silvicultura socioprodutiva bem-sucedidos destacam o enorme potencial tanto de espécies quanto de sistemas de produção.

Para plantios mistos a pleno sol, um sistema de produção florestal energético-madeireiro foi idealizado com base nas espécies castanha-do-pará, andiroba, paricá e tachi-branco para proporcionar retornos a cada 6 anos, com colheitas de madeira podendo alcançar até 670m3/ha, incluindo desbastes intermediários e corte final. Além disso, as produções de sementes e óleos também contribuem para otimizar a receita.

O enriquecimento de capoeira, ou plantio sob sombra, foi testado com espécies florestais de valor econômico, plantadas em linhas alternadas. Com diferentes taxas de sobrevivência e de crescimento, os resultados mais relevantes foram observados para fava timbaúba, tatajuba e morototó. Caso plantadas em conjunto, essas espécies podem produzir entre 200-230 m3/ha, aos 27 anos de idade.

Os sistemas agroflorestais são aplicáveis a diversas escalas produtivas. Em área de agricultura familiar na região de Santarém-PA, foram plantadas culturas anuais e fruteiras perenes com as espécies freijó e mogno-brasileiro. Aos 27 anos, o volume de madeira foi de 131 m3/ha para o freijó e 21 m3/ha para o mogno.

Além disso, a área exibe composição florística diversificada composta pelas espécies plantadas e pela regeneração natural acompanhante. Esses resultados são relevantes para a restauração florestal socioprodutiva de áreas de agricultura familiar.

No manejo de florestas naturais antropizadas na Amazônia Oriental há uma única e inovadora experiência em escala empresarial, focada no sistema de enriquecimento e adensamento de clareiras da exploração florestal e critérios de colheita para árvores com DAP ≥ 25 cm.

O planejamento da exploração e a introdução de novas espécies no mercado industrial de madeira permitiram projetar ciclos de colheita economicamente viáveis de até 30m3/ha, a cada 10 a 12 anos, apesar de ser um período inferior ao estabelecido pela legislação vigente.

Esse método de manejo mantém a diversidade da floresta e proporciona retornos econômicos em prazos mais curtos, contribuindo para a conservação da floresta em pé. O zoneamento topoclimático ajuda a identificação de áreas mais adequadas para o plantio de diferentes espécies e já está disponível para as espécies tachi-branco e paricá. Constatou-se também que as espécies ipê e parapará possuem grande plasticidade, podendo ser plantadas desde a Amazônia mais chuvosa (áreas em azul no mapa de clima) até em regiões com chuvas menos frequentes (arco do desmatamento).
 
Os desafios da silvicultura de espécies nativas na Amazônia são proporcionais à magnitude da região. Após 45 anos de pesquisas da Embrapa na Amazônia, os resultados podem orientar investimentos. Entretanto, para alcançar escala piloto-comercial é necessário superar barreiras, como a disponibilização de sementes e a produção de mudas de qualidade, o financiamento e créditos compatíveis com a escala temporal dos sistemas produtivos, assim como, capacitação e assistência técnica, entre outras.