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João Kluthcouski

Pesquisador da Embrapa Cerrados

Op-CP-40

Produção sustentável nos solos arenosos
Coautor: Luiz Adriano Maia Cordeiro, Pesquisador Embrapa Cerrados

Os solos arenosos possuem textura leve, com composição granulométrica nas classes texturais areia, areia franca ou franco-arenosa, contendo entre 50 e 100% de areia.  As principais classes de solos arenosos são: Argissolos, Latossolos, Planossolos, Neossolos (Quartzarênicos, Regolíticos e Litólicos) e Cambissolos. A principal classe no Brasil é o Neossolo Quartzarênico, ocupando 11% da área do País. Somados, esses solos representam cerca de 25% do território, sendo estimado que cerca de 50 milhões de hectares estão sob pastagem degradada, distribuídos nos estados do MA, TO, PI, BA, SP, GO, MS e MT.

Nos estados de SP e PR, por exemplo, esses solos são, atualmente, cultivados, em pequenas áreas, com mandioca, amendoim, melancia e cana-de-açúcar, predominando as pastagens degradadas. No oeste baiano, predomina a rotação soja x algodão, registrando-se frustração das três últimas safras devido à ocorrência de veranico. 
Os solos arenosos possuem baixa capacidade de retenção de água, altas taxas de percolação e de infiltração de água. São solos com maior facilidade de preparo mecânico, porém são muito sensíveis ao manejo intensivo, devido à sua estrutura simples ou fraca e pouca consistência.

São de baixa Capacidade de Troca Catiônica (CTC) e baixa fertilidade natural, baixo pH, alumínio no subsolo e baixos teores de matéria orgânica e baixa capacidade de retenção de água e alta suscetibilidade à erosão. 
Erosão, compactação subsuperficial, encharcamento, dispersão da fração argila e consequente perda por carreamento ou eluviação são alguns dos problemas causados pelo excessivo manejo mecânico desses solos, podendo até desencadear um processo de desertificação, que se inicia com a perda da matéria orgânica do solo (MOS). 

 
Entretanto, quando bem manejados, com práticas conservacionistas adequadas e sustentáveis, podem se tornar produtivos e economicamente viáveis. A MOS e a palhada de cobertura são os principais componentes da sustentabilidade para os solos arenosos, os quais aumentam a CTC do solo, a reciclagem de nutrientes e a capacidade de retenção de água. Em condições tropicais e subtropicais, a perda de carbono em solos arenosos no preparo convencional pode ser de 30 a mais de 70% do teor original. 
 
Por sua vez, com a adoção de sistemas de produção sustentáveis, como o Sistema Plantio Direto (SPD) e os sistemas de Integração Lavoura e Pecuária (iLP), é possível aumentar os teores de carbono do solo, obter boa palhada de cobertura, com melhoria da qualidade do solo e sua produtividade.

Ao contrário do pousio, deve-se promover a sua ocupação permanente com plantas comerciais intercaladamente com plantas de produção de biomassa ou formação de palhada, num sistema de rotação de culturas que promova aumento da atividade biológica e incremento nos teores de carbono e MOS. 

 
Os sistemas de iLP diversificam as atividades de produção rural, proporcionando a cobertura do solo com plantas vivas na maior parte do ano. Esses sistemas também se beneficiam dos efeitos sinérgicos entre as atividades de produção rural desenvolvida na mesma área ao longo do tempo. As forrageiras tropicais e subtropicais desempenham papel fundamental em sistemas de iLP em solos arenosos, devido ao alto potencial de produção de biomassa da parte aérea e de raízes promovendo melhoria da qualidade química, física e biológica desses solos.

Além disso, a palhada oriunda de pastagens tem alta qualidade para o SPD devido à ampla relação carbono/nitrogênio (C/N), com decomposição mais lenta e maior tempo de proteção do solo. A utilização de forrageiras em sistemas de produção de solos arenosos também aumenta a infiltração e a retenção de água no perfil do solo, bem como reduz as temperaturas nas camadas superficiais, favorecendo a germinação de sementes, a emergência de plântulas e o desenvolvimento inicial das plantas. Outro efeito da presença de espécies forrageiras em sistemas de iLP é o aumento da reciclagem de nutrientes, disponibilizando-os na camada superficial.

 
Os solos arenosos foram, historicamente, considerados solos marginais e de baixa aptidão agrícola, por isso não existem suficientes informações de pesquisa para seu manejo adequado. Com a possibilidade da adoção de novas tecnologias de manejo preconizadas por sistemas de produção sustentáveis, os solos arenosos passaram a despertar maior interesse econômico por parte dos produtores rurais. 
 
A aplicação de calcário em solos arenosos, tanto para correção de acidez quanto para reposição de cálcio e magnésio, deve ser feita a lanço, seguindo as recomendações de calagem vigentes. Porém a diferença é que essa operação deve ser mais frequente e com doses menores. Para se construir fertilidade de solos, deve-se ter em mente que são solos com maiores possibilidades de perdas por lixiviação de alguns nutrientes (N, K, S); por outro lado, o manejo do fósforo em solos arenosos é menos crítico, pois a fixação é menor em comparação a solos argilosos.
 
A alternativa para a correção da acidez desses solos em profundidade é a aplicação de gesso agrícola, que diminui, em menor tempo, a saturação de alumínio nas camadas mais profundas do solo. Desse modo, criam-se condições para o sistema radicular das plantas se aprofundar no solo e, consequentemente, minimizar o efeito de veranicos. O gesso não neutraliza a acidez do solo. Para o manejo do potássio, recomenda-se parcelar as aplicações e evitar altas doses somente no sulco, para evitar danos a sementes por efeito salino. Para o manejo do nitrogênio, também se deve realizar o parcelamento.

Além desses elementos, também o enxofre e o boro apresentam altas perdas por lixiviação em solos arenosos, sendo necessário aplicações mais frequentes. 
Os solos arenosos, com algumas particularidades, têm apresentado altas produtividades, aliadas à facilidade nas operações de manejo, devido às suas características físicas e químicas, com a adoção correta e integral dos sistemas conservacionistas de manejo do solo e da água, caracterizados pelo uso do SPD, rotação de culturas e cobertura permanente do solo. Existem várias propriedades rurais que adotam sistemas de integração em regiões com solos arenosos.

Por exemplo, se, na região do Bolsão Sul-mato-grossense, com solos que apresentam 
apenas 9% de argila, uma propriedade rural desenvolveu um modelo de iLP, em parceria com a Embrapa, tendo como base a utilização da iLP com a antecipação da correção química e física do solo e do cultivo de soja em SPD para amortizar os custos da recuperação da pastagem. 

 
Tal sistema, denominado Sistema São Mateus, proporciona a diversificação das atividades, diluindo os riscos de frustrações e ampliando a margem de lucro da propriedade rural. Na Fazenda Ibieté Porã, em Rancharia-SP, que adota a rotação soja x pastagens, registraram-se, em janeiro e fevereiro de 2005, 27 dias com apenas 10 mm de chuva durante a fase de enchimento de grãos da soja, a qual teve produtividade de 40 sacos/ha.

Outras fazendas na região do oeste da Bahia têm adotado sistemas de iLP com base no consórcio de milho com braquiária e no sistema de “boi safrinha”, em alguns casos, utilizando também a sobressemeadura 
do capim na cultura da soja. Na região noroeste do Paraná, no Arenito Caiuá, existem muitas propriedades rurais que adotam diferentes modalidades de integração, tanto a iLP como a iLPF, com resultados de produtividade que viabilizaram a agropecuária naquela região. Com a adoção de sistemas de integração sob SPD em solos arenosos, é possível reincorporar milhões de hectares ao sistema produtivo sustentável com grandes impactos na agropecuária brasileira, principalmente nas exportações e na redução da pressão por desmatamento de áreas com vegetação nativa. 

 
Estudo recente realizado em cinco propriedades rurais do oeste paulista mostrou que a iLP e o SPD são as principais estratégias para a produção sustentável nos solos arenosos. Nesse estudo, houve unanimidade na aplicação das seguintes práticas: palhada de braquiária para cobertura do solo; SPD; descompactação; dessecação antecipada; correção de acidez; aplicação do KCl a lanço e rotação soja x pastagem a cada dois anos e alta frequência de ocorrência de veranico nos meses de janeiro e fevereiro. Falta/pouca palha e o manejo convencional com grade foram consideradas as piores práticas, sendo que algumas lavouras foram perdidas nessas condições.
 
Os desempenhos da soja e da pecuária nessas propriedades são mostrados nas tabelas abaixo. Destacam-se a baixa concentração de argila e as baixas doses de calcário. Por outro lado, obteve-se produtividade de soja superior a 70 sc/ha, e, mesmo com longo período de veranico, ainda foi possível produzir, em média, 24 sacas/ha. A lotação animal, que, em média, na região, é de 0,7 UA/ha, sobe para mais de 4 UA/ha na pastagem formada após a colheita da soja. Ao invés de o rebanho perder peso no outono/inverno, com oferta de forrageira de boa qualidade, o ganho de peso médio diário observado foi sempre superior a 500 g/animal/dia, sendo possível produzir mais de 20 @/ha/ano.