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Luiz Carlos Estraviz Rodriguez

Professor de Economia e Planejamento Florestal da Esalq-USP

Op-CP-55

Novos profissionais ara o setor florestal: como formá-los?
O Brasil precisa de profissionais especializados no manejo e gestão de recursos florestais? A resposta de qualquer pessoa que conheça o nosso país deveria ser um sonoro – “Sim”. Afinal, o País tem 67% do território coberto por florestas e campos naturais (segundo dados do MapBiomas, um projeto que mapeou as mudanças no uso da terra no Brasil entre 1985 e 2017). Temos também terras produtivas e disponíveis para plantios florestais que nos ajudam a atender à crescente demanda por fibras, madeira sólida, serviços ecossistêmicos e produtos não madeireiros.
 
A nossa riqueza florestal por si só já justificaria a alta demanda por profissionais florestais. Acontece que as aceleradas taxas de perda e de degradação dos recursos florestais e das terras agrícolas também nos fazem perceber que precisamos de profissionais florestais para reverter, mitigar e monitorar esses processos. 
 
Segundo dados da FAO de 2015, em apenas 25 anos (1990 a 2015), a área total com florestas no nosso continente encolheu três vezes mais depressa (9,5%) do que a redução observada no mundo (3,1%). Por outro lado, as florestas plantadas se expandiram no mundo de 167,5 milhões de ha, em 1990, para 277,9 milhões de ha, em 2015.

Esse aumento de área variou muito entre regiões. Em todos os 20 países de maior área plantada (85% da área total), houve expansão dos plantios florestais. Mas, se compararmos a expansão de área brasileira (2,8 milhões de ha) com as expansões observadas na China (37 milhões de ha), no Canadá (11,2 milhões de ha), nos EUA (8,4 milhões de ha) e na Rússia (7,2 milhões de ha), vemos o quanto esses aumentos foram díspares e, considerado o nosso potencial, o quanto foi modesto o nosso crescimento no Brasil.
 
A boa notícia é que não faltam cursos de nível superior formando engenheiros florestais no Brasil. Segundo dados disponibilizados pelo Sistema Nacional de Informações Florestais (SNIF), mantido pelo Serviço Florestal Brasileiro, existem hoje 71 cursos de Engenharia Florestal no Brasil. Bem distribuídos por todas as regiões (Centro-Oeste: 11; Nordeste: 11; Norte: 20; Sudeste: 15; e Sul: 14), parecem seguir mais a vocação florestal de cada região do que uma lógica demográfica.
 
A má notícia é que eu não saberia dizer se, de fato, todas formam profissionais efetivamente capacitados para as prementes necessidades do setor florestal.  A preocupação procede da constatação de que, após 35 anos atuando como docente, vejo, pelo
lado do aluno universitário, jovens chegando à universidade deficientes nas ciências básicas (matemática, física, química) e na capacidade de se expressar e de sintetizar ideias; e pelo lado da universidade, programas desatualizados, infraestrutura insuficiente e métodos pedagógicos arcaicos. 
 
O resultado é a oferta de recém-formados que, na maioria, quando conseguem emprego, precisam passar por diversas fases de treinamento para que consigam atender a mínimas exigências. Outros se voltam para cursos de pós-graduação e especialização para suprir deficiências e se atualizar ou aprofundar em temas que não foram tratados durante a sua formação profissional.
 
Enquanto diversos setores da economia contemplam o uso de veículos autônomos; de sistemas de tomada de decisão robotizados, ou controlados por programas de inteligência artificial; de comunicação a distância para reuniões virtuais; de cadeias de produção reguladas por princípios de IoT (internet of things); de monitoramento em tempo real por sensores os mais diversos (ativos ou passivos, móveis ou fixos, terrestres ou orbitais etc.); e de técnicas de visão computacional por fotogrametria digital ou por escaneamento a laser, para citar algumas, as nossas universidades ainda se baseiam em técnicas pedagógicas obsoletas, enclausuradas em salas de aula lotadas com alunos sentados por horas a fio em fileiras inertes, ouvindo apenas o saber de professores que, quando muito, é geralmente limitado a poucas áreas específicas nas quais se especializou.
 
Professores e alunos nas universidades brasileiras, e em várias partes de mundo, parecem vítimas de um mundo que evoluiu mais rapidamente do que os sistemas universitários de ensino e formação profissional. Sistemas esses que os professores gostariam fossem formadores e que os alunos esperariam fossem transformadores.
 
A obsolescência e a falência do atual modelo são evidentes quando, superada a barreira da língua, vemos que material e cursos, completos e nas mais diferentes habilitações, estão à disposição de qualquer pessoa, fora da universidade, a baixíssimo custo, e muitas vezes de forma totalmente gratuita. A experiência, o profundo conhecimento metodológico e a fonte de soluções criativas que, há poucas décadas, encontrávamos apenas em salas de aula e nos gabinetes docentes das melhores universidades brasileiras, hoje, viraram commodities e estão disponíveis na rede mundial de computadores integrados pela internet. 
 
Como transitar para processos de formação profissional na área florestal mais adequados e que inclusive permitam aos futuros florestais se adiantar, enquanto se formam, às demandas que encontrarão pela frente? Honestamente, não tenho uma resposta definitiva. Creio que são várias as estratégias possíveis, e a transição será lenta e gradual. Como professores responsáveis pela formação da nova geração de engenheiros e gestores florestais, o primeiro passo seria assumir a humilde posição de um coach que, pela experiência acumulada, é capaz de orientar os seus alunos na direção de fontes selecionadas de dados e de referências hoje disponíveis em qualquer laptop, smartphone ou tablet conectado à internet.
 
É fato que essa facilidade com que se acessa informação deveria ser acompanhada por infraestrutura de laboratórios e de recursos materiais que permitissem reproduzir, testar e desenvolver novas soluções. Parcerias com empresas privadas, e parcerias público-privadas, de forma virtual ou presencial, poderiam, num primeiro momento, se integrar a uma rede de cursos e salas de aula para que professores pudessem orquestrar o efetivo contato dos alunos com a realidade fora dos muros da universidade. Dado o dinamismo atual, isso poderia, inclusive, evitar o desperdício de enormes investimentos públicos em mais laboratórios e infraestrutura que, em pouco tempo, se tornariam novamente obsoletos.
 
O espaço é curto, o assunto é complexo e, se tiver interesse em discutir e oferecer sugestões, teria enorme prazer em ouvir e compartilhar “aflições” (meu e-mail é lcer@usp.br). Fica aqui apenas uma humilde sugestão. Um primeiro passo. Um passo que considero essencial para sairmos da inércia que, cada vez mais, nos afunda na obsolescência da formação universitária convencional e pode nos pôr em marcha para novos rumos.

Sugiro que nós, professores e alunos, rompamos o círculo vicioso que leva professores a pretensamente fazer de conta que ensinam, enquanto alunos pretensamente fazem de conta que aprendem.