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José Henrique Tertulino Rocha e José Leonardo de Moraes Gonçalves

Doutorando em Recursos Florestais e Professor do Dpto de Ciências Florestais da Esalq-USP, respectivamente

Op-CP-35

Nutrição e sustentabilidade de plantações florestais

No Brasil, os plantios florestais comumente são estabelecidos em regiões de baixa aptidão agrícola, caracterizadas por solos pouco férteis e com pequena reserva de minerais. Em levantamento nacional recente, constatou-se que os solos mais usados para plantações de eucaliptos são os Latossolos de textura média e os Neossolos Quartzarênicos. Mesmo sendo de baixa fertilidade, elevados níveis de produtividade são alcançados (média geral de 41m3/ha-1/ano-1).

Nesses solos, os resíduos florestais têm função muito relevante. Atualmente, quase todas as plantações de eucalipto são estabelecidas sob o sistema de cultivo mínimo do solo. Contudo pressões quanto à utilização dos resíduos florestais têm surgido, assim como no setor agrícola. Com as restrições para a compra de terras e as elevações dos preços dos combustíveis fósseis, esses resíduos têm sido vistos como potenciais fontes alternativas de energia para o setor industrial.

Para que a produtividade seja mantida, com a remoção parcial ou integral dos resíduos florestais, há necessidade de investimentos mais elevados em fertilização, de modo a se assegurar o balanço nutricional do sítio. Quanto maior a remoção de resíduos, maior o potencial de perda de produtividade, a qual pode chegar a 40% quando todos os resíduos são removidos, sem suplementação compensatória de nutrientes.

Uma das principais vantagens da manutenção dos resíduos florestais no campo é a redução da exportação de nutrientes, aumentando suas disponibilidades para as rotações de cultivo subsequentes. Da biomassa total (parte aérea, raiz e serapilheira) de um povoamento de eucalipto com 7 anos (cerca de 200t/ha-1), 66% são madeira (sem casca), na qual estão contidos 35% do N, 35% do P, 45% do K, 25% do Ca e 20% do Mg extraídos pela cultura.

O descascamento da madeira no campo tem grande relevância para o sistema solo-planta em termos nutricionais. As cascas contêm entre 12 e 14% da massa do tronco. Representam cerca de 25% do total de resíduos florestais após a colheita, contendo cerca de 12% de N, 41% de P, 42% de K e 28% de Ca. Em um estudo conduzido na Estação Experimental de Ciências Florestais de Itatinga, Esalq/USP, foi verificado que, após a colheita da madeira sem casca de uma plantação de Eucalyptus grandis com 8 anos de idade, permaneceram sobre o solo aproximadamente 55t/ha-1 de resíduos.

No sistema de colheita em que a árvore inteira foi retirada, a quantidade de serapilheira remanescente foi de aproximadamente 30t/ha-1. No tratamento em que todos os resíduos foram mantidos sobre o solo, as folhas representaram 12%, os galhos, 32%, as cascas, 45%, e a miscelânea, 11%. No tratamento em que foi mantida apenas a serapilheira, a massa de folha, galho, casca e miscelânea representaram, respectivamente, cerca de 7, 47, 10 e 36% da biomassa de resíduos total.

Os resíduos florestais e as raízes são as principais fontes de matéria orgânica para o solo. No estudo mencionado, 300 dias após a colheita, 95% das folhas, 60% das cascas e 30% dos galhos haviam sido decompostos. Nesse período, foram liberados 50% do N, P, Ca, Mg e S e 80 % do K presentes nos resíduos florestais (folhas, galhos, cascas e serapilheira) mantidos sobre o solo.

O K apresentou liberação mais rápida que os demais nutrientes, pois esse elemento não forma nenhum composto dentro da planta, permanecendo em sua forma livre. A remoção dos resíduos da colheita teve expressivo efeito no teor e na qualidade da matéria orgânica do solo (MOS), diminuindo o teor de carbono orgânico oxidável e aumento da relação C/N na MOS.

Ou seja, houve incremento em frações mais recalcitrantes, em detrimento das frações mais lábeis, com reflexos negativos na dinâmica de mineralização de nutrientes e nas características da MOS, sobretudo na camada superficial do solo.

Os resíduos florestais podem influenciar, de diversas formas, a produtividade da floresta. De modo geral, quanto mais arenoso e menos fértil for o solo, mais intensos são os efeitos dos resíduos florestais. Em povoamentos de eucalipto estabelecidos em Latossolo Vermelho-Amarelo Distrófico de textura média, verificamos, quando todos os resíduos florestais foram mantidos sobre o solo, uma produção de 350m3/ha-1 de madeira ao final de oito anos de cultivo.

Quando só a serapilheira foi mantida (colheita das árvores inteiras), houve perda de 15% no volume de madeira, e, quando todos os resíduos foram removidos, a perda de produtividade foi de 39%. Nesse tratamento, no cultivo posterior, após a reforma florestal, houve perda de 6% de produtividade aos sete anos de idade.

Para a produção de uma tonelada de madeira de eucalipto, são consumidos, em média, 4kg de macronutrientes, e, para a produção de uma tonelada de folhas, galhos, cascas e serapilheira, são consumidos, respectivamente, 37, 16, 23 e 20kg/t-1 de macronutrientes. Com exceção do S, menos de 40% dos nutrientes acumulados na biomassa aérea estão contidos no lenho.

Entre os resíduos florestais (folhas, galhos, casca e serapilheira), a serapilheira merece atenção especial, pois contém cerca de 30% dos macronutrientes contidos no povoamento. A casca é uma importante fonte de Ca, K e P. Os galhos possuem baixa concentração de nutrientes. As folhas apresentam as maiores concentrações de nutrientes e baixa relação C/N, por isso se decompõem rapidamente, sendo importante fonte de nutrientes.

Quando a finalidade da plantação florestal é a produção de biomassa para a geração de energia, as folhas, os galhos, as cascas e, em alguns casos, a serapilheira podem ser levados junto com a madeira. Do ponto de vista nutricional e de conservação do solo, o sistema de colheita mais adequado é aquele que remove apenas a madeira (lenho), deixando todos os resíduos sobre o solo.

Em nossos estudos, verificamos que foram exportados 125t/ha-1 de biomassa e 502kg/ha-1 de macronutrientes, no tratamento em que foram mantidos todos os resíduos. No tratamento em que todos os resíduos foram removidos, exportaram-se 164t/ha-1 de biomassa e 1.340kg/ha-1 de macronutrientes. O balanço nutricional do povoamento, indispensável à sustentabilidade da produção madeireira, foi altamente dependente do manejo silvicultural empregado. Mesmo no tratamento mais conservacionista, em que todos os resíduos florestais foram mantidos, sem a aplicação de fertilizantes, não foi sustentável do ponto de vista nutricional.

Esse resultado pode ser explicado por três fatores principais: 1. baixo investimento em fertilização, sendo as entradas de nutrientes inferiores às saídas; 2. alta produtividade e, com isso, alta exportação de nutrientes; 3. baixa contribuição do solo como fonte de nutrientes, pois era de baixa fertilidade.

Para que a produtividade de madeira seja sustentável, o saldo entre a quantidade de nutrientes exportada e a quantidade de nutrientes aportada deve ser próximo a zero. Constatamos que, para repor todos os macronutrientes exportados pela colheita (apenas lenho), com o uso de fertilizantes, seria necessário um investimento de aproximadamente R$ 1.800,00 por hectare em fertilizantes. Caso a madeira e todos os resíduos florestais fossem extraídos, esse custo seria de, aproximadamente, R$ 4.150,00 por hectare.

Esse grande aumento (130%) no custo com fertilizantes se deve, em grande parte, à alta concentração de nutrientes nos resíduos. Assim, para repor os nutrientes contidos em uma tonelada de madeira, o custo com fertilizantes é de R$ 14,30. Os valores são muito maiores para cada tonelada de resíduos: folhas = R$ 135,00; galhos = R$ 45,00; casca = R$ 55,00 e; serapilheira = R$ 55,00. Considerando-se apenas o custo com fertilizantes, a reposição dos nutrientes contidos nos galhos, nas cascas e na serapilheira é viável economicamente.

Apenas para as folhas não seria viável, devido à sua alta concentração de nutrientes. Porém essa avaliação é complexa, devido à dificuldade de valoração financeira dos outros benefícios dos resíduos, algumas com efeitos em médio e longo prazo.

Para a tomada de decisão sobre a remoção de resíduos, devem-se considerar vários fatores relacionados à sua remoção:
1. ganhos ambientais decorrentes da utilização de uma fonte de energia renovável;
2. ganhos operacionais decorrentes da redução dos obstáculos para as operações silviculturais;
3. redução dos danos às máquinas e implementos; 4. facilidade de controle de algumas pragas e doenças.

Por outro lado, deve-se ponderar com vários fatores relacionados à sua manutenção:
1. aumento no teor e na qualidade do C orgânico do solo;
2. redução das perdas de água por evaporação e escoamento superficial;
3. redução dos extremos térmicos do solo;
4. proteção do solo contra erosão;
5. redução da compactação do solo pelo tráfego de máquinas;
6. redução da infestação de plantas daninhas;
7. aumento da atividade biológica do solo.

Fazendo um balanço de todos esses benefícios e oportunidades, entende-se que é possível utilizar parte dos resíduos florestais sem comprometer a conservação do solo e a sustentabilidade da produção. Para isso, alguns critérios devem ser considerados:
1. manter sobre o solo ao menos a serapilheira e as folhas;
2. manter, no mínimo, 70% da superfície do solo coberta com resíduos;
3. remover, preferencialmente, os resíduos lenhosos (cascas, galhos e ponteiros das árvores);
4. as quantidades de P, K, Ca e Mg contidas nos resíduos removidos devem ser repostas via fertilização, e o incremento na quantidade de N e S aplicada também deve ser considerado;
5. se o tempo de espera até o novo plantio for longo, maior quantidade de resíduos deve ser mantida sobre o solo para garantir sua cobertura, sobretudo em áreas mais suscetíveis à erosão;
6. no período de chuvas mais intensas e em áreas suscetíveis à erosão, como áreas declivosas e com solos mais erodíveis, todos os resíduos florestais devem ser mantidos sobre o solo.