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José Domingos Gonzalez Miguez

Coordenador Geral de Mudanças Globais de Clima do Ministério da Ciência e Tecnologia

Op-CP-11

O desenvolvimento das negociações mundiais

Visando enfrentar o problema de aquecimento global, que elevou a concentração de GEE - gases de efeito estufa, desde a Revolução Industrial, em particular do gás carbônico, que passou de 280 ppmv, para 379 ppm, representantes de mais de 150 países adotaram, em 1992, a CQNUMC - Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima.

A Convenção, que entrou em vigor no dia 21 de março de 1994, vem, desde então, sendo ratificada por um crescente número de países. Dentre os cinco princípios listados no Artigo 3 da Convenção, destaca-se o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas (Artigo 3.1). A responsabilidade é comum, porque quase toda atividade humana, em todos os países do mundo, gera emissões de GEE, bem como os impactos da mudança do clima, no longo prazo, afetarão a todos os países.

Além disso, a responsabilidade é diferenciada, porque alguns países são mais responsáveis pela causa do aquecimento global do que outros. Em conformidade com suas responsabilidades comuns, porém diferenciadas, os países do Anexo I, desenvolvidos, reconheceram e assumiram, voluntariamente, na Convenção, que deveriam tomar a liderança no combate à mudança do clima e a seus efeitos adversos.

Em 1997, foi formalizado o Protocolo de Kyoto, que especificava as metas de redução de emissões para cada país parte do Anexo I, para os anos de 2008 a 2012, denominados de primeiro período de compromisso. Para ajudar os países desenvolvidos a alcançarem suas metas de redução, foram elaborados três mecanismos dentro do Protocolo. Um deles é o MDL, Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, que surgiu a partir de uma proposta brasileira.

O MDL tem especial importância para os países em desenvolvimento, tendo em vista que é o único mecanismo estabelecido no âmbito do Protocolo, que permite participação voluntária dos países em desenvolvimento na mitigação dos GEE. É dentro do MDL que se encontra a possibilidade de fazer projetos de redução de emissões por fontes e de aumento de remoções por sumidouros de GEE, por meio de florestamento e reflorestamento.

O Acordo de Marraqueche, que constam nas decisões 11/CP.7 e 17/CP.7.  A Decisão 17/CP.7 estabelece que a elegibilidade de atividades de projeto de uso da terra, mudança no uso da terra e florestas - LULUCF - Land Use, Land Use Change and Forestry, no âmbito do MDL, está limitada a atividades de florestamento e reflorestamento.

A Decisão 11/CP.7 estabelece alguns princípios: exclusão da mera presença de estoques de carbono na contabilidade; contabilização, no momento adequado no tempo, da reversão de qualquer remoção, devido a atividades de LULUCF; exclusão das seguintes remoções decorrentes de:

1. concentrações elevadas de dióxido de carbono, acima do nível pré-industrial;
2. deposição indireta de nitrogênio, e
3. efeitos dinâmicos da estrutura etária, resultantes das atividades e práticas anteriores ao ano de referência e definições floresta, florestamento e reflorestamento.

Os proponentes de projetos do MDL florestal deverão seguir, primeiramente, as regras definidas na Decisão 19/CP.9. Essa decisão foi adotada na COP-9, 9ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, realizada em 2003, em Milão, Itália. A Decisão 19/CP.9 determina as definições, modalidades e procedimentos a serem incorporados e seguidos pelos países signatários, que desejassem desenvolver atividades no âmbito do MDL, na área florestal.

A Decisão 19/CP.9 estabeleceu várias definições: reservatórios de carbono, limites do projeto, remoção líquida de GEE por sumidouros na linha de base, remoção líquida real de GEE por sumidouros e remoção líquida antrópica de GEE por sumidouros. Somente no ano seguinte, em Buenos Aires, é que foram definidas as modalidades e procedimentos simplificados para atividades de projetos de pequena escala de florestamento e reflorestamento, no âmbito do MDL, durante o primeiro período de compromisso do Protocolo de Kyoto, e medidas para facilitar a sua implementação (Decisão 14/CP.10).

A decisão estabelece que as atividades de projeto de pequena escala de florestamento ou reflorestamento, no âmbito do MDL, devem resultar na remoção antrópica líquida de GEE, por sumidouros de menos de 8 quilotoneladas de dióxido de carbono por ano. A remoção excedente não será elegível para a emissão de reduções certificadas de emissões temporárias e de reduções certificadas de emissões em longo prazo.

No entanto, na última Conferência das Partes, realizada em Bali, em dezembro de 2007, alterou-se o limite de remoção de GEE, para os projetos de pequena escala de florestamento e reflorestamento, de 8, para 16 quilotoneladas de dióxido de carbono. As decisões relativas a florestas foram internalizadas pelas resoluções da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima, a Autoridade Nacional Designada brasileira.

A Resolução n° 2 estabeleceu critérios mínimos brasileiros para a definição de floresta: mínimo de cobertura de copa da árvore de 30%, área mínima de 1 hectare e altura mínima da árvore de 5 metros. Adicionalmente, a Resolução n° 3 estabeleceu as condições sobre comunidade de baixa renda, que devem ser obedecidas pelos projetos de pequena escala de florestamento/reflorestamento.

Hoje, existem dez metodologias de grande escala e três de pequena escala para projetos florestais. Essas metodologias são avaliadas (grande escala) ou propostas (pequena escala) pelo Conselho Executivo do MDL, em Bonn, Alemanha. O Conselho Executivo, por meio dos seus membros e do secretariado, é responsável pela supervisão geral e específica de todos os aspectos do MDL.

O Conselho deve, entre outras atribuições: estabelecer se os projetos submetidos satisfazem os critérios e se podem ou não ser registrados; aprovar ou não as emissões de Reduções Certificadas de Emissões – RCEs solicitadas; tratar das questões relativas à observância das modalidades e dos procedimentos do MDL, pelos participantes dos projetos.

Cabe ao Conselho, também, estabelecer comitês, painéis ou grupos de trabalho, para auxiliá-lo. Foi nesse sentido que se implementou o Grupo de Trabalho de Florestamento e Reflorestamento. Esse grupo reuniu-se, pela primeira vez, em julho de 2004, após ter sido estabelecido na décima-quarta reunião do Conselho Executivo, com o objetivo de avaliar e fazer recomendações sobre propostas de metodologias de linha de base e monitoramento, no âmbito das atividades de projetos de florestamento e reflorestamento.

O grupo deve trabalhar em cooperação com o Painel de Metodologias. Atualmente, o grupo de trabalho é composto por sete membros e um membro do painel de metodologias também participa das deliberações. Em 2008, fui designado, pelo Conselho Executivo, para presidir este grupo de trabalho. Dois projetos brasileiros já tiveram metodologias aprovadas na área florestal.

Uma é metodologia do projeto AES Tietê, que visa o florestamento e reflorestamento das APPs - Áreas de Proteção Permanente, no entorno dos reservatórios no estado de São Paulo. Essa é uma metodologia que pode ser replicada para a recuperação de áreas de matas ciliares degradadas, ou a recomposição de áreas de reserva legal, desde que não se objetive explorá-las economicamente.

A outra é a metodologia da Plantar, que visa o florestamento e reflorestamento em áreas de campo, para fins industriais, com o objetivo de utilizar a madeira para produção de carvão vegetal, a ser usado na siderurgia. As negociações internacionais para o MDL florestal foram difíceis, sendo que esse tipo de MDL foi regulamentado apenas em 2003.

Depois de um longo processo de discussão, a primeira metodologia só foi aprovada em 2006, e o primeiro projeto foi registrado pelo Conselho Executivo do MDL, em novembro de 2006. O número de projetos do MDL florestal ainda é pequeno, se compararmos com os projetos de geração de energia. Acredita-se que essas dificuldades devem-se a não inclusão das RCEs temporárias e de longo prazo no ETS - European Trade Scheme (Comércio de Emissões Europeu), da União Européia, afastando, assim, os investidores.

Outra barreira é a demora de 6 a 7 anos para as árvores alcançarem um tamanho adequado para a verificação das remoções, indo além de 2012, ultrapassando o primeiro período de compromisso. O Mapa do Caminho, definido na reunião de Bali, estabeleceu o processo de negociação para o segundo período de compromisso para o Protocolo de Kyoto e sua extensão, o que ampliará a perspectiva para o mercado do MDL florestal. Esse processo, lançado em Bali, visa estabelecer as metas dos países do Anexo I, para o segundo período de compromisso. Esperamos que seja concluído com sucesso na COP-15, em Copenhagen, Dinamarca, em 2009.