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Maria Dalce Ricas

Superintendente Executiva da Amda

Op-CP-05

Se social e ambientalmente responsável, a floresta plantada é uma aliada na preservação da floresta nativa

A implantação de florestas homogêneas para a produção de madeira tem gerado grande polêmica no Brasil e no mundo. Como ambientalista preocupada com a harmonização entre a produção econômica e a proteção dos ambientes naturais, penso que esta atividade deve ser encarada como outra qualquer, que se desenvolvida de acordo com a lei e com as normas técnicas relacionadas aos cuidados ambientais, pode resultar na redução da pressão sobre as florestas nativas.

Para mim, utilizar madeira nativa sabendo que mais de 90% da atividade desenvolve-se de forma irregular é inconcebível: ao fazer isso, estamos sendo cúmplices da destruição da Amazônia ou do que restou da Mata Atlântica. Recentemente, ao buscar janelas e portas de eucalipto para a construção de minha casa, tive grande dificuldade em encontrá-las. Segundo os fabricantes, ainda há falta de matéria-prima, capaz de abastecer o mercado.

Penso que o grande foco desta discussão deva ser deslocado para a forma como são feitos estes plantios. Independentemente de ser cultivo de florestas, de pastagens ou grãos, todos podem provocar impactos ambientais e sociais da maior gravidade ou serem implantados de forma cuidadosa, minimizando significativamente suas conseqüências nocivas.

Das culturas que hoje ocupam as maiores áreas no país, com exceção da soja e das florestas, as demais são quase tão antigas, quanto à colonização do território brasileiro pelos europeus e estão incorporadas à “cultura agrícola” do país e à “visão do rural” de nossa população. E das duas, o cultivo de florestas é a que menos se enquadra a esses dois ícones citados.

 Além disso, as florestas homogêneas diferem fisicamente de todas as demais. Têm porte florestal, mas são muito diferentes das florestas nativas, o que resulta em impactos culturais e forte rejeição emocional. De forma geral, quando as pessoas atravessam quilômetros e quilômetros em pastagens ou em plantações de grãos, raramente se dão conta que estão em meio a ambientes modificados pelo ser humano.

No entanto, quando se trata de florestas plantadas, poucos são aqueles que não expressam estranheza, repulsa ou indignação. Menos ainda são aqueles que percebem os danos ambientais causados pelas monoculturas, como a grande quantidade de solo e agrotóxicos carreados aos cursos d´água e a destruição da biodiversidade.

E comparando os danos provocados pelas diversas culturas, com aqueles ocasionados pelo cultivo das florestas industriais, os impactos das últimas é ainda infinitamente menor, situação decorrente, principalmente, das extensões de áreas utilizadas. Se consideradas pontualmente, ou seja, focando áreas específicas, as monoculturas florestais são responsáveis, sem dúvida, por grandes e graves impactos socioambientais, igualando-se a diversas outras atividades econômicas.

E essa situação deve-se, em grande parte, à omissão de órgãos, como o antigo IBDF (que antecedeu ao Ibama), que aprovava o plantio de florestas de produção, em completo desacordo com a legislação florestal da época. Do final da década de 1960 a meados da década de 1980, somente em Minas Gerais, foram mais de dois milhões de hectares de florestas homogêneas implantadas, com recursos dos incentivos fiscais para a atividade, a maior parte sem a observância das reservas legais e áreas de preservação permanente.

E, infelizmente, essa situação ainda vem se repetindo em algumas regiões de Minas, com grandes plantios contínuos e com a ocupação de veredas, topos de morros e margens de cursos d´água. Insisto, portanto, que a discussão sobre o assunto deva ser dirigida mais à forma de produção adotada, ao invés de crucificar a atividade, de forma generalizada. Não adianta negar a realidade, por fatores apenas emocionais: a demanda e consumo de madeira para os mais diversos fins são crescentes e esse mercado vem sendo abastecido através do desmata-mento de florestas nativas.

Essas considerações, portanto, levam à conclusão de que o plantio de florestas deve ser estimulado e incentivado, com a observância rigorosa das normas ambientais, de maneira a atender ao mercado e proteger as formações florestais nativas. Cabe lembrar que a tecnologia para que isso aconteça já se encontra bem desenvolvida, sendo já utilizada por produtores de várias partes do país.

Uma das premissas básicas para o crescimento da atividade, de forma respeitosa para com o meio ambiente, ao meu ver, é a de utilização de áreas já desmatadas e improdutivas. Nesta situação, existem terras abundantes em todo o país, resultantes do modelo de avanço desordenado da ocupação territorial. E boa parte delas com altos índices de degradação ambiental.

E para concluir, penso ser fundamental refletir sobre o consumo e o desperdício, não somente de madeira, mas de produtos e matérias-primas de um modo geral. O Brasil prima pelo mau uso de seus recursos naturais, situação que, sem dúvida, relaciona-se a uma de suas mais tristes heranças culturais: em um ambiente em que a natureza é extremamente generosa, as pessoas que se preocupam com uso racional dos recursos são ainda minoria absoluta.

E na área florestal, essa herança parece ser ainda mais evidente: é amplamente conhecido o hábito do desperdício, desde o processo de retirada da madeira na floresta, até o seu consumo nas cidades ou áreas rurais. Isso sem contar com o que é consumido pelos incêndios florestais, que anualmente destroem milhares de hectares de vegetação nativa. Por tudo isso, não há como negar a importância da atividade de plantio de florestas industriais, desenvolvida em base social e ambientalmente responsável, de forma a se tornar aliada indispensável na preservação das florestas nativas.