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Silvio Frosini de Barros Ferraz

Professor de Manejo de Bacias Hidrográficas da Esalq-USP

Op-CP-27

Vão-se as árvores, mas ficam... espera aí! o que é que fica?

Vai chegar um tempo em que o mais importante será o que fica e não o que se retira da terra, ou seja, a madeira terá menos valor do que os serviços ecossistêmicos que a floresta presta. Quando isso ocorrer, certamente teremos mais segurança para afirmar que estamos no caminho certo em direção à sustentabilidade.

Tudo deveria ficar no campo: a biodiversidade, o solo e seus atributos, as pessoas e seus aspectos culturais e a água, em quantidade, qualidade e regularidade. Quando colhemos uma floresta plantada, qual será a parcela de serviços que estamos efetivamente deixando na terra?

Atualmente, dentre os vários serviços ecossistêmicos, os relacionados à água são os que mais chamam a atenção, preocupam a sociedade e causam polêmica quando se trata de plantios florestais.

A floresta tem uma relação complexa e, ao mesmo tempo, delicada com a água, que funciona muito bem em ecossistemas naturais maduros, mas que, em sistemas de manejo para produção, requer cuidados para não causar desequilíbrios e, consequentemente, impactos.

Os sistemas de produção florestal, por estarem otimizados para a obtenção da máxima produtividade, consomem mais água e têm seus impactos intensificados tanto no pico do crescimento quanto nas operações de colheita e início da nova rotação, quando o solo é descoberto, e as funções da floresta não podem ser exercidas.

No entanto dados do Promab (Programa de Monitoramento Ambiental em Microbacias – Ipef/Esalq), que monitora microbacias em áreas nativas e de reflorestamento no Brasil, mostram que o impacto das florestas plantadas na água é pequeno e, quando existente, está relacionado a três fatores principais: a não observação da disponibilidade hídrica regional, as alterações na vazão de riachos, em função do manejo e do crescimento dos plantios de rápido crescimento, e a produção de sedimentos pelo corte raso da floresta e planejamento inadequado de estradas florestais.

Nota-se que os dois últimos aspectos estão diretamente ligados ao planejamento, ao manejo e à operação da colheita florestal. Existem diversas técnicas já desenvolvidas para melhorar a conservação da água e dos solos nos ecossistemas agrícolas e florestais.

Estudos recentes conduzidos no Laboratório de Hidrologia Florestal (LHF) da Esalq/USP recomendam diferentes técnicas para a readequação de estradas florestais, relatam os benefícios da redução da área de corte-raso, definem metodologias para identificação de áreas hidrologicamente sensíveis do terreno que precisam ser manejadas com maior cuidado, mostram a possibilidade de estabilização do deflúvio anual pelo manejo em mosaico de plantios de curta duração e apresentam alternativas para zoneamento hidrológico regional e local como subsídio ao planejamento florestal.

Enfim, já existem conhecimento e técnicas suficientes para melhorar o manejo florestal, buscando-se aumentar o valor de conservação das áreas de reflorestamento a fim de deixar algo mais no campo. A cada rotação, vão-se as árvores na colheita, mas a água sempre precisa ficar, durante todo o ciclo, em quantidade e qualidade.

Está cada vez mais claro que, quando a água não fica, o problema está no manejo inadequado às condições naturais locais. Este tem que ser aperfeiçoado continuamente, tentando incorporar melhorias baseadas em programas de monitoramento de longo prazo.

O que pode estar faltando então? Ações de conservação da água ainda são vistas como um custo extra a ser contabilizado na atividade principal. Falta, portanto, a mudança de visão que permita enxergar, além da madeira, outros valores que precisam ser mantidos e, eventualmente mesmo, explorados como fonte de receita.

Enquanto esses valores não forem considerados nos planos de manejo como parte integrante da atividade, serão poucos que conseguirão enxergar a importância de se investir um pouco mais no que fica no campo para que todos possam colher os frutos no futuro.

Quando esse momento chegar, estaremos tratando não mais de plantio florestal em que há colheita, mas sim de uma floresta, diferente da natural, por ser plantada e manejada, mas que pode oferecer uma série de benefícios econômicos, sociais e ambientais, muito mais importantes do que apenas a madeira das árvores. Porque, nessa atividade, mais cedo ou mais tarde, vão-se árvores, e, portanto, precisamos cuidar mais do que fica.