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Rubens Cristiano Damas Garlipp

Superintendente da Sociedade Brasileira de Silvicultura

Op-CP-01

Cerflor - Programa brasileiro de certificação florestal

A certificação florestal vem se tornando um importante mecanismo para promover o manejo sustentável e o comércio de produtos florestais. Nos anos 80, os altos índices de desmatamento nas regiões tropicais fizeram crescer, na visão da sociedade, a importância das florestas como provedoras de serviços ambientais. Acordos entre países e medidas domésticas para mitigar práticas insustentáveis não surtiram efeito; países, compradores e ONG’s adotaram barreiras e boicotes.

Nos anos 90, as Convenções Rio-92 e os Princípios sobre Florestas – primeira tentativa de consenso global – determinaram que todas as florestas deveriam ser sustentáveis. A proteção de ecossistemas florestais assumiu caráter estratégico no cenário competitivo em que se inserem empresas e países de base florestal, como o Brasil. Antevendo a necessidade do setor empresarial adaptar-se a essas tendências e de antepor-se a barreiras não tarifárias, em 1991, no Congresso Florestal Mundial em Paris, a Sociedade Brasileira de Silvicultura propôs a criação de um programa nacional de certificação, como estratégia de longo prazo.

Com apoio de instituições de ensino e pesquisa, organizações não governamentais, entidades de classe, associações empresariais e órgãos reguladores, foi desenvolvido o Cerflor, Programa Brasileiro de Certificação Florestal, lançado em 2002, pelo Ministério da Indústria , Desenvolvimento e Comércio Exterior. Gerenciado pelo Inmetro, Instituto Nacional de Metrologia e Qualidade Industrial, o Cerflor foi estruturado de acordo com preceitos internacionalmente aceitos.

Transparência, governança, independência, caráter voluntário e não discriminatório, normas - para florestas plantadas, florestas naturais, cadeia de custódia e de auditoria - elaboradas no âmbito da ABNT, padrões de manejo contendo princípios, critérios e indicadores exeqüíveis fundamentados na ciência, consenso entre as partes interessadas, revisões periódicas, procedimentos de apelação, alinhamento com tratados inter-governamentais, compatibilidade com a legislação e com políticas nacionais sobre manejo florestal sustentável - MFS, fazem do Cerflor um programa completo e a principal iniciativa do Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade.

Com tais quesitos, o programa encontra-se em processo de reconhecimento internacional junto ao PEFC,  Programme for the Endorsement of Forest Certification schemes, o maior sistema mundial de reconhecimento de florestas certificadas (123 milhões de ha), composto por 31 programas nacionais independentes, em todos continentes. A existência de vários programas de certificação florestal no mundo tornou-se inevitável.

Não seria possível um único programa contemplar toda a tipologia florestal, condições ambientais, sociais, econômicas e culturais. Critérios uniformes aplicados unilateralmente a realidades distintas, em que há grande diversidade de vantagens comparativas naturais, resultariam em discriminação. Tais fatos, reforçam o acerto da concepção de um programa brasileiro próprio, adotando padrões adequados às nossas peculiaridades.

Os padrões são diferentes quando se compara floresta natural com floresta plantada, da mesma forma que são diferentes para floresta boreal e tropical. Se normas internacionais são aceitáveis para uma ampla gama de produtos e processos, no caso do manejo florestal isto não é tão simples. Há maior dificuldade em obter informações definitivas, pois a produção florestal resulta da interação dos recursos naturais, fenômenos climáticos, funções biológicas, fatores abióticos e recursos humanos.

De outro lado, a existência de diferentes programas operando num mesmo país, como ocorre no Brasil, evita o monopólio da certificação, induz à revisão de conceitos e possibilita incorporar avanços científicos. Embora concebida como resposta ao desflorestamento nos trópicos, a certificação não é instrumento para combater o desmatamento e sim, para promover o MFS.

Hoje, há 222 milhões de hectares de florestas certificadas no mundo. A maior parte, 95%, encontra-se em países das zonas boreais e temperadas e são justamente estes países que mais se têm beneficiado deste mecanismo. O Brasil detém a maior área certificada da América Latina: são 3,8 milhões ha, dos quais 32% de florestas naturais e 68% de florestas plantadas.

Embora de operacionalização recente - iniciada em 2003, a certificação pelo Cerflor tem sido requerida por várias empresas do setor celulósico, papeleiro e de madeira processada (Inpacel, Rigesa, Aracruz, Veracel, Cenibra e outras) e até o final deste ano já representarão 700 mil ha. Em sintonia com sua importância para a sustentabilidade florestal e para as relações comerciais, as empresas brasileiras conciliam vantagens comparativas (clima, solo, base florestal, tecnologia de precisão e capacidade organizacional), com vantagens adicionais que o Cerflor oferece, como passaporte para mercados exigentes.

As contribuições do manejo certificado com vistas à sustentabilidade têm expressado-se em benefícios como: conservação da biodiversidade, dos recursos hídricos, solos e ecossistemas frágeis; respeito aos direitos das populações tradicionais e comunidades locais; melhores condições de trabalho e qualidade de vida; formação de expertises nacionais; maior envolvimento dos stakeholders; estabilidade de empregos e capacitação dos trabalhadores; desenvolvimento de empreendedores locais; consideração de questões como posse e uso da terra; obtenção de produtos florestais não madeireiros; melhores planejamento, gestão e desempenho; economia de custos; aumento da produção florestal e redução de desperdícios; utilização de novas espécies ou de espécies menos conhecidas; melhoria da imagem corporativa; confiança dos investidores e acesso a financiamentos; acesso melhorado e / ou manutenção de mercados.

A sociedade em geral e muitos consumidores finais ainda não perceberam os requisitos e compromissos contidos nos padrões de manejo e na certificação. A certificação não é apenas uma credencial a mais para as empresas competirem lá fora. Constitui-se em mecanismo de mudança de postura dos produtores e das empresas. Deve ser encarada como investimento e não como custo, pois a interação dos silvicultores e das empresas com o meio ambiente em que operam pode significar legitimação da atividade junto à sociedade, melhor ou pior posicionamento no comércio internacional, acesso, manutenção ou mesmo a exclusão de mercados.