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Niro Higuchi

Pesquisador do Inpa Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia

Op-CP-07

Manejo florestal sustentável na Amazônia brasileira

Falar (ou escrever) sobre Manejo Florestal Sustentável, MFS, é fácil; difícil mesmo é praticá-lo. Os discursos de todos os segmentos da sociedade são maduros, mas as práticas estão verdes ainda. O discurso de um político sobre MFS é o mesmo de um pesquisador, de um Ministro de Estado ou de um ambientalista. São todos irretocáveis. Em outras regiões tropicais, isto começou há mais de um século e continua acontecendo.

O primeiro manual de manejo de florestas tropicais foi publicado em 1860. Este manual foi escrito para a Tectona grandis (teca), especialmente, da Índia e de Myanmar - antiga Birmânia, quando os princípios da sustentabilidade foram introduzidos ao manejo florestal. O conceito “desenvolvimento sustentável”, por sua vez, só foi popularizado a partir do relatório de Brutland, em 1987. O manejo de florestas tropicais mistas iniciou-se na 1ª década do século passado, sofreu as conseqüências da depressão e voltou a intensificar-se após a II Guerra.

Os sistemas utilizados foram: Malaio Uniforme, de Bosques Abrigados e o Seletivo. Os seguintes países manejaram suas florestas sob um destes três sistemas: Nigéria, Libéria, Costa do Marfim, Camarões, Gabão, República Centro Africana, República do Congo, Gana, Malásia, Indonésia, Filipinas, Camboja, Tailândia, Vietnã, Índia, Sri Lanka, Papua Nova Guiné, Fiji, Nicarágua, Trinidad Tobago e Honduras.

Ao todo, são mais de cem anos tentando manejar as florestas tropicais, sob os princípios da sustentabilidade. Resultados? Se o mercado quiser teca, é mais fácil encontrar em Cáceres, MT, do que na Índia ou Myanmar. Os famosos dipterocarpos do sudeste asiático e o mogno africano são coisas do passado. Os estoques? Em menos de dez anos, o mercado internacional de madeira tropical entrará em colapso; os dois principais fornecedores (Malásia e Indonésia) desaparecerão; e, o Brasil, com a sua Amazônia quase intacta, não tem tecnologia para substituí-los.

Com base no IDH de 2002, de 176 países, dos produtores de madeira tropical, o melhor rankeado é a Malásia, que ocupa o 59º lugar; o Brasil é o 81º. Considerando a situação atual do mercado internacional de madeira tropical, este produto poderia ser considerado como oportunidade para a Amazônia. Poderia, mas não mantendo o preço atual da madeira em pé e a falta de controle de acesso. Hoje, menos de 20% da madeira comercializada na Amazônia tem origem de planos de MFS, aprovados pelo Ibama (ou órgão estadual).

Acrescente-se a isto, a falta de cultura florestal em países tropicais e a falta de conhecimento. Diante das condições atuais, a pressão do mercado sobre a madeira da Amazônia é uma ameaça. A razão assimétrica entre o conhecimento acumulado e a idade das árvores que são exploradas na região ainda não é suficiente para prescrever tratamentos que garantam a sustentabilidade do manejo.

Em um trabalho publicado na Nature, há o registro de uma árvore com 1480 anos de idade, que foi explorada por uma empresa da região de Manaus, AM. A pesquisa mais antiga na Amazônia tem 30 anos. Na verdade, há 5 experimentos com manejo florestal na Amazônia: na região do Jarí, AP, em Paragominas, PA, Flona de Tapajós, PA, Manaus, AM, e em Rio Branco, AC. São menos de 10 pesquisadores envolvidos diretamente com a questão do MFS.

No Amazonas, por exemplo, o preço de um hectare de floresta virgem pode variar de R$ 40,00 a R$ 150,00, o que daria de R$ 4,00 a R$ 9,00 o m3 de madeira em tora (em pé). Com este valor, dificilmente, algum empresário vai investir na regeneração natural para cortes sucessivos na floresta residual do manejo florestal ou, até mesmo, para manter a floresta em pé.

É mais fácil e mais barato comprar uma área nova e recomeçar o processo de exploração florestal. Como conseqüência, na Amazônia, há uma correlação positiva e altamente significante entre produção de madeira e desmatamento. De outro lado, a mesma produção de madeira não apresenta nenhuma correlação com o PIB per capita dos Estados da Amazônia.

Na exploração florestal, o desperdício é ainda muito grande. A retirada de uma árvore comercial implica em danos em quase 20 outras árvores, com diâmetros maiores que 10 cm. Na transformação, as melhores serrarias não atingem 30% de aproveitamento da tora. O desperdício de 70% no pátio da indústria é lixo e poluição ambiental. Se, pelo menos, este desperdício fosse deixado na floresta, isto poderia ser considerado como fertilizante.

A certificação florestal foi uma esperança para mudar este quadro na Amazônia. Não mudou. No Amazonas, por exemplo, há (ou havia) duas empresas certificadas e ambas foram multadas pelo Ibama. Considerando que o princípio nº 1 (dos 9 existentes) da certificação é o cumprimento da lei vigente, isto quer dizer que a certificação não é uma garantia para o MFS.

O Governo Federal reconhece o quadro pintado aqui e tem tentado melhorar a situação. Por falta de pessoal e de conhecimento, às tentativas têm se somado mais fracassos do que sucessos. A lei de gestão florestal, por exemplo, vai aumentar a oferta da madeira. Com aumento da oferta, o preço justo vai ter que ser adiado.

A solução está na transformação dos problemas apontados em objetivos, com profissionalismo, mas sem parcimônia. Não haverá MFS na Amazônia, se em cada Estado da região não houver, no mínimo, 50 pesquisadores florestais e 100 engenheiros florestais no Serviço Florestal; todos devidamente instrumentados e capacitados. Ações estratégicas são necessárias para valorizar a madeira em pé, nem que seja pela brusca diminuição da oferta deste produto. Enquanto isso, as árvores caídas poderiam entrar como oferta de madeira ou de matéria-prima para obras de arte e artesanato.