Me chame no WhatsApp Agora!

Paulo Eduardo Artaxo Netto

Professor de Física Aplicada do Instituto de Física da USP e Membro do IPCC

Op-CP-23

Queimadas na amazônia e mudanças climáticas globais

A região amazônica está passando por um forte e rápido processo de transformação, com importantes mudanças no uso do solo. Áreas de florestas estão sendo transformadas em pastagens, plantações agrícolas ou outros usos. A derrubada da floresta é, geralmente, seguida de queimadas para eliminação de troncos e materiais vegetais. As emissões de queimadas alteram profundamente as propriedades atmosféricas não só na região amazônica, mas na maior parte da América do Sul.

Emissões de partículas de aerossóis alteram fortemente o balanço de radiação atmosférico, afetando a taxa fotossintética em grandes regiões da Amazônia. As partículas emitidas em queimadas promovem a difusão da radiação, aumentando a taxa de radiação difusa, o que faz com que a floresta aumente a taxa de absorção de carbono em até 40% para valores de espessura ótica de aerossóis de até 1 em 550nm. Para quantidades altas de aerossóis, a redução da quantidade de radiação é tão forte, que a taxa fotossintética se torna zero, mesmo no meio do dia.

O balanço de radiação é significativamente alterado, com atenuação de radiação ao nível do solo de até 350 watts/m². Em média de 7 anos de medidas contínuas do experimento LBA em Alta Floresta, a redução do balanço de radiação foi de 37 watts/m², valor que pode ser comparado com o aquecimento dos gases de efeito estufa da ordem de 1.6 w/m².

O efeito da redução de temperatura na superfície é de cerca de 2 graus centígrados. Os aerossóis de queimadas transportam nutrientes importantes para a floresta, tais como fósforo, potássio, nitrogênio e outros.

A composição elementar e iônica da água de chuva em amplas regiões da Amazônia é bastante afetada pelas emissões de queimadas, com aumento da acidez e da concentração de ácidos orgânicos, além de elementos associados com emissões de queimadas, tais como potássio, carbono grafítico, nitrogênio, zinco e outros elementos.

As altas concentrações de aerossóis (de até 600 ug/m³) são responsáveis por fortes efeitos no agravo de doenças na população amazônica, em particular aumento de internações hospitalares por doenças respiratórias.

As emissões de queimadas alteram profundamente as propriedades microfísicas de nuvens, inibindo processos responsáveis pela taxa de precipitação de nuvens quentes na Amazônia. As nuvens formadas possuem gotas menores do que as nuvens naturais, dificultando o crescimento dessas gotas para tamanhos onde possa haver precipitação.

As nuvens se tornam mais brilhantes, alterando o balanço radiativo atmosférico. As emissões gasosas de queimadas (CO, hidrocarbonetos, VOCs) produzem ozônio em altas concentrações, de até 120 ppb. Essa alta concentração de ozônio inibe o crescimento da floresta e de plantações de soja em regiões a milhares de quilômetros longe das emissões primárias de queimadas.

As grandes emissões de gases de efeito estufa (principalmente metano e dióxido de carbono) através das queimadas fazem dessa atividade a maior fonte de gases de efeito estufa do Brasil, suplantando as emissões industriais e de transporte de todo o País. Os impactos ambientais das emissões de queimadas não se restringem à região amazônica, estendendo-se ao sul do Brasil, Paraguai, Bolívia e áreas adjacentes.

É impossível quantificar com o conhecimento atual da ciência os efeitos das emissões de queimadas na taxa de precipitação nessas regiões. A sensível redução recente das taxas de desmatamento – de um patamar de 27.000 km² em 2004-2005 foi possível a redução para 5.200 km² em 2009-2010, de acordo com o INPE – reflete-se nos efeitos atmosféricos decorrentes da redução das emissões de queimadas, reduzindo emissões de gases de efeito estufa e melhorando a saúde da população.

Esperamos que o Brasil estruture políticas públicas que reduzam o desmatamento a níveis muito baixos, com benefícios importantes ao meio ambiente e à biodiversidade dessa rica região brasileira.