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Cláudia Azevedo-Ramos

Diretora do Serviço Florestal Brasileiro

Op-CP-21

A sustentabilidade da madeira tropical

Em 2006, o Congresso aprovou a lei 11.284, a lei de Gestão de Florestas Públicas,  cujo aspecto mais relevante foi estabelecer que as florestas públicas (FP) devem permanecer florestas e públicas. Até 2009, o Cadastro Nacional de Florestas Públicas cadastrou  211 milhões de ha. Destas, 93% encontram-se na Amazônia. Isso trouxe ao Estado enorme responsabilidade em relação à gestão e ao papel estratégico das FP na economia e no bem-estar socioambiental do País.  

Embora negado pelo modelo de desenvolvimento aplicado à Amazônia, é preciso insistir em que a vocação da região é florestal e em que seus recursos podem ser os principais vetores do desenvolvimento. Ainda que o setor de base florestal no Brasil colabore com 3,5% do PIB do País, 5,2% das exportações (US$ 7 bilhões em 2006) e 12,6% do superavit comercial do País (fonte: IBGE), o potencial de 80,5% de estoque de biomassa acima do solo da Amazônia brasileira ainda não foi devidamente aproveitado. Entre essências, óleos, látex, fármacos, frutos e outros, a madeira é, ainda, a estrela principal.

É fácil vislumbrar o papel estratégico da madeira tropical para o País. Estudo recente do Serviço Florestal Brasileiro e do Imazon indica que 79% da madeira processada na Amazônia, em 2009, foi destinada ao mercado interno, especialmente, São Paulo e Nordeste. A receita bruta foi de R$ 4,9 bilhões, com uma demanda em torno de 14 milhões de m3 de madeira em tora. Considerando que,  em 2004, esses números eram bem maiores (R$ 6,7 bilhões; 24,5 milhões de m3), estamos bem abaixo do potencial.

O acirramento da fiscalização e a proibição, em 2003, de autorização de novas explorações pelo Ibama, já que algumas aconteciam em FP, contribuíram para a queda na produção. Nesse cenário de estrangulamento da madeira ilegal e de empresas atuando majoritariamente de forma predatória e clandestina, o Estado foi obrigado a oferecer uma alternativa viável e sustentável.

A mesma lei 11.284 buscou conciliar atividade econômica e sustentabilidade socioambiental ao permitir o uso de concessões florestais e de serviços em terras públicas.  Por esse dispositivo,  o direito ao manejo de recursos florestais é repassado – de forma onerosa e competitiva – a um ente privado por um período de até 40 anos, mantendo as florestas e as terras sob domínio público. Os recursos financeiros advindos das concessões retornam, por lei, ao desenvolvimento e à conservação florestal.

Atualmente, existem 145 mil ha de Florestas Nacionais (Flonas) em regime de concessão e 535 mil ha em editais de licitação. As transformações consequentes já são visíveis. Por exemplo, a melhoria da capacidade empresarial e operacional das empresas para atender aos contratos. Com o acúmulo de concessões, a consequência inexorável é a modernização do setor. As empresas precisam, entre outras coisas, usar técnicas de exploração de baixo impacto, agregar valor à matéria-prima, promover pesquisas, respeitar normas trabalhistas, gerar empregos locais e se submeter a auditorias independentes.

Municípios abrangidos pelas concessões também demonstram mudanças ao se adaptarem para recepcionar uma atividade econômica estável, novas indústrias e novos postos de trabalho. Adicionalmente, concessionários que investirem em benefícios sociais e infraestrutura no município recebem abatimento no valor devido à concessão.

Essa movimentação na economia pode alcançar repercussão relevante, pois as concessões florestais, em regra, ocorrem em regiões deprimidas economicamente. Nesse sentido, a produção florestal sustentável alimentaria um setor dinâmico, trazendo emprego, renda, indústrias, pesquisa e tecnologia para a região. Milhares de pequenos produtores florestais poderiam também se beneficiar desse mercado ativo.

Atualmente, as Flonas com potencial para concessão na Amazônia somam 10,7 milhões de ha. Considerando uma demanda de madeira em tora de 14 milhões de ha/ano e uma produtividade de 18m3/ha, apenas 21% dessa demanda seria atendida. Para atingirmos 70% da demanda, é preciso mais que triplicar as áreas existentes. Embora outras FP estaduais e privadas possam ajudar a completar essa conta, é imperativa uma decisão estratégica em relação aos ativos florestais naturais e à convergência de políticas públicas nessa direção.

A conversão de florestas em atividades econômicas predatórias manteve a região respondendo por apenas 8% do PIB e não beneficiou os mais de 10 milhões de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza. O modelo de desenvolvimento alternativo deve ter a população e os ativos florestais como seu foco principal. Aqui, só falamos de madeira.