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Edgard Campinhos Júnior

Consultor Internacional em Silvicultura

Op-CP-03

Os plantios clonais de eucalyptus no Brasil: uma realização surpreendente

Existem várias técnicas para se propagar vegetais assexuadamente, isto é, sem utilizar as suas sementes, tais como: enxertia, alporquia, mergulhia, cultura de tecidos, estaquia, etc. A todos estes métodos dá-se o nome de clonagem, significando que os clones são cópias idênticas da planta matriz. As plantas matrizes devem reunir características e qualidades desejáveis e assim há o interesse em perpetuá-las pela clonagem.

As matrizes podem ser selecionadas entre descendentes oriundos de cruzamentos controlados ou por seleção, em populações nativas ou em plantios seminais. O que aconteceu com o Eucalyptus no Brasil? O Agrônomo Edmundo Navarro de Andrade, da Estrada de Ferro Paulista, trouxe da Austrália e da Indonésia, há cerca de 100 anos, uma coleção de dezenas de espécies de Eucalyptus, que foi plantada no Horto Florestal de Rio Claro, SP, com o objetivo de selecionar as melhores espécies para produção de lenha para as locomotivas.

Ocorreram cruzamentos naturais entre espécies. Foram feitos plantios com estas sementes híbridas ao longo dos anos, em diversas partes do Brasil. Com a criação do Incentivo Fiscal para Reflorestamento, em 1966, muitos projetos foram criados e utilizaram principalmente Eucalyptus e Pinus. Dentre os projetos estava a Aracruz, que se estabeleceu no Município de Aracruz, ES, com o objetivo de instalar uma fábrica de polpa de celulose branqueada de Eucalyptus.

Três espécies foram eleitas: E. urophylla, E. grandis e E. saligna, e utilizamos sementes do Horto de Rio Claro, bem como a tecnologia para produção de mudas, que não funcionou na região de Aracruz: semeadura em canteiros para repicagem das mudas em torrões paulista, preparados com terra e esterco. A ocorrência de doenças era intensa.

Solução: após vários testes, passamos a utilizar terra amarela de subsolo, fertilizada com NPK, em sacolas de plástico, semeadura direta na embalagem, germinação e crescimento, a pleno sol.

Não ocorreram mais doenças no viveiro e as mudas eram rustificadas para atenderem ao processo de plantio irrigado, desenvolvido por nós, que possibilitou o plantio durante todo o ano (independente de chuva), bem como o funcionamento permanente do viveiro. Isto ocorreu em 1969/70 e possibilitou otimizar o plantio de milhares de hectares ao longo de cada ano, sistematicamente com perfeição.

Os plantios cresciam e eram muito heterogêneos, com falhas e com ocorrência de doenças, especialmente o cancro (Cryphonectria cubensis). Porém, destacavam-se algumas plantas espetaculares nos talhões de E. grandis e E. urophylla, com excelente forma, grande volume e saudáveis. Sabíamos que seria impossível obter bons resultados com a utilização de sementes daquelas árvores.

A Empresa decidiu coletar sementes na Austrália (E. grandis) e em Timor (E. urophylla), nas procedências com condições ecológicas mais similares às de Aracruz, para desenvolver um vasto programa de melhoramento genético. O E. saligna já estava descartado. Assim, em 1973, viajamos para a Austrália e Timor. Nesta viagem mantivemos contato com pesquisadores do CSIRO em Coff´s Harbour (NSW), que nos mostraram o resultado de enraizamento de estacas de Eucalyptus, cuja pesquisa tinha sido iniciada por técnicos franceses.

Vimos também, neste centro de pesquisas, uma fileira de E. grandis, com cerca de 20 árvores de 10 metros de altura, perfeitamente iguais. Eram plantas clonadas de uma mesma matriz. Agora sim, poderemos utilizar os híbridos espontâneos que aparecem nos nossos plantios estabelecidos com sementes de Rio Claro! De volta ao Brasil, imediatamente construímos uma pequena casa de vegetação com nebulização intermitente e passamos a selecionar as plantas híbridas (naturais) e a iniciar sua propagação vegetativa por enraizamento de estacas, dominando esta tecnologia.

Instalamos as pesquisas de espécies e procedências com as sementes trazidas da Austrália e Timor, e ficamos aguardando durante 4 anos pelos resultados preliminares, para decisão sobre as melhores procedências e a realização de colheitas de sementes. Realizamos mais 4 viagens a Austrália para coleta de sementes. Posteriormente, foram instalados testes de progênies e montados pomares, inclusive um pomar para produção do híbrido E. grandis x E. urophylla, que passou a ser conhecido como E. urograndis.

Um programa de melhoramento genético como este demora de 20 a 25 anos, enquanto que um programa de propagação clonal por enraizamento de estacas é quase que instantâneo, especialmente hoje, pois todo o sistema está muito desenvolvido e com variações tecnológicas. Montamos um laboratório na empresa para as análises de densidade básica da madeira e de rendimento de celulose. Outras características das madeiras das matrizes aprovadas foram analisadas nos laboratórios da fábrica.

Na 1ª fase, selecionamos 6.000 plantas candidatas à matriz, considerando: volume, forma, galhos, % de casca, rebrotamento, enraizamento, etc.  Em 31 de outubro de 1978, dia de inauguração da 1ª fábrica em Barra do Riacho, já tínhamos plantado 3 milhões de mudas clonadas. O IMA da floresta seminal (sementes de Rio Claro) foi de 25 m³ sólidos e passou para 45 m³ sólidos com os plantios clonais de matrizes superiores.

A produtividade de celulose passou de 5,6 t/ha/ano, para 12,0 t/ha/ano. Outro ponto fortemente positivo foi a melhoria do desempenho e da produtividade da fábrica com os mesmos equipamentos, devido à melhoria da qualidade da madeira. Do Hawaii trouxemos um novo modelo de recipiente para produção de mudas, que aqui ficou conhecido como tubete para mudas, bem como toda a tecnologia para a sua utilização. Criamos então um sistema para produção de mudas clonais em larga escala.

Estas tecnologias foram, aos poucos, sendo adotadas por outras empresas no Brasil e no exterior. Graças a estes desenvolvimentos e à visão dos dirigentes da nossa empresa, que investiram em pesquisa e tecnologia, a nossa equipe recebeu, em 1984, o Prêmio Marcus Wallenberg, em Falun, Suécia, entregue pelo Rei Gustavo. Este prêmio reconhece, encoraja e estimula os significantes alcances científicos que contribuem para o desenvolvimento da Indústria Florestal. E assim o Brasil tornou-se líder mundial na produção de celulose de fibra curta, de Eucalyptus.