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César Augusto Valencise Bonine

Gerente Executivo de P&D da Suzano

Op-CP-60

O outro lado da inovação florestal
Assisti, recentemente, a uma palestra do Chris Trimble, renomado professor na Tuck School of Business (Hanover, New Hampshire, USA), fazendo uma analogia entre escalar uma montanha e a inovação. Ele fala um pouco sobre seu livro, escrito em colaboração com Vijay Govindarajan, O outro lado da inovação, e, apesar de a palestra não ser nova, o conteúdo não poderia ser mais atual.
 
Ele comenta que os alpinistas se preparam e se preocupam com a subida da montanha, mas muitos se esquecem de que a chegada ao topo é apenas a metade da jornada, tem ainda toda a descida. Aliás, alguns dizem que, nas escaladas mais perigosas, como o Everest, o K2 ou a temida Annapurna, no Nepal, um número elevado de acidentes fatais ocorre justamente na descida.

Assim acontece também com a maior parte das inovações! Tão difícil quanto chegar ao produto ou processo inovador é escalá-lo no mercado ou implementá-lo nas rotinas das empresas. Em outras palavras, inovar com êxito tem como fator crítico de sucesso sua implementação. Mas isso não deve ser surpresa para ninguém.

Normalmente, pessoas ou organizações não são muito abertas a mudanças. Preferem ficar na zona segura do status quo. Existe a máxima de que ”em time que está ganhando não se mexe”, e esse pode ser um dos problemas que dificultam a implementação de novas tecnologias. As razões para isso são inúmeras: medo do desconhecido, insegurança, falta de boas informações, entre outras.

Sabemos que é necessário inovar (mais ou menos como o ”navegar é preciso”, do Fernando Pessoa), mas estar aberto à inovação depende do comprometimento das pessoas e das organizações. Nas commodities, por exemplo, mudar um processo é caro, e, por vezes, os clientes não pagam esse custo de inovar.

É o conceito do outro lado da inovação colocado em prática. Contudo não resta dúvida de que esse momento único que estamos vivendo, seja no número de pessoas infectadas pelo SARS CoV-2, do número de pessoas que estão ou ficaram isoladas ou dos negócios que estão ou foram impactados, tudo isso trará mudanças radicais e difíceis de prever. 
 
O padrão de higiene e de consumo mudaram e não devem voltar ao estágio anterior, as formas de comunicação mudaram, do ensino até de relacionamento entre as pessoas. A moda agora é falar do novo normal. Outro ponto que não podemos deixar de abordar na realidade pós-Covid está ligado à tecnologia no novo ambiente de trabalho.

Aqui, me refiro especificamente à forte tendência de home office, frente aos modelos convencionais de espaços de escritório. Algumas coisas são irreversíveis e, talvez, essa seja uma para a qual precisamos nos preparar. Constatamos que somos tão ou mais produtivos trabalhando em casa do que nos escritórios.

Reuniões têm funcionado com qualidade, pontualidade e objetividade. Os riscos dos deslocamentos e o ganho em qualidade de vida são sentidos por todos. Os custos de manutenção dos espaços corporativos podem ser significativamente reduzidos. Ou seja, dá para listar uma série de benefícios.

Resta apenas entender como seremos eficientes e produtivos também nos relacionamentos profissionais, nas interações das pessoas e áreas, tão necessárias para que a inovação consiga fluir. É um desafio para o qual ainda não temos resposta. Mas voltando ao Chris Trimble, ele reforça que “é a partir da verdadeira inovação que resolvemos o ‘insolucionável’, mudamos vidas e suspendemos (no sentido de colocar para cima) economias”.

Ou seja, estamos vivendo também o melhor e mais apropriado momento de ”descer a montanha da inovação” com segurança. Quando pessoas e organizações estão ameaçadas, como agora, ficam muito mais abertas a aceitarem mudanças. Afinal, muitas vezes não existe alternativa, é mudar ou morrer.

Podemos fazer isso de diferentes formas: revisitando tecnologias que não conseguiram ser colocadas em prática, criando ideias e lançando desafios, usando as chamadas metodologias ágeis (como Scrum, Kanban ou Smart), ou propondo novas soluções, antecipando tendências. 
 
O certo é que não podemos ficar parados. Em muitas organizações, momentos de crise são particularmente tóxicos para o processo de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D). Uma das primeiras áreas que sofrem corte de recursos, de programas e de projetos é justamente a P&D. Talvez algumas empresas brasileiras sigam o exemplo, mesmo que inconscientes, da realidade da inovação pública no Brasil, onde cortes e contingenciamento de verbas para inovação são frequentes e irrecuperáveis.

Um exemplo é o orçamento dos últimos 3 anos do CNPq e do FNDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), que é o menor desde o ano 2000. Ou seja, o sentido de prioridade para a ciência e tecnologia como política pública, que já teve um passado promissor, está jogado no esgoto a céu aberto. Muitos dizem que a inovação tem que ser feita com recursos privados, a exemplo de países desenvolvidos, mas é difícil encontrar um exemplo de nação que se desenvolveu em Ciência, Tecnologia e Inovação sem o incentivo pesado do Governo. Afinal, é ele que tem que estabelecer as prioridades e fomentar pesquisa pública de qualidade, especialmente em ciência básica, mas também no desenvolvimento de novas tecnologias.

E sabemos que o desenvolvimento florestal precisa fazer parte da agenda de prioridade estratégica da política pública nacional. Inovação séria não sai do famoso ”Eureka”! Precisa tempo, investimento, dedicação e colaboração. Na Suzano, entendemos a importância e a seriedade de investir, de forma sólida e constante, em P&D.

Isso vem dos acionistas, passa pela liderança e permeia toda a organização. Além disso, não conheço nenhum exemplo de sucesso em inovação que não tenha ocorrido com uma forte integração entre P&D, Operação e a Área de Negócio, para citar apenas uma parte da organização.

Cada um deve sentir na pele as dores do outro, mas não ficar limitado ao lamento, e arregaçar as mangas, afinal, inovar não é papel exclusivo de uma área. Temos exemplos aqui, na Suzano, de incríveis inovações que nem passaram pela P&D. Várias tecnologias, algumas patenteadas, fruto da inovação que nasceu, cresceu e amadureceu nas Operações, seja florestal, industrial, comercial ou logística.

or fim, estamos escalando uma das montanhas mais desafiadoras das nossas vidas e da vida das nossas organizações. Não dá para subir usando os martelos, os grampos e as cordas do passado. Precisamos inovar, criar espaço e deixar a criatividade agir, ter humildade para ouvir sugestões de nossas colaborações com universidades, institutos de pesquisa e de um mundo de startups que está à nossa disposição.

Vamos chegar ao topo da montanha com toda a certeza! Será um grande momento de comemoração. E precisamos comemorar, pois faz parte do sucesso da inovação. Mas, como bem sabemos, tem um outro lado da inovação marcado pelos desafios da implementação.

Precisamos unir forças. P&D e Operação caminhando juntos. Um ajudando o outro, tanto na subida, quanto na descida da montanha. A incerteza faz parte da jornada da inovação, mas os riscos são sensivelmente mitigados quando trabalhamos de forma integrada. Uma boa escalada – e uma descida segura – a todos!