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André Trigueiro

Jornalista Especialista em Gestão Ambiental

Op-CP-16

Meio ambiente na Idade Mídia

A expressão “meio ambiente” reúne dois substantivos redundantes: meio (do latim, mediu) significa tudo aquilo que nos cerca, um espaço onde nós também estamos inseridos; e ambiente, palavra composta de dois vocábulos latinos: a preposição amb(o) (ao redor, à volta) e o verbo ire (ir). Ambiente, portanto, seria tudo o que vai à volta. Mas dizer que meio ambiente é tudo seria simplificar demais a questão.

“É um conjunto de fatores naturais, sociais e culturais que envolvem um indivíduo e com os quais ele interage, influenciando e sendo influenciado por eles”, informa o Dicionário Brasileiro de Ciências Ambientais. Seja qual for a definição formal que se busque, importa admitir que estamos longe da compreensão mais profunda do que realmente significa.

No mundo moderno, onde o conhecimento encontra-se fragmentado, compartimentado em áreas que muitas vezes não se comunicam, a discussão ambiental resgata o sentido holístico, o caráter multidisciplinar que permeia todas as áreas do conhecimento, e nos induz a uma leitura da realidade, onde tudo está conectado, interligado, relacionado.

Importa reconhecer que esse sentido mais abrangente e plural é absolutamente revolucionário e ameaçador. Quando nos entendemos como parte do meio ambiente, desmontamos o eixo sobre o qual se estrutura boa parte do conhecimento construído. Algumas tradições religiosas, por exemplo, exaltam a figura do homem na mesma proporção em que desprezam os demais seres vivos, como se fosse possível para nós existirmos sem a maravilhosa e complexa teia da vida, que nos cerca.

Sem as microscópicas bactérias a vida na Terra não seria possível. E isso nos inclui, dependentes que somos desses pequeninos seres. Nas escolas e universidades, a compartimentação das disciplinas – e a frenética busca pelas especializações – aguça a nossa percepção para as partes, em detrimento de um olhar mais abrangente, onde a realidade possa ser entendida no seu aspecto mais interdisciplinar.

Consagramos precioso tempo e energia no entendimento do ponto, ignorando o que vai ao redor dele, ou como ele se resolve dentro do contexto.
O analfabetismo ambiental grassa nos meios político e econômico, onde o modelo de desenvolvimento vigente – descrito no relatório final da Rio-92 como “ecologicamente predatório, socialmente perverso e politicamente injusto” – não contempla a capacidade de suporte do planeta, já exaurido na busca insustentável de matéria-prima e energia.

Gestores públicos e privados que privilegiam a maximização dos lucros no menor intervalo de tempo possível agravam o risco de um gigantesco colapso, um Apagão da Vida, por não enxergarem sistemicamente. Ser sustentável, ou ambientalmente responsável, significa respeitar os limites. Mais importante do que cuidar do planeta para que nossos filhos e netos tenham o necessário, é cuidar de nossos filhos e netos para que o planeta possa oferecer o necessário. A educação para a sustentabilidade é a forma mais simples e eficiente de alcançarmos um novo modelo de civilização, menos consumista e mais ética.

O mundo caminha nessa direção, a mudança é sensorial e mensurável, uma nova cultura emerge no bojo de uma crise ambiental sem precedentes na história. A grande pergunta, ainda sem resposta, é a seguinte: haverá tempo?  Tão preocupante quanto o risco de um colapso, é a capacidade de governantes e empresários se apropriarem da retórica ambientalista – e apenas do discurso – para sobreviverem num mundo suscetível aos apelos do marketing verde.

Num mundo globalizado, onde a transparência das instituições é entendida como uma conquista civilizatória, o descolamento entre o discurso e a ação pode custar caro a quem opta pela mentira. Não é mais possível nos entendermos como espécie sem percebermos a urgência de uma nova relação com o mundo que nos cerca. Não basta ser ecoeficiente, promovendo a gestão mais equilibrada dos recursos nos setores público e privado: é preciso reconfigurar os valores prevalentes da sociedade.

A cultura do descartável, do desperdício, do apreço desmedido ao materialismo desencadeia ondas de desequilíbrio ambiental e ético, que tornam inertes eventuais esforços em favor da sustentabilidade.
Há muito trabalho pela frente. Não há luta mais importante e urgente do que aquela em defesa da vida. E não há vida possível onde o meio ambiente não seja entendido como parte de nós. O meio ambiente começa no meio da gente. Quanto mais tempo levarmos para compreender isso, mais difícil será.