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Marcílio Caron Neto

Conselheiro Titular do Conama - Conselho Nacional do Meio Ambiente

Op-CP-18

As razões, os porquês e suas bases

O enorme impulso de desenvolvimento na atividade de reflorestamento ocorreu a partir de 1966 com a lei nº 5.106, que criou os incentivos fiscais, cujos recursos eram direcionados para formação de maciços florestais, através dos reflorestamentos com o gênero Eucalyptus, que predomina nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo e Bahia, e o gênero Pinus, nos estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Os incentivos permaneceram ativos até dezembro de 1987, quando os segmentos verticalizados como o de celulose e papel, o siderúrgico e o de desdobramento da madeira prosseguiram implantando ou reformando seus respectivos projetos de reflorestamento.
O governo, ao estabelecer os incentivos fiscais para o setor florestal, deixou implícito na sua política de desenvolvimento que as florestas deveriam ocupar as áreas periféricas de relevo ondulado, para não haver concorrência na compra de terras planas usadas para a produção de grãos e carne.

Portanto, a grande maioria das florestas plantadas nos estados de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul foram implantadas em terrenos de perfil ondulado. Os projetos de reflorestamento passavam por processo de análise e comprovação de viabilidade econômica - naquela época pelo IBDF, atualmente Ibama -, para acessarem os recursos disponíveis, respaldados pelos incentivos fiscais.

No check list, eram observadas as Áreas de Preservação Permanente - APPs, principalmente a vegetação nativa protetora das margens dos cursos d’água e de nascentes. No momento de se executar o manejo florestal, através dos desbastes, quando se tratava de povoamento de pínus e do corte raso quando se tratava do eucalipto, necessária se fazia a aprovação do Plano de Corte pelo IBDF (Ibama) e a autorização para o transporte dos toros.

Como podemos observar, a atividade de silvicultura é monitorada pelos órgãos ambientais, desde os tempos em que o segmento vivia seu grande impulso de desenvolvimento, exigindo o cumprimento da legislação vigente, quando ainda eram implantados empreendimentos florestais como oportunidade de investimentos, oferecidos pela Bolsa de Valores. No Brasil, a legislação florestal estruturou-se somente no século XX, ao contrário de outros países. O primeiro código foi promulgado em 1934, e o segundo, vigente até hoje, em 1965.

O cultivo de florestas de produção, por ser uma atividade baseada nos princípios agronômicos, está inserido nos preceitos contidos no Código Florestal – lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, normativa ambiental que deve ser cumprida integralmente por toda atividade que tem como base o solo e a água, principalmente no que diz respeito às Áreas de Preservação Permanente - APPs, (artigo 2º e alíneas, 3º e alíneas, artigo 18º e os respectivos parágrafos), Reserva Legal - RL (artigo 16 , artigo 44, artigo 44-A e artigo 44-B, respectivamente com todos seus acessórios) e também o artigo 20, que cria a obrigatoriedade das empresas industriais que consumirem
matéria-prima florestal de manter, dentro de um raio em que a exploração e o transporte sejam julgados econômicos, florestas plantadas para abastecerem o complexo industrial existente.

Pelo não cumprimento na íntegra dos dispositivos relacionados, o produtor florestal estará sujeito às sanções penais e administrativas da lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Recentemente, a lei dos crimes ambientais foi adequada pelo decreto nº 6.514/2008, atualizado pelo decreto nº 6.686/2008, que suscitou grande agitação no Congresso Nacional e no governo, motivada pelos proprietários rurais, principalmente pelas sansões administrativas e penais que tratam sobre a averbação da Reserva Legal à margem da matrícula do imóvel.

Nesse aspecto, o setor de silvicultura encontra-se no nível ambientalmente correto. Então, vejamos, atualmente, o país possui 6,12 milhões de hectares plantados com floresta de produção; em contrapartida, possui, aproximadamente, 4,5 milhões de hectares de terra coberta com vegetação nativa, pertinentes a APPs, RLs e outras áreas conservadas pelo efeito das leis ambientais vigentes.

Essas áreas são um valioso ativo ambiental. Mas, essa situação não se repete para os segmentos da agropecuária, onde as áreas de reserva florestal legal estão ocupadas com o cultivo de cana-de-açúcar, milho, soja, etc., bem como o preenchimento com cabeças de gado em grandes áreas de pastagem, onde os tributos ambientais não foram respeitados.

Com a promulgação dos decretos nº 6.514 e 6.686, preveem-se multas diárias de R$ 50,00 a R$ 500,00 por hectare ou fração da área para aqueles proprietários rurais que deixarem de averbar a Reserva Legal e que terão prazo para regularização até 11 de dezembro de 2009. Caso não se constate a real existência do percentual de área de Reserva Legal de conformidade com o que preveem os incisos I, II, III e IV, do artigo 16º da lei nº 4.771/65, recairá sobre o proprietário de imóvel rural multa de R$ 5.000,00 por hectare ou fração.

Essa situação provocou um verdadeiro frisson no meio rural brasileiro, refletindo imediatamente nos representantes do agronegócio no Congresso Nacional, que reagiram imediatamente, frente às pressões exercidas pela base política de interesse. No mesmo instante, foram produzidos vários projetos de lei com a finalidade de neutralizar o ato ilícito, que é a figura da Reserva Legal e a obrigatoriedade de averbá-la à margem da matrícula do imóvel.

Com esse motivo, foi apresentado o novo Código Ambiental Brasileiro, que suprime do seu texto as figuras da Área de Preservação Permanente e a área de Reserva Legal e passa à competência comum, para que os estados legislem sobre questões ambientais inerentes a seu espaço territorial.
Junto a esse código, foram apresentados outros cinco projetos que tratam da agricultura familiar na pequena propriedade rural, com a finalidade de acomodar a ocupação das áreas de APPs e RL do topo de morro e nas encostas.

O que na realidade os parlamentares que representam a agricultura familiar desejam é blindar as atividades de agropecuária da pequena propriedade do rigor da lei vigente alcançada pela lei dos crimes ambientais. Pelo mecanismo de tramitação dos projetos de lei no Congresso Nacional, proposições que versam sobre o mesmo assunto são apensadas ao projeto mais antigo; nesse caso, estão apensados nove outros projetos que tratam de assuntos correlatos, inseridos na pauta de discussões de uma comissão especial, que deverá apresentar um substitutivo, relacionando todos os méritos considerados em cada projeto de lei.

O setor de silvicultura desfruta do reconhecimento do poder público e da sociedade civil de ser uma atividade ambientalmente correta, isso diante de algumas iniciativas responsáveis, como a ISO 14.000 e a certificação da floresta. Principalmente os empreendimentos florestais, que servem de estoque de matéria-prima, para uso da indústria verticalizada, cujos critérios exigem que os povoamentos florestais sejam ambientalmente sustentáveis.

Para isso, as propriedades que servem de base para os reflorestamentos devem ter identificadas e constatadas suas APPs e as RLs, essas devidamente averbadas.
Entretanto, nos povoamentos implantados no seu primeiro ciclo nos idos dos anos 1970, que são reformados a cada ciclo da floresta, ainda persistem APPs ocupadas com floresta plantada, devido à modificações do Código Florestal através da lei nº 7.511/86, que alterou a faixa de proteção da mata ciliar de 5 para 30 metros para rios de menos de 10 metros de largura e assim sucessivamente para as demais larguras dos cursos d’água.

A grande maioria dessas áreas se encontra em processo de recuperação, com a retirada da floresta plantada, e a restauração da faixa desocupada, através da indução de remanescentes encontrados nos fragmentos com cobertura vegetal nativa.
Consequência do tipo de ocupação dos empreendimentos florestais em áreas de relevo ondulado, o setor de silvicultura tem, aproximadamente, 600 mil hectares inseridos dentro de APP de morro, definido pela norma infralegal, através da Resolução Conama nº 303/2002, com possibilidade reduzida de encontrar outra opção locacional, de restabelecer essas áreas, devido à legislação ambiental vigente.

Por esses motivos é que o setor de silvicultura tem dialogado com o MMA, com o MAPA e com a Casa Civil, no sentido de apresentar projeto de lei que permita estabelecer o reconhecimento para ocupação de topo de morros, pela constatação científica de entidades de pesquisa, que constataram que o topo de morro não tem função ambiental importante, e sim as encostas, dependendo da sua inclinação, da textura e da profundidade do solo que revestem essa figura geológica. Essa premissa tem consenso no meio ambiental, para as APPs e RLs ocupadas de forma consolidada, não permitindo abertura para novos usos de solo.