Me chame no WhatsApp Agora!

Luiz Cláudio Costa

Professor de Agrometeorologia da Universidade Federal de Viçosa

Op-CP-11

Mudanças climáticas, energia, alimento, ciência e humanidade

A capacidade humana de superar desafios é fascinante. Desde a Segunda Guerra Mundial, a população mundial aumentou cerca de três vezes. No Brasil, o aumento foi ainda maior, a população quadruplicou-se no mesmo período. Além do aumento populacional, a modificação do hábito alimentar fez com o aumento do consumo de calorias aumentasse cerca de 25%, nos últimos 60 anos.

Resultado direto de tais aumentos foi a necessidade do crescimento da produção de alimentos, o que se deu pela expansão da área agrícola e pelo aumento da produtividade. Da mesma forma, o período pós-Segunda Guerra também se caracterizou por um acentuado aumento do consumo global de energia, para atender às múltiplas demandas da sociedade.

Registrou-se, no período, um aumento da demanda de energia de 28 GJ, para 68 GJ, sendo que o ano de 2004 apresentou a maior taxa de crescimento de energia já registrada na história da civilização, 3,6%. De uma forma ou de outra, tais desafios foram vencidos. A explosão observada na demanda de energia e de alimento foi atendida, graças aos avanços científicos e tecnológicos do último século.

Infelizmente, não se pode dizer o mesmo da distribuição de tais recursos, que nada tem a ver com a nossa capacidade científica e tecnológica, mas com o nosso conceito e modelo de humanidade. Mas, os desafios renovam-se e agravam-se: as projeções realizadas por diversos organismos internacionais indicam uma necessidade de crescimento da produção de alimentos em cerca de 30% até 2030, ou seja, em torno de 1,4% ao ano.

Da mesma forma, projeta-se que a oferta de energia precisará crescer 50% no mesmo período, para atender às demandas de crescimento dos países desenvolvidos e em desenvolvimento. No entanto, considerando a maior ameaça já enfrentada pela humanidade, conforme relatório do IPCC - Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, 2007, as mudanças climáticas, causadas pela ação do homem, tal crescimento, de produção de alimentos e de oferta de energia, não pode ser feito com o mesmo modelo do passado.

É preciso considerar o uso eficiente dos recursos naturais, como o solo e a água, bem como reduzir a emissão de gases de efeito estufa. O recente relatório apresentado pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, indica que dentre os diversos fatores que afetam as atividades agrícolas e florestais, as mudanças climáticas passam a ser motivo de grande preocupação para o setor.

De acordo com os modelos considerados pelo IPCC, a temperatura deve aumentar nos próximos 100 anos, considerando o ano de 1990 como referência, dependendo da emissão de Gases de Efeito Estufa, entre 1,4 ºC a 5,8 ºC. Estudos do IPCC indicam, ainda, um aumento da freqüência de ocorrência e intensidade de fenômenos climáticos extremos, tais como secas, veranicos e ondas de calor.

A vida na atmosfera terrestre, que sempre representou um colossal desafio para as plantas agrava-se com as mudanças climáticas. Ao mesmo tempo em que o aumento da concentração de dióxido de carbono na atmosfera tem o potencial de aumentar a produtividade das culturas, as altas temperaturas aumentam a demanda hídrica, podendo levar a uma acentuada redução de produtividade, potencializando o conflito entre a necessidade de conservação de água e a necessidade de assimilação de CO2.

Antes da revolução industrial, havia um equilíbrio de emissão e absorção dos gases do efeito estufa na Terra, isto é, o fluxo de entrada destes gases para a atmosfera era igual ao de saída (biossíntese), estabilizando a temperatura do planeta. Estima-se que em 1850 a quantidade de CO2 na atmosfera era de 270 ppm. Hoje, essa quantidade é de, aproximadamente, 360 ppm, um aumento de 33%.

A utilização de combustíveis fósseis (carvão, óleo e gás natural) e a prática do desmatamento realizados, em função da crescente demanda de energia no mundo, levaram este ciclo a um desequilíbrio. Diante de tal quadro, eis que surge um novo dilema: se existe uma demanda crescente de alimento e de energia, principalmente de energia limpa, a qual devemos atender?

Como deve ser o uso da terra? Devemos produzir energia ou alimento? A corrida pela produção da cana-de-açúcar e florestas plantadas para produzir energia limpa pode causar riscos à biodiversidade e à segurança alimentar? Por mais que queiram alguns apressados de um lado ou de outro, não existe resposta simples para tal questão.

Pode ser um desastre, mas pode ser uma grande oportunidade. A verdadeira resposta vai estar no detalhe que, com certeza, pela tradição e criatividade brasileira, pode ser realizado com grande chance de êxito. Com pesquisa, política governamental e investimento do setor público e privado, podemos diversificar a agricultura, promover investimentos para o setor agrícola, integrar a produção de bioenergia e a produção de alimento, e resolver, esse sim, o maior dilema ético da humanidade, a fome e a miséria, que afetam, hoje, 2,4 bilhões de pessoas no mundo e 1,6 bilhão que não têm acesso a eletricidade.

Esse é o grande desafio, crescer com sustentabilidade. Aliás, existe uma piada recorrente no meio científico, que diz que sustentabilidade é igual a amor, todos nós sabemos mais ou menos o que é, mas ninguém é capaz de definir. Agora, sem dúvidas, é hora de escalarmos as montanhas da sabedoria, com competência científica, política, humana e ambiental e aprendermos, definitivamente, a definição dos dois, afinal, os detalhes podem ser mais bem vistos do alto.