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Carlos Antonio da Silva Jr e Mendelson Lima

Professores de Geoprocessamento e de Zoologia da Universidade do Estado de Mato Grosso – UNEMAT, respectivamente

Op-CP-56

Um verdadeiro big brother
Sensoriamento remoto como principal ferramenta para o monitoramento sinóptico do uso e alteração do solo teve seu início marcado por sensores aerotransportados durante a Primeira e a Segunda Guerra Mundial no mapeamento e vigilância militar. Atualmente, com o avanço tecnológico, sensores que mensuram a radiação eletromagnética são desenvolvidos com uma ampla variedade de resoluções espaço-temporais, espectrais e radiométricas e, aliados a isso, diversos algoritmos são construídos a fim de separar os alvos que são monitorados em tempo quase real.
 
Com o avanço dessa geotecnologia, principalmente após a era dos satélites meteorológicos (Geoestacionários), Landsat e Sistema de Observação da Terra – EOS (Heliosíncronos), o homem pôde, então, monitorar com maior precisão a localização e a quantificação das mudanças da paisagem, tendo como perspectiva melhorar a gestão dos territórios a partir de então. Além disso, pela capacidade de obter informações em larga escala, tal ferramenta também traz consigo o poder de verificar se as leis vigentes em um determinado território estão sendo cumpridas, pois a quantificação das áreas é praticamente instantânea, já que conta com menores elementos da imagem, agora digital (pixels).
 
Neste momento em que a sociedade moderna está discutindo os efeitos de um possível aquecimento do planeta, essas ferramentas são extremamente úteis no monitoramento dessas mudanças na paisagem. O Brasil é detentor da maior porção de floresta tropical em seu território e, ao mesmo tempo, de uma das maiores taxas mundiais de conversão de uso do solo. Para monitorar essas mudanças de uso a partir de séries-temporais em imagens digitais de média resolução espacial, os pesquisadores contam com o auxílio de vários órgãos, como o Sistema de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal do PRODES (INPE), o ImazonGeo (Imazon) e o Global Forest Change (University of Maryland). 
 
O PRODES, com a utilização de sensores orbitais, monitora não somente a Amazônia, mas também todo o território do cerrado brasileiro (entre 2013 a 2015, foi constatada uma perda de 18,9 mil km2 de sua vegetação nativa e, no ano de 2018, constatou-se perda de 6,6 mil km2). Outro programa de enorme contribuição é o ImazonGeo, que quantifica e monitora o desmatamento, a degradação florestal e a exploração madeireira na Amazônia Legal via sensoriamento remoto. E o projeto Global Forest Change busca fornecer acesso aos dados de mudanças florestais em todo o planeta por meio de dados orbitais, analisando tendências e mudanças nas florestas e pontos críticos específicos.
 
A quantificação do que se perde de florestas e o que passou a ocupar aquele espaço deixaram de ser uma indagação de ambientalistas preocupados com a biodiversidade e o clima e passaram a ser também uma necessidade de negócios. Muitos consumidores não desejam adquirir um produto que foi produzido à custa de florestas tropicais. O Greenpeace, por exemplo, realizou uma grande campanha mundial junto a grandes redes varejistas alegando que a soja que alimentava os animais consumidos nessas redes nos Estados Unidos e na Europa era causadora de desflorestamentos na região Amazônica. O resultado foi a criação da Moratória da Soja, em 2006, em que os maiores exportadores de soja brasileiros se comprometeram a não adquirir soja produzida em áreas desflorestadas após essa data.
 
 
Para verificar se uma área de floresta foi substituída pela cultura da soja, são necessárias duas ações. A primeira, obviamente, é a verificação da remoção da floresta, que pode ser observada com dados de sensores multiespectrais e aritmética entres bandas. A segunda ação é verificar se, de fato, aquela área foi substituída pela soja, que pode ser feita de várias maneiras. Podemos verificar in loco ou fazer sobrevoos de avião, ambos métodos caros frente às grandes extensões da fronteira agrícola no sul da Amazônia. Entretanto pode-se recorrer novamente ao sensoriamento remoto, que, via série-de-tempo, com base em calendários agrícolas, busca-se um padrão de detecção sobre uma planta cultivada. 
 
Outra questão importante na alteração da ocupação de um território, aliada às geotecnologias, que são de extrema importância nesse monitoramento sinóptico, é a degradação ocorrida por meio de incêndios florestais. Estudos recentes apontam que a baixa resiliência ao fogo ocorre em áreas de várzea devido ao padrão da distribuição da área florestada, em que o maior espaçamento entre áreas densas de floresta proporciona perda de água, e a propensão ao fogo aumenta. Dados de sensoriamento remoto confirmam que, na Amazônia por exemplo, os incêndios de planícies inundadas apresentam maior impacto na estrutura das florestas. Além disso, recente descoberta com a utilização de dados orbitais mostrou que, na maior parte da floresta amazônica, o aumento da insolação é determinante para o crescimento das folhas.
 
A progressão no desenvolvimento de sensores remotos, principalmente os que orbitam a Terra, é crescente, contribuindo para o conhecimento aprofundado sobre as florestas e possíveis consequências com sua supressão. Destacamos a continuidade do monitoramento por meio do lançamento previsto de plataformas como Landsat-9 e CBERS-4A, somando-se à resolução melhorada do sensor MSI/Sentinel-2, que já realiza imageamento global com 10 metros de resolução espacial (incluindo bandas espectrais específicas como Red-Edge, NIR e SWIR).

E também dados para a compreensão da dimensão das florestas podem ser obtidos com lasers da missão GEDI (Global Ecosystem Dynamics Investigation), em que as medições resultantes revelarão a estrutura vertical de florestas. Dados também continuados do Orbiting Carbon Observatory 3 (OCO-3) fornecerão medidas quase globais de dióxido de carbono na terra e no mar. Outro exemplo na detecção de variáveis que influenciam as alterações do clima devido à perda de florestas tropicais é o sensor TROPOMI, instalado no satélite europeu Sentinel-5P, que coletará os dados sobre os diferentes gases presentes na atmosfera, entre eles o dióxido de nitrogênio, o ozônio, o monóxido de carbono, o metano, o formaldeído, o dióxido de enxofre e os aerossóis.
 
Mais do que oferecer a possibilidade de identificar e punir os responsáveis por um desmatamento ilegal ou a simples quantificação do que se perde de florestas anualmente, esse conjunto de tecnologias permitirá entender como a floresta nativa funciona e sua importância para o clima do País. Projeções pessimistas alertam que, após um determinado percentual de perda de sua cobertura vegetal, a Amazônia sofrerá um processo irreversível de savanização, com graves consequências para as chuvas no Sudeste do País, afetando a produção de alimentos e a geração de energia. Enfim, a geotecnologia já provou sua eficiência para monitorar o desflorestamento e os efeitos causados por essa prática. 
 
Cabe à sociedade cobrar que órgãos governamentais utilizem os resultados obtidos com esses recursos de alta tecnologia, para que não sirvam apenas como uma fotografia que se olha e nada se faz, mas sim para uma efetiva gestão da manutenção e conservação do meio ambiente aliados à produtividade, se preocupando não só com esta, mas com as futuras gerações.