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Sebastião Renato Valverde e Diogo Sena Baiero

Professor de Política, Gestão e Legislação Florestal e Mestrando de Ciências Florestais da UF-Viçosa, respectivamente

Op-CP-48

Produção florestal em nível de produtor
A atividade florestal no Brasil possui fortes características que a diferencia das demais atividades econômicas, a ponto de influenciar na organização do mercado e na gestão do projeto. Ao contrário dos projetos agropecuários que, geralmente, dependem das aptidões locais para viabilizar determinadas culturas conforme as condições edafoclimáticas, os florestais são menos exigentes quanto a essas condições, porém o é na existência de um mercado florestal próximo, consistente e, preferencialmente, de escala.
 
Além dessas características peculiares que comprometem a organização do Setor Florestal Brasileiro – SFB, há também outras, como o modo extrativista da produção florestal no tocante às nativas onde predomina a cultura da sonegação e ilegalidade e também o fato de que, praticamente, até a década de 1970, esse setor era inexpressivo. Naturalmente, isso reflete na elaboração, na análise, na execução e na gestão do projeto florestal.
 
O mercado florestal também difere do das commodities agrícolas. Tem-se, no caso florestal, um mercado concentrado devido à verticalização das indústrias que produzem desde a matéria-prima até o produto industrial, ao contrário das agroindústrias, que não possuem terras e compram seus insumos nos mercados spot ou de contratos futuros.
 
Por circunstâncias legais e conjunturais, durante as décadas de 1960 a 1980, as indústrias florestais não tiveram escolha, a não ser se verticalizar para garantir seu abastecimento de madeira. Por outro lado, essa decisão trouxe consequências graves para o produtor florestal, que fica à mercê do preço e da quantidade que a indústria definir. 
 
Com a manutenção da verticalização, a presença de conflito na comercialização é constante. Observa-se, no mercado florestal, que não há relação direta entre a valorização dos produtos florestais (celulose, painéis, móveis, carvão vegetal, dentre outros) e o reajuste no preço da madeira pago ao produtor. Para reduzir tais conflitos, as indústrias devem buscar alternativa no fortalecimento da parceria empresa-produtor via fomento, arrendamento ou contrato de garantia de compra. 
 
Muitos desses conflitos são consequências de políticas socioambientais preciosistas, que têm se mostrado cada vez mais deletérias ao mercado florestal. Seja por dificultar a otimização do uso dos fatores de produção terra, capital e mão de obra nos grandes clusters ou seja por inviabilizar a economia florestal.
 
O setor produtivo é penalizado por políticas que lhe sugam a competitividade. A indústria brasileira de celulose e papel, além de enfrentar a concorrência internacional, enfrenta o excesso de prolixidade normativa interna. Para alguns desses concorrentes, apesar de o clima ser o grande limitador à produtividade, políticas adequadas proporcionam-lhe competitividade no segmento. A efetividade destas parece estar relacionada a instrumentos legais objetivos na área socioambiental, à inovação tecnológica e à cultura da população.
 
No Brasil, por vários motivos, a adequação ao pleno desenvolvimento parece esbarrar na burocratização e na prolixidade do legislador. Depreende-se a necessidade de a legislação ser conhecida, enxuta e exequível pelos stakeholders, não apenas funcionando como instrumentos de comando e controle, mas despertando a consciência organizacional e socioambiental.
 
Outro aspecto que necessita atenção do legislador é o equilíbrio de mercado, pois reflete o cenário centralizador de fatores produtivos. Todavia, tamanha é a presença do Estado brasileiro na matéria, que compradores (demandantes) e vendedores (ofertantes) não possuem liberdade e nem mobilidade no sistema. Terra, capital e mão de obra foram limitados, exclusivamente, aos demandantes por consequência legal. Tal exigência, diga-se protecionista e equivocada, na produção de celulose, tem causado desequilíbrio produtivo.

Dessa forma, a imposição legal à estrutura verticalizada do setor é um grande empecilho desenvolvimentista, afetando o preço e as transações de compra e venda. Até o primeiro semestre de 2008, o mercado era favorável para investimentos florestais, quando, por exemplo, o preço do carvão vegetal chegou a ser registrado em R$ 890,00/t; já no semestre seguinte daquele ano, ele caiu para R$ 400,00/t. Muitos produtores investiram em culturas florestais, principalmente eucalipto e seringueira, acreditando naquele boom e, a partir de então, além de sofrerem com as incertezas do clima, estão amargando prejuízo com a baixa demanda e a queda nos preços.

É o que vive o segmento siderúrgico a carvão vegetal que, desde 2008, não consegue se reestabelecer, comprometendo a rentabilidade dos produtores florestais. Destaque para o que vem ocorrendo em Minas Gerais e no Mato Grosso do Sul, onde a maior parte dos plantios florestais visava à produção do carvão vegetal. Porém, dada a crise na siderurgia, os produtores não têm conseguido mercado para tal e se encontram desmotivados com a atividade, reduzindo o investimento em florestas e diminuindo as doses de insumos nos plantios, o que levará à redução na produtividade.

A ineficiência de políticas fundiárias voltadas ao desenvolvimento da indústria florestal é prejudicial ao seu avanço. Diante do potencial competitivo e eficiente, é de se lamentar que haja tamanho emaranhado normativo e burocrático, podendo tornar o mercado inviável. O correto incentivo necessita, porém, de precisão e de razoabilidade para ser aplicado. Estudos poderiam identificar pontos de estrangulamento na estrutura de custos do setor produtivo, para que se possam direcionar políticas, mantendo ou ampliando a capacidade produtiva e de exportação de produtos florestais do Brasil.
 
Há que se aproveitar a aprovação da lei da terceirização para praticá-la de vez, não só na relação do trabalho, mas também na produção florestal. As indústrias florestais, sobretudo a de celulose, precisam descentralizar a produção de madeira aos produtores, a quem é de direito, cabendo a elas a produção industrial. Com isso, elas deixariam de imobilizar montante significativo de capital em terras e plantios, aplicando-o na expansão industrial. Da mesma forma que as grandes indústrias do agronegócio adquirem seus insumos no mercado, por que não as florestais adquirirem? 
 
A Nestlé é uma das maiores agroindústrias do café e do leite no mundo sem ter sequer um hectare dessa lavoura e nem vaca. As indústrias florestais precisam seguir esse modelo das agroindústrias e abdicar daquele que é concentrador de terras e que tanto queima a imagem do setor florestal pelo estigma do “deserto verde”, dada a monocultura extensiva de pínus e eucalipto.