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Maria José Brito Zakia

Consultora de Meio Ambiente na VCP

Op-CP-14

Planejamento do manejo integrado da bacia hidrográfica

Por que usar a bacia hidrográfica como unidade de planejamento? E o que quer dizer integrado? Depois que convivi com profissionais da área do direito ambiental, as palavras passaram a ter um novo fascínio para mim. Desta forma, a cada palavra, acho oportuno dizer como ela é entendida neste texto. Entendo que planejamento é um processo que leva ao estabelecimento de um conjunto coordenado de ações, visando atingir determinados objetivos.

Quanto à palavra integrado, refere-se a cada uma das partes de um todo. A definição parece óbvia e facilmente compreendida, mas estão ocultas duas questões cruciais: conjunto estabelecido por quem e objetivos determinados por quem, para quem e por quê? A primeira questão importante no planejamento é estabelecer alguns limites e o primeiro destes é o territorial - o que equivale ao “todo” do conceito de integrado. Pode-se planejar um município, um bairro, uma paisagem e/ou uma bacia hidrográfica.

Se haverá várias ações, é de se esperar que haverá várias pessoas e instituições envolvidas, cada um com seus interesses, todos legítimos e com algum viés. Neste caso, é fundamental que um fio condutor una toda esta pluralidade. A água tem sido um ótimo fio condutor, pois todos a percebem como algo de fundamental importância. E a água é produzida na bacia hidrográfica, que é uma unidade territorial facilmente delimitada e que é um sistema em funcionamento.

Se é um sistema, pode ser compreendido e as ações levadas a efeito podem ser avaliadas, por meio da produção de água - quantidade e qualidade. Se planejam-se ações sobre um sistema, a execução do planejado é o manejo de um sistema, o chamado manejo sistêmico. Ou seja, o planejamento e a sua execução levam em conta todo o sistema e não as partes isoladas.

Como engenheiros florestais, estamos acostumados a fazer um planejamento sistêmico, mas com forte tendência a priorizar fatores bióticos e abióticos. Aí está o nosso viés. Com relação às atividades fundamentais que as empresas florestais devem adotar para o manejo de bacias hidrográficas, são consideradas como perfeitamente corretas as seguintes recomendações:

1. Trabalhar em microbacias;
2. Adequar desenho e densidade de estradas e carreadores;
3. Adotar o cultivo mínimo no preparo de solo;
4. Deixar restos da cultura após a colheita;
5. Não queimar;
6. Proteger os cursos d’água e das nascentes, com a vegetação natural da área;
7. Utilizar de forma adequada os defensivos agrícolas;
8. Manter mosaicos da própria plantação, ou seja, não pode haver corte raso contínuo em áreas, cujas dimensões devem variar dependendo dos locais;
9. Planejar, dentro do empreendimento, a existência de uma cobertura florestal nativa de, pelo menos, 30% da área da propriedade, incluindo nesse percentual as Áreas de Preservação Permanente - APPs e Reservas Legais - RL, em nascentes e cursos d’água;
10. Considerar os aspectos estruturais ou espacial, da paisagem, em termos de: a. Complexidade do arranjo espacial dos fragmentos de habitat, considerando a distribuição de tamanho dos fragmentos ou o isolamento de fragmentos de um mesmo tipo; b. Densidade e complexidade dos corredores de habitat, que dependem, entre outros, da freqüência e do tipo de interações na rede de corredores ou do tamanho da malha formada por esta rede, e c. Permeabilidade da matriz; e
11. Monitoramento permanente.

No entanto, um empreendimento florestal não é suficiente para garantir o manejo de uma bacia hidrográfica, pois existem outros proprietários, outros empreendimentos, existem muitos outros usuários deste sistema. Portanto, o planejamento de bacias hidrográficas exige (ressalto ser esta uma exigência e não uma opção) diálogos e arranjos institucionais, que busquem a construção de objetivos comuns e a execução de várias atividades.

Gosto de chamar à atenção para a questão da recomposição de matas ciliares - todos são a favor (uma rara unanimidade), mas, não acontece. Como é possível que algo que todos desejam não aconteça? O mesmo se sucede quanto à conservação de água. Aqui, entram os diálogos e arranjos institucionais - e neste caso, a delimitação do território é fundamental - para cada bacia hidrográfica, de preferência, para cada microbacia. Gostaria de retomar algo que escrevi, numa edição passada da Revista Opiniões, sobre as Políticas Públicas que pressupõem:

1. A existência de um conteúdo que oriente os recursos humanos e materiais, na busca de determinados resultados, de forma que não possa ser confundida com um ato isolado. Apresenta uma estrutura relativamente permanente e oferece referência para os atores em seus processos de tomada de decisão, e
2. Tem como um de seus postulados basilares a existência de convergência entre o conteúdo da política, os interessados - stakeholders, e os mecanismos disponíveis para sua execução.

Contrariando o senso comum, uma Política Pública não precisa ser liderada pelo Poder Público, mas é fundamental sua participação. Para nós, florestais, a “novidade” está em incluir no nosso modo de pensar as questões humanas e ter o homem como parte da estratégia de conservação de água e solo. Conservação com o homem e não apesar dele.

O diálogo e os arranjos institucionais é o que difere o manejo de bacias hidrográficas de uma Política Pública. Ou seja, a base para uma política pública eficiente pode estar nos princípios do planejamento sistêmico de uma bacia. Hoje, o planejamento de bacias tem se distanciado de Políticas Públicas, por não incluir o fator humano, e estas, por vezes, falham, por não terem um território bem definido. É hora de conciliar.