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Cesar Augusto Valencise Bonine e Fernando de Lellis Garcia Bertolucci

Gerente de Assuntos Regulatórios e Propriedade Intelectual e Gerente-geral de Tecnologia, respectivamente, da Fibria

Op-CP-30

A competitividade e a inovação tecnológica

A indústria de produtos florestais no Brasil é um exemplo de sucesso, reconhecido mundialmente. Ao longo das últimas décadas, conseguimos transformar vantagens comparativas, associadas principalmente à favorabilidade das nossas condições climáticas, em vantagens competitivas sólidas.

Elas foram resultado de um trabalho sério e consistente, realizado por muitos atores envolvidos com a questão florestal, como universidades, institutos de pesquisa e empresas, que souberam “sinergizar” as boas condições naturais brasileiras com um formidável desenvolvimento em pesquisa e tecnologia, suportado por uma gestão florestal focada em resultados e fortemente baseada no empreendedorismo.


Os números do setor mostram a importância da indústria de base florestal para o País. Segundo a Abraf, o produto bruto gerado pelo setor atinge US$ 24 bilhões, com a geração de US$ 3,7 bilhões em impostos. O setor gera 4,7 milhões de empregos, o que equivale a cerca de 5% da população ativa total. Adicionalmente, essa indústria contribui com 19% da balança comercial brasileira. Ou seja, não estamos falando de pouca coisa.

Todavia, como em tudo o que fazemos na vida, o sucesso de ontem não assegura um futuro brilhante. Ao contrário, os bons resultados de um país ou de um setor estimulam a entrada de novos  “jogadores” e tendem a aumentar a competição, comprimindo as margens de resultado e de lucro. Isso é exatamente o que move a economia, pois, com margens mais estreitas, os competidores têm que ser mais eficientes no uso de todos os recursos.

Assim, a sociedade como um todo tende a se aprimorar, transformando-se continuamente para melhor. E é exatamente esse o contexto atual da indústria de base florestal brasileira. As margens de outrora têm sido fortemente comprimidas nos últimos anos, principalmente em função da valorização do real frente ao dólar, muito maior do que a ocorrida nas moedas de concorrentes brasileiros.

Além disso, questões estruturais e muito peculiares ao Brasil têm resultado num aumento significativo dos nossos custos. Só para se ter uma ideia, estudos de mercado, realizados por consultorias especializadas, indicam que os custos de formação florestal são, atualmente, cerca de três vezes maiores do que os observados há 10 anos.

Para complicar ainda mais, se tomarmos um setor específico – celulose e papel –, constataremos que o nosso mercado, daqui para frente, deverá estar, predominantemente, na Ásia, com especial destaque para a China.

Diante desse cenário relativamente novo, complexo e altamente competitivo, a questão que precisa de uma resposta urgente da indústria florestal brasileira é: como manter-se competitivo diante de custos crescentes, margens comprimidas e da necessidade de alcançar sucesso, principalmente no mercado asiático, tão distante geográfica e culturalmente do Brasil?

Em nossa opinião, a resposta passa por três pilares fundamentais: escala de produção, atuação global com eficiência logística e inovação tecnológica. Isso requer uma reinvenção profunda da nossa indústria, ainda sustentada por empresas relativamente pequenas – se comparadas com os padrões mundiais – e, em muitos casos, focadas no mercado interno.

Não é à toa que, atualmente, tanto se fala em consolidação no setor, algo que parece ter se tornado imperativo e que poderá ocorrer num prazo não muito distante. Além disso, temos observado movimentos inéditos e muito interessantes, como parceria entre a Fibria e a empresa sul-coreana STX Pan Ocean, tendo como objetivo a construção de uma frota de navios para transporte da celulose da empresa brasileira.

Escala e logística são essenciais para a nossa competitividade, mas, neste artigo, focaremos a discussão sobre a inovação tecnológica, pois entendemos que ela pode, mais uma vez, representar um salto para a indústria florestal brasileira, assim como já ocorreu na clonagem e no cultivo reduzido do solo, apenas para citar alguns exemplos marcantes.

Neste caso, entendemos que o primeiro grande passo, aparentemente óbvio, mas nem sempre praticado, é fugir da armadilha do corte de investimentos em áreas estratégicas, que tendem a entregar os seus produtos mais a médio e a longo prazo.

Nos momentos de maior dificuldade, como o atual, há que se conter a “tesoura”, que costuma fazer sérios estragos em áreas como P&D. Para evitar que isso ocorra, é essencial assegurar um forte alinhamento entre as linhas de P&D e a estratégia da empresa, pois, nesses casos, fica muito mais evidente visualizar o dano que uma redução imediatista pode provocar nos produtos que demandam maior tempo para maturação.

Outro ponto fundamental é estabelecer um portfólio de projetos de P&D que reflita adequadamente as ações necessárias (não as simplesmente desejadas), para assegurar as respostas da empresa ao cenário externo e aos seus compromissos com todas as partes interessadas. Essa é uma tarefa às vezes complexa, pois exige desprendimento para interromper ou reduzir os esforços em alguns projetos, em detrimento de outros mais urgentes e/ou importantes.

Para fazer isso com sucesso, há que se cuidar muito do processo de comunicação de cenários, objetivos e prioridades, pois, muitas vezes, os pesquisadores serão obrigados a abrir mão de projetos individuais para que o time como um todo ganhe, e os resultados sejam potencializados para a instituição. Nesses momentos, a gestão do clima organizacional tem que ser vista com muita atenção, sob pena de um clima de trabalho inadequado comprometer os resultados.

No que se refere à carteira de projetos, esta deve apresentar um bom equilíbrio entre projetos ligados à excelência operacional, com entregas de curto prazo (ex.: redução no custo de formação de florestas por intermédio de revisões de manejo), com projetos ligados à sustentabilidade do empreendimento (exemplos: melhoramento genético tradicional e estudos da biodiversidade).

Adicionalmente, um portfólio bem balanceado precisa conter projetos de ruptura tecnológica, que possam trazer um diferencial competitivo sustentável no médio e no longo prazo (exemplos: novas ferramentas biotecnológicas e desenvolvimento de tecnologias ligadas ao conceito de biorrefinaria). Esse equilíbrio é crucial para continuarmos na liderança da produtividade florestal, com capacidade de absorção dos custos crescentes e elevação de margens.

Tais ações contribuirão fortemente para que o negócio florestal brasileiro se mantenha competitivo no curto, médio e longo prazos, mesmo diante do cenário descrito no início deste artigo. Somente assim seremos capazes de dar segurança às partes interessadas, com elevação da atratividade do nosso setor aos investidores.

Novos investimentos em tecnologia são essenciais, pois acreditamos firmemente que serão as rupturas tecnológicas, muitas ainda sequer descobertas, que assegurarão a sustentabilidade das empresas e do próprio planeta, tornando viável o “produzir mais com menos”. As estimativas indicam que, em 2050, poderemos ter um déficit mundial da ordem de 200 milhões de hectares, em função do crescimento populacional mundial e do aumento de demanda que isso provocará.

É responsabilidade de todos nós – envolvidos de alguma forma com o uso de recursos naturais – encontrarmos saídas para mitigar esses impactos, o que obrigatoriamente passa pelo processo de inovação tecnológica. Porém este só gerará os resultados desejados se for tratado com a prioridade necessária e se for gerenciado de forma eficaz e moderna, com a visão holística que os recursos naturais merecem.