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Erich Schaitza

Chefe-geral da Embrapa Florestas

OpCP63

Cooperação gera sinergia e dá frutos
A Embrapa é uma senhora de quase 50 anos e tem uma história muito interessante na forma de atuação ou nas suas diretrizes para atuação. Ao longo do tempo, os problemas de pesquisa mudaram e se complexaram. Nos anos 1980, os desafios de pesquisa estavam baseados em aumentar a produtividade de 8 para 10, dizíamos que a pesquisa começava e acabava no produtor. Nos anos 1990, continuávamos a nos preocupar com produtividade, mas se falava muito de aspectos ligados ao mercado e à qualidade dos produtos. 
 
Agora, começava no produtor, mas acabava no mercado. Na segunda metade dos anos 1990, veio muito forte a questão ambiental e, nos anos 2000, a questão social. Era a pesquisa do produtor para a sociedade. Também saímos da porteira e passamos a ver cadeias completas, mercados globais, novos produtos, integrações entre setores nunca dantes imaginados. Com a Covid, fomos buscar soluções baseadas em nanocelulose para filtros, para a saúde.
 
Drone para fazer serviços de gente que está em casa. E, agora, estamos na era da inovação; fala-se em tripla hélice, plataformas de inovação, geração de ativos pré-tecnológicos e tecnológicos, internet das coisas, floresta 4.0 e outros termos. Mas, independente do nosso modelo de pesquisa e de suas complexidades, a questão da cooperação, do trabalho em rede sempre estabeleceu o pano de fundo de nossos trabalhos. 
 
Olhando para trás, está claro que todos os nossos programas de pesquisa de sucesso foram baseados em um trabalho muito integrado com os beneficiários de seus resultados. Olhando para frente, não vejo outra saída, além de continuarmos procurando cooperação e sinergia nos setores governamentais e no setor produtivo.
 
Podia contar uma série de estórias sobre nossa experiência de cooperação, mas faltaria papel e ficaria chato. Então, vou falar de dois trabalhos cooperativos que espelham a sinergia de trabalharmos pesquisa e desenvolvimento em parceria com o setor privado e governo.
 
O primeiro é o caso do Funcema. Um fundo privado, criado para controlar uma praga de pínus, a vespa-da-madeira (a Sirex noctilio). Em 1988, a vespa entrou no Brasil atacando áreas no Rio Grande do Sul. Logo em seguida, começou a migrar para Santa Catarina, em direção ao Paraná. Industriais da região Sul, capitaneados pela diretoria das associações de reflorestadores da região Sul, vieram à Embrapa Florestas e disseram: “temos um problema” e nossa equipe respondeu: “vamos buscar a solução”. 
 
As pessoas-chave na criação do programa foram Telmo de Azevedo e José Lauro Quadros, da Ageflor, Marcílio Caron Neto e Carlos Mendes, da ACR, Albino Ramos e Roberto Gava, da Aprex, e Edson Tadeu Iede, Luciano Lisbão e Jarbas Shimizu, pela Embrapa.  
 
A turma da indústria florestal não sabia o que fazer. A turma da pesquisa partiu para a identificação da praga e para a busca de soluções. Juntos, buscaram apoio de australianos, que já haviam sofrido com a vespa nos anos 1950 e 1960, e de um cientista notável da Tasmânia, Robin Bedding. Agregaram as Secretarias de Estado de Agricultura, a Epagri de SC, universidades e foram para frente controlar a praga.
 
Juntos, criaram o Funcema, um programa de controle que está com 33 anos de ação e jovem como nunca. As empresas cuidam de suas florestas, monitoram as pragas, distribuem inimigos naturais. A Embrapa pesquisa métodos de controle, amostragem, produz um nematoide chamado Deladenus siricidicola, o inimigo natural da vespa, e capacita equipes de controle e monitoramento em toda a área de plantio de pínus. As secretarias de agricultura criaram barreiras quarentenárias e treinaram seu pessoal para identificar e trabalhar com a praga e assim por diante. Empresas e Embrapa financiaram e financiam o programa até hoje. E perdas milionárias são evitadas anualmente.
 
O Funcema deu tão certo que se internacionalizou. Argentina, Uruguai, Chile, África do Sul e Estados Unidos foram apoiados para criar seus programas. A Austrália, que apoiou o programa em seu início, voltou ao Brasil para buscar cepas eficazes quando a vespa voltou a atacar seus plantios. Dele, nasceram os primeiros trabalhos de sensoriamento remoto da Embrapa, com financiamento do Serviço Florestal Americano. Queriam ver como se via a vespa do céu, de aviões, em programas de mapeamento expedito. Aprenderam aqui, nas nossas florestas, junto com nossa equipe. 
 
E o Funcema expandiu seu mandato, passando a ser um fundo para controle de pragas florestais, abrigando programas de controle de formigas, pulgão e clorose. Foi canal para melhorias de manejo florestal e eixo de agregação de equipes técnicas de empresas e da Embrapa. 
 
Não fui protagonista no Funcema, mas, desde que entrei na Embrapa, em 1989, minha vida profissional se ligou a ele. Trabalhei na sua internacionalização, no programa de pulgão, em importação de insetos e em mapeamentos aéreos. Como eu, outros pesquisadores se associaram e assumiram a ponta do programa. Todos, com a certeza de que, sem cooperação e sinergia, não estaríamos onde estamos. 
 
Meu segundo exemplo é um projeto do governo do estado do Paraná, em que trabalhei por 8 anos, emprestado pela Embrapa. O Paraná Biodiversidade foi criado por técnicos das Secretarias de Planejamento, Agricultura e Meio Ambiente. Foi financiado por uma doação de 8 milhões de dólares do Fundo Mundial do Meio Ambiente (GEF) e de uma contrapartida do estado de 24 milhões de dólares, provenientes de um empréstimo feito junto ao Banco Mundial. 
 
Começou em 2002, mas, se começasse em 2022, seria um projeto inovador e necessário nessa época de mitigação de mudanças climáticas, recuperação ambiental e planejamento da paisagem. Em resumo, o projeto unia a ação de agricultores, órgãos ambientais, de fiscalização e os de agricultura num trabalho de planejamento de conservação da biodiversidade em várias escalas e a integração de atividades agrícolas a conservação da biodiversidade e da conservação a agricultura. Trabalhou numa área de 2 milhões de hectares, com produtores de diferentes situações socioeconômicas. 
 
Capacitou 200 mil pessoas. Protegeu 2500 km de margens de rios com cercas e plantou 12 milhões de mudas em 14 mil propriedades rurais. Primeiro, facilitava a adequação ambiental de proprietários, fazendo um escambo por serviços ambientais, algo do tipo “agricultor, você protege a beira do rio e eu te ajudo na melhoria do teu pasto”. Depois, financiava grupos selecionados de agricultores, todos com suas propriedades já adequadas ambientalmente, a montar negócios cooperativos de base ecológica, com uma agricultura mais limpa do que a convencional. 
 
Foram 50 grupos com 15 a 100 produtores cada, construindo negócios diferentes do tradicional. Como exemplo, produção de soja limpa, casas de mel coletivas, cooperativa para plantio de reserva legal e comercialização de carbono, produção de carne em iLPF, etc. Todos os investimentos do projeto eram feitos na base do meio a meio, metade projeto, metade agricultor. Na retaguarda das tecnologias, a Emater PR (hoje IDR) e suas parcerias com o Iapar, Embrapa e Universidades.
 
Impossível atingir os resultados do projeto sem participação privada, nesse caso representada por produtores rurais, em sua maioria com áreas de 10 a 50 hectares. Quem tiver interesse em conhecer mais as duas experiências, pode baixar o manual de controle biológico da vespa da madeira pelo link https://www.infoteca.cnptia.embrapa.br/infoteca/bitstream/doc/1034558/1/Doc.762.ed.pdf e um relatório do Paraná Biodiversidade, intitulado "Produzindo com a Natureza", em https://cupdf.com/document/parana-biodiversidade-produzindo-com-a-natureza.html