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Claudio José Reis de Carvalho

Chefe-geral da Embrapa Amazônia Oriental

Op-CP-30

Investimento em pesquisa florestal: solução para uma nova Amazônia

O próprio nome de nosso país deriva de uma espécie que foi explorada predatoriamente: o pau-brasil. Durante muitos anos, praticamente toda a nossa produção florestal foi feita com base em exploração dos recursos naturais, o que resultou em enormes reduções dos estoques de várias espécies das nossas florestas de clima temperado, mata atlântica, cerrado e, finalmente, do bioma amazônico.

Mesmo assim, historicamente, os investimentos em pesquisa florestal no Brasil têm sido inferiores àqueles feitos em agricultura e em pecuária. A destinação de investimentos para pesquisas em culturas de ciclo longo, como café, cacau e seringueira, tem sido mais consistente em função de serem culturas industriais. Porém os investimentos em pesquisas com o manejo e a exploração de impacto reduzido das florestas nativas são relativamente mais recentes.

Com exceção do eucalipto, o volume de pesquisas voltado para essências florestais nativas pelos órgãos oficiais tem sido muito abaixo do necessário para colocar o País em uma posição confortável quanto à oferta de tecnologias para o setor madeireiro, tanto em métodos mais racionais de exploração quanto de beneficiamento, o qual ainda apresenta um baixíssimo nível de rendimento, principalmente na Amazônia.

Grande parte dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento tem sido feita pela iniciativa privada, algumas vezes em parceria com instituições governamentais, como a Embrapa.

Dois exemplos que podemos citar são o estabelecimento do processo de exploração florestal de impacto reduzido e a expansão da cultura do paricá (Schizolobium parahyba var. amazonicum) no estado do Pará, impulsionada pelo desenvolvimento de uma ferramenta que permitiu laminar troncos finos dessa espécie, reduzindo, assim, o tempo de colheita.

Atualmente, essa espécie alimenta uma crescente indústria de compensados e MDF no sul do Pará.No novo Código Florestal, a delimitação de 20% da área da propriedade para atividades produtivas e 80% para a Área de Reserva Legal (ARL) e/ou Áreas de Preservação Permanente (APP) na Amazônia, e o reverso para outras áreas do País, implica a necessidade de desenvolver tecnologias para tornar possível um considerável aumento da produtividade da terra e da mão de obra.

Por outro lado, isso traz uma grande oportunidade, sobretudo para atividades florestais de espécies nativas ou exóticas, no aproveitamento de 80% da área da propriedade. A sinergia dessa mudança já está visível, sobretudo no setor florestal, que já apresenta 492.833 hectares reflorestados na Amazônia Legal, destacando-se 85.473 hectares com paricá, segundo dados da Associação Brasileira de Produtores de Florestas Plantadas (ABRAF) para 2010.

A busca por alternativas é intensa, e podemos testemunhar que as sementes de quatro pés de mogno africano (Kaya ivorensis) plantados na sede da Embrapa Amazônia Oriental (Belém-PA), em 1973, provenientes de oito sementes doadas ao Dr. Ítalo Falesi, pesquisador aposentado dessa instituição, por um componente de uma comitiva da Costa do Marfim, são altamente disputadas, e esses espécimes devem ser os progenitores dos milhares de pés de mogno africano espalhados no País.

Outras espécies exóticas que têm aumentado expressivamente a sua área cultivada na região Norte são a acácia (Racosperma mangium) e a teca (Tectona grandis).

Além dos investimentos em projetos de pesquisa e desenvolvimento nas técnicas de identificação de matrizes, coleta e beneficiamento de sementes, formação e caracterização de mudas de essências nativas destinadas à recomposição do passivo ambiental na Amazônia, há necessidade premente de pesquisas de seleção e melhoramento genético dessas mesmas espécies, utilizando ferramentas de genômica avançada, como seleção genômica ampla utilizando marcadores moleculares.

E também o desenvolvimento de protocolos eficientes de clonagem e multiplicação in vitro, visando a biofábricas para a disponibilização de material clonal de alta performance, tanto em produção de biomassa como de tolerância a pragas e doenças.

Portanto há absoluta necessidade de investimentos em pesquisas com melhoramento genético e técnicas de cultivo das espécies nativas e exóticas. Com respeito a estas, o seu sucesso no Brasil deve-se à  capacidade extraordinária de adaptação às nossas condições edafoclimáticas e, principalmente, à ausência de pragas e de doenças no nosso território.

Por isso deveria ser pensado um programa de prospecção de espécies promissoras da África e da Ásia, coleta de material genético de qualidade e sua introdução segura, após quarentena, em nosso território.

De certa maneira, estaríamos usando, de forma inversa, a mesma estratégia dos europeus com relação à seringueira e ao cacau, quando da introdução dessas espécies em suas colônias na Ásia e África, que resultou em casos de sucesso econômico justamente pela falta de doenças e de pragas que as atacavam em nosso País.

Pode-se pensar na introdução de outras espécies produtoras de madeira, como o limba (Terminalia superba), entre tantas. O grande estoque de madeira na Amazônia sempre tem levado à negligência e ao atraso na busca de soluções poupadoras no uso desse recurso natural.

O manejo florestal na Amazônia deve ser colocado, portanto, em um processo de substituição por plantios silviculturais no longo prazo, sobretudo pelas grandes empresas madeireiras. Dessa forma, apesar da ênfase dada ao manejo florestal como a solução para a extração madeireira na Amazônia, a definição de uma política de estímulo ao reflorestamento é mais do que urgente.

O reflorestamento para produção de madeiras nobres e compensados pode constituir grande opção futura, substituindo a totalidade do atual extrativismo madeireiro e de manejo florestal. O reflorestamento na Amazônia não deve ser entendido somente para a produção de madeira para atender a guseiras e ao mercado de madeira e celulose.

Ela deve abranger a produção de matérias-primas oriundas de plantas perenes para biocombustível, fruticultura, látex, recuperação de ecossistemas destruídos e como compensação ambiental. Toda política do setor primário para a Amazônia deve estar voltada para a utilização parcial de mais de 75 milhões de hectares (2011), que já foram desmatados.

Essa área é três vezes a do estado do Paraná ou mais do que a soma dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Contudo o PIB da Amazônia Legal é inferior ao do Rio Grande do Sul ou apenas 1/5 do PIB do Paraná. Isso mostra o potencial agrícola e de reengenharia ambiental que poderia ser obtido com a aplicação correta de práticas agrícolas e de atividades mais adequadas, que muitos produtores já vêm efetuando.

Essa utilização fica neutralizada se for mantida a contínua formação de novos berçários de áreas desmatadas. O complexo madeireiro na Amazônia Legal, que até o final da década de 1990 representava o terceiro produto da pauta das exportações da região Norte, decresceu bruscamente de 16,26%, em 2000, para apenas 3,16%, em 2011. Enquanto isso, o complexo minério teve um crescimento de 54,93% para 83,01% nesse período.

Há necessidade de reativar o setor madeireiro na Amazônia como gerador de renda e emprego com novo enfoque, com base no reflorestamento. A Floraplac Industrial, implantada no município de Paragominas, em 1989, com reflorestamento e produção de MDF, constitui um exemplo a ser seguido para outros estados da Amazônia Legal.

Há, contudo, grandes desafios que precisam ser vencidos pela pesquisa para apoiar o setor produtivo e possibilitar a integração da cadeia produtiva da madeira na Amazônia. O setor florestal no País tem sido agressivo em inovações, necessitando, portanto, que o setor público ocupe espaços nos quais há dificuldades de execução.

O exemplo do que foi feito com o eucalipto deve basear as pesquisas com as espécies nativas e mesmo exóticas, pois temos de recuperar o tempo perdido no desenvolvimento de tecnologias para o seu cultivo em larga escala.

Finalmente, há uma crença generalizada no País de que os investimentos de pesquisa no setor privado substituem os investimentos do setor público. Trata-se de um grande equívoco, pois o esforço conjunto, tanto do setor público quanto do privado para a área florestal, tem efeitos complementares e suplementares importantes para garantir a construção de uma nova Amazônia.