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Izabella Mônica Vieira Teixeira

Ministra do Meio Ambiente

Op-CP-39

Água para quem tem sede

Desde 1587 – logo depois, portanto, do descobrimento do Brasil –, há relatos de seca no semiárido, área que totaliza 969.589 km2 (11% do território nacional), hoje habitada por 20.858.264 de pessoas em 1.133 municípios de dez estados. Nesses períodos cíclicos, o cenário é o mesmo: falta água para consumo humano, responsável pela morte de 3 milhões de sertanejos ao longo de 200 anos, de acordo com o historiador Marco Antônio Villa, e pelo êxodo rural verificado ao longo da história.

Ao mesmo tempo, a lavoura se perde, e os esquálidos animais também morrem de fome e sede. Os governos se sucediam, quase sempre com medidas paliativas ou emergenciais, chamadas pejorativamente de “indústria da seca”. A partir de 2003, o Governo Federal começou a dar novo enfoque ao problema. Ação coordenada pelo Ministério do Meio Ambiente em parceria com instituições federais, estaduais, municipais e a sociedade civil desenvolve política pública permanente de acesso à água de boa qualidade para o consumo humano, incorporando cuidados técnicos, ambientais e sociais na gestão dos sistemas de dessalinização, prioritariamente em comunidades rurais do semiárido, batizado de Programa Água Doce.

Desde 2011, faz parte do Plano Brasil sem Miséria. Os nove estados do semiárido conveniados – Alagoas, Bahia, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe – se comprometeram a entregar, até o final do ano, 438 sistemas de dessalinização, beneficiando 200 mil pessoas que sofrem com a escassez de água em pequenas comunidades rurais isoladas no interior do País. A meta é atender, até 2019, a 1,5 milhão de pessoas, das quais 500 mil até 2016.

Não dispondo de reserva hídrica potável por todo o período de estiagem, a população sofre para obter água, geralmente a quilômetros de distância de suas casas e, na maioria das vezes, imprópria para consumo. Com vistas a resolver o problema, os poços tubulares surgem como alternativa, viabilizando o uso de sua água, salobra ou salina, por meio de sistemas de dessalinização por osmose inversa.

Os trabalhos começaram a partir dos municípios mais críticos em cada estado e nas áreas mais suscetíveis ao processo de desertificação, para atender, primeiramente e por critérios eminentemente técnicos, a quem mais precisa. Menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH), altos percentuais de mortalidade infantil, baixos índices pluviométricos e com dificuldade de acesso aos recursos hídricos são critérios para a priorização dos municípios a serem beneficiados.

Outro aspecto importante é a relação do programa com a Política Nacional sobre Mudança do Clima. Por reduzir as vulnerabilidades no que diz respeito ao acesso à água no semiárido, o Água Doce é considerado uma medida de adaptação às mudanças climáticas. Além de levar água potável aos que tanto necessitam, onde a vazão do poço permite, o programa constrói três subsistemas independentes.

A dessalinização da água extraída do subsolo se complementa com a piscicultura (criação de tilápias para, preferencialmente, alimentar a comunidade), o uso do concentrado salino-orgânico para irrigação de plantas halófitas e a utilização da erva-sal associada a outras culturas para alimentação animal. O sistema de produção foi desenvolvido pela Embrapa Semiárido, enquanto a Embrapa Meio Ambiente ficou com a tarefa de elaborar sistemas simples de avaliação de risco socioambiental para priorizar as comunidades a serem beneficiadas.

As ações focalizam a construção de acordos de gestão, que objetivam o estabelecimento de bases sólidas de cooperação e participação social na gestão dos sistemas de dessalinização (poço–dessalinizador–destino adequado do concentrado) e dos sistemas produtivos a serem implantados (criação de peixes–cultivo da erva-sal–produção de alimentos para caprinos e ovinos), garantindo não apenas a oferta de água de boa qualidade em regiões historicamente sacrificadas pela seca, mas também a viabilidade de alternativas de geração de renda que se integrem às dinâmicas locais.

A conta de energia gasta na operação dos equipamentos é, geralmente, paga pela prefeitura ou pela comunidade. Para dar mais independência às comunidades, será instalado, no Rio Grande do Norte, um sistema experimental movido por energia solar com painéis fotovoltaicos. Um aspecto que chama atenção é a relação dos habitantes do semiárido com a água. Eles aprendem, desde cedo, que se trata de um produto finito e essencial para a sobrevivência dos seres vivos. Um exemplo que deveria se disseminar por outras regiões do País.