Pesquisadora do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação-UNESP
Op-CP-28
Colaboração: Milton Cezar Ribeiro e Alessandro Marques
Ao longo de 2009, o Fórum Florestal do Sul e Extremo Sul da Bahia chamou a atenção para o fato de que não existiam informações detalhadas sobre a evolução temporal da cobertura florestal das bacias setentrionais do extremo sul da Bahia. Essa lacuna dificultava o entendimento quantitativo dos processos de dinâmica da paisagem e o planejamento de ações de conservação da biodiversidade.
A discussão foi levada ao Subcomitê da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica do Extremo Sul da Bahia e ao Conselho Gestor do Mosaico de Áreas Protegidas do Extremo Sul da Bahia, resultando em uma deliberação sobre a importância da realização de um estudo dessa natureza.
A Veracel Celulose lançou, em 2010, um edital público com o objetivo de selecionar instituições para realizar um estudo de monitoramento da evolução temporal da cobertura florestal em uma área contínua de 2,3 milhões de hectares, que inclui as áreas de influência atual ou prevista da empresa.
Para a realização do estudo, a Veracel cedeu sua base de imagens de satélite SPOT 5 (2006), Formosat (2007) e Landsat (1990, 2001-2), assim como ortofotos (1995-6), de modo a permitir um mapeamento refinado para as diferentes datas e também a comparação entre diferentes épocas.
Um consórcio formado pelo Instituto BioAtlântica (IBio), pela empresa de consultoria ambiental ECONAMFI e pelo Laboratório de Ecologia da Paisagem e Conservação (LEPaC/USP) e com a colaboração do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação (LEEC/UNESP) foi selecionado para executar esse estudo de monitoramento.
A fim de garantir que a sociedade civil fosse representada em todas as etapas do projeto, foi estabelecido um comitê de acompanhamento dos trabalhos, cujos membros foram indicados pelos três colegiados já mencionados. Esse comitê também foi encarregado de zelar pela transparência de todo o processo e difundir, na sociedade e nas organizações da região, o conhecimento gerado pelo projeto.
O trabalho de interpretação visual das imagens foi realizado ao longo de 2011 por duas equipes locais, uma em Ilhéus e outra em Porto Seguro, que foram capacitadas no início do trabalho. Os critérios de classificação dos tipos de vegetação e de cobertura do solo nas imagens de satélite foram construídos utilizando dados de campo coletados em mais de 3.700 pontos distribuídos por toda a região de interesse.
O resultado dessa análise foi uma legenda de vegetação e uso do solo extremamente detalhada, com 28 classes de cobertura. Um dos principais resultados do projeto foi o mapeamento da cobertura vegetal e do uso do solo na área de interesse, para o período 2006-2007, com uma escala de 1:20.000 (utilizando imagens com resolução de 2,5 m), que é significativamente mais refinada do que mapeamentos anteriores da mesma região.
Esse mapeamento cobre uma área milhares de vezes maior do que mapeamentos anteriores de resolução espacial comparável em outras partes da Mata Atlântica. Foi também realizado um mapeamento na mesma escala em uma área de 1,1 milhão de hectares, utilizando ortofotos do período 1995-1996, o que permitiu quantificar as mudanças ocorridas na paisagem entre 1995 e 2007. Uma análise similar foi realizada na escala de 1:50.000, utilizando imagens de satélite com resolução de 30 m, tomadas em 1990 e em 2001-2002.
Os resultados do projeto fornecem uma caracterização mais detalhada e precisa da distribuição dos diferentes tipos de vegetação e de uso do solo na região e deverão fornecer subsídios para ações de conservação e restauração florestal, manejo de paisagens, incremento da conectividade de fragmentos florestais, sequestro de carbono, planificação territorial, etc.
Essa iniciativa inédita no Brasil resultou de uma sinergia entre uma grande empresa do setor florestal e membros da sociedade civil organizada e da comunidade científica e produziu novos conhecimentos que serão úteis a todos os atores envolvidos. O apoio da Veracel Celulose foi essencial: um mapeamento tão extenso em alta resolução dificilmente teria sido possível utilizando apenas fontes convencionais de financiamento à pesquisa.
Além disso, o projeto teve outras características desejáveis, como a construção participativa e a transparência de todo o processo, a qualificação e a atuação de técnicos locais no mapeamento e o treinamento de membros de organizações que atuam na região no uso dos produtos gerados pelo projeto. Fica assim demonstrado o quanto se pode avançar em pouco tempo quando o setor florestal, a sociedade civil e a comunidade científica trabalham juntos em direção ao entendimento de questões que afetam todas as partes envolvidas.