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Osvaldo Luiz Leal de Moraes

Diretor do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais -Cemaden

Op-CP-44

Extremos climáticos e desastres naturais
Coautor: José Antônio Marengo Orsini, Climatologista e Meteorologista, Chefe da Coordenação-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Cemaden

Valores anormais de um estado climático médio observado ao longo do tempo são comumente chamados de "eventos extremos". Esses eventos ocorrem em escalas temporais que variam de horas, dias e até mesmo milênios, sendo que os mais importantes para as atividades humanas são os extremos de curto prazo (relacionados com o tempo) e os de médio prazo (relacionados com o clima), pois têm potencial para causar impactos significativos. Dependendo das vulnerabilidades existentes, esses eventos podem impactar seriamente os sistemas humanos atingidos, ocasionando um desastre natural. Dessa forma, a ocorrência de desastres suscitam e expõem a vulnerabilidade das populações, alterando o funcionamento das sociedades e o bem-estar social.
 
É importante ressaltar que um desastre também pode ocorrer devido a eventos não extremos, pois os impactos causados dependem diretamente de outros fatores não climáticos. Nesse sentido, as ações e as omissões humanas contribuem para intensificar ou agravar fenômenos potencialmente indutores de desastres, os quais também se caracterizam a partir da intercorrência de fenômenos naturais adversos, atuantes sobre condições ambientais já degradadas pelo homem. As mudanças climáticas vêm ganhando cada vez mais destaque em todo o mundo e traz em seu bojo duas formas básicas de enfrentamento: a mitigação e a adaptação.
 
Até pouco tempo, no cenário mundial, o foco esteve voltado para a mitigação, e, atualmente, a adaptação começa a ganhar destaque, principalmente em áreas urbanas. Em relação a eventos extremos de tempo e clima, têm-se observado tendências positivas na frequência de noites e dias quentes e tendências negativas na frequência de noites e dias frios, consistentes com um cenário de aquecimento global.

Para o Sudeste da América do Sul, tem-se 
observado um aumento na intensidade de episódios e frequência de dias com chuva intensa no período 1961-2010, ou seja, as chuvas estão se tornando cada vez mais violentas, isso apesar de o total anual precipitado não ter sofrido modificação perceptível; alguns estudos têm mostrado relação de extremos de chuva no Sudeste e no Sul do Brasil à frequência/intensidade com padrões de circulação como a Zona de Convergência do Atlântico Sul – ZCAS, ou o Jato de Baixos Níveis da América do Sul – SALLJ.

A maior disponibilidade de dados permite análises 
para o Sudeste da América do Sul, enquanto a ausência de dados diários de longo prazo na região tropical não permite uma análise mais abrangente dos extremos nessa parte do continente. Em cidades como São Paulo, tem-se observado um efeito na urbanização nos extremos de chuva e enchentes.  
 
Usando índices de extremos, se mostram tendências positivas de noites quentes (índice TN90 - definido como porcentagem de noites com temperatura mínima no 90th percentile) no Sudeste do Brasil, que vão de 5% na década de 1950 até quase 35% no início do século XXI. Por outro lado, a tendência de dias frios tem apresentado frequência de 25-30% na década de 1970, chegando até 5-10% em 2001-2002.
 
Isso é consistente com tendências positivas de grande magnitude nas temperaturas mínimas e, em menor grau, nas temperaturas máximas no Brasil, como já destacado no item anterior. Os dados das estações mostram uma tendência de aumento dos episódios de chuva intensa em grande parte do Sudeste da América do Sul, Centro da Argentina e até o Centro-Oeste e Sudeste do Brasil. 
 
No Brasil, as tendências positivas de extremos de chuva aparecem mais intensamente nos estados de SP, PR e RS, enquanto a falta de dados de chuva não permite estender a análise para MG e BA. Vários estudos já identificaram tendências positivas no número de dias com chuva intensa e com chuva muito intensa concentrada em curto tempo e na quantidade de chuva concentrada em eventos chuvosos que são indicadores de chuvas que produzem enchentes durante 1961-2000.
 
Essas tendências sugerem aumento e intensidade na frequência de eventos de chuva no Sudeste da América do Sul, enquanto a ausência de dados na região tropical não permite uma análise mais abrangente dos extremos nessa parte do continente. Tendências positivas na chuva máxima acumulada em 5 dias têm sido observadas nas latitudes mais austrais do que de 20ºS na América do Sul durante a primavera, verão e outono, enquanto algumas áreas do norte da Argentina apresentam tendências negativas durante o inverno. 
 
As tendências de aumentos de extremos de chuva indicam também aumento no número de desastres naturais, como enchentes, enxurradas e deslizamentos de terra em regiões densamente populadas do Sul e no Sudeste do Brasil. Populações morando em áreas vulneráveis e de risco estão expostas a esse tipo de desastre, e essa vulnerabilidade pode aumentar no futuro, se medidas de adaptação não forem tomadas.

Nos trabalhos da Terceira Comunicação Nacional, a UNFFCC – United Nations Framework Convention on Climate Change (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima), foram desenvolvidos índices de vulnerabilidade a vários tipos de desastres, aplicados no presente e no futuro, e esse tema será o foco do novo projeto de bolsa de pesquisa para 2016-2021. Essas tendências nos extremos de chuva e temperatura têm sido também apresentadas nos relatórios do IPCC AR5 e do PBMC, assim como do Relatório Brasil 2040, apresentado pela SAE em 2015, e na publicação da Terceira Comunicação Nacional, a UNFCCC.

 
Diante do grande potencial de impactos ambientais decorrentes das condições estimadas do clima futuro, é extremamente importante aprimorar e criar novas ferramentas que permitam avaliações detalhadas desses impactos no Brasil. Essas ferramentas são importantes para prover bases científicas para tomadas de decisões sobre regiões vulneráveis e processos críticos de conservação ambiental. 
 
São necessárias análises que incluam as respostas dos ecossistemas às forçantes climáticas de escala global e à corrente dinâmica de alteração causada pela ocupação humana e que apontem os fatores que causam os impactos mais relevantes. Dentre os tipos de desastres que afetam o Brasil, podemos destacar as inundações bruscas/enxurradas e os alagamentos e os movimentos de massa. 
 
Segundo o Atlas de desastres naturais do Brasil publicado pela CEPED em 2013, esses foram os desastres que mais causaram óbitos no período entre 1991-2012. Existem outros tipos de desastres, que também afetam grande parte da população brasileira, como as secas e as estiagens ou as inundações graduais (também chamadas de cheias). Entretanto, o foco desse trabalho será mantido nas inundações bruscas, enxurradas e alagamentos, bem como nos movimentos de massa, pois são aqueles que requerem uma avaliação mais emergencial, visando à redução dos impactos, sobretudo da ocorrência de óbitos. 
 
Sendo o Brasil vulnerável às mudanças climáticas, é essencial que as alterações climáticas sejam totalmente integradas às políticas ambientais e de desenvolvimento, assim como de enfrentamento aos desastres naturais, de modo que as ações do governo possam ajudar a enfrentar esse problema, avaliando a vulnerabilidade regional e nacional e propondo medidas de adaptação.