Professor de Manejo de Bacias Hidrográficas da Esalq-USP
Op-CP-39
O contexto atual observado na região Sudeste do Brasil, de perda de solos, de impactos na água e da condição dos remanescentes florestais, agravado pela crise hídrica, tem ocasionado uma busca por florestas não reais ou “encantadas”, para as quais dificilmente serão encontradas equivalências nas florestas naturais ou plantadas atualmente existentes.
A expectativa sobre possíveis funções ou disfunções dessas florestas tem sido muito alta, pode-se dizer acima de suas próprias capacidades, fruto do não entendimento claro das limitações que lhes são intrínsecas, das condições naturais relacionadas a esses problemas ambientais e de uma interpretação equivocada da responsabilidade ambiental das demais atividades produtivas.
No caso de florestas nativas, espera-se, por exemplo, que pequenas proporções de florestas que se encontram degradadas e dispersas na paisagem agrícola sejam capazes de proporcionar serviços ecossistêmicos equivalentes a florestas bem conservadas, como produção e regulação de água de boa qualidade, redução de processos erosivos, manutenção da biodiversidade e, se possível, ainda, provisão de um retorno econômico ao produtor (no caso das Reservas Legais).
Espera-se que essas florestas sejam também capazes de absorver e reverter impactos causados pela falta de planejamento, sobreutilização de recursos do solo e do manejo inadequado da atividade agrícola/florestal. A grande maioria das florestas nativas existentes em áreas agrícolas não são capazes de desempenhar bem essas funções, e é necessário que se entenda um pouco melhor suas limitações e como manejá-las para aumentar a oferta de serviços.
No caso de florestas plantadas, na busca incessante pelo aumento da produtividade, espera-se que essas florestas sejam capazes de manter a alta produtividade, sem que causem qualquer tipo de efeito ou comprometam a sustentabilidade da própria atividade e de seu entorno. Nesse caso, tem que se ter em mente os limites naturais de cada região, em termos de solos e água, e respeitá-los, buscando alternativas de manejo que sejam mais equilibradas.
Também essas florestas não podem ser vistas nem como “encantadas” e muito menos como “sobrenaturais”, no sentindo de causar tantos impactos que lhe são atribuídos injustamente. Também não podem ser vistas como substitutas de florestas nativas, o que jamais serão, mas é preciso, sim, ter uma visão mais justa de seus benefícios e efeitos. De modo geral, não existe floresta “encantada”, e sim floresta que funciona melhor ou pior para cada serviço ecossistêmico, e sua capacidade está relacionada não só à sua característica natural, mas também muito influenciada pelo manejo que lhe é empregado.
Da mesma forma, os impactos advindos do manejo florestal estão relacionados ao planejamento (ou à sua falta) e às práticas silviculturais empregadas. Ou seja, pode-se dizer que não existe floresta “boa” ou floresta “ruim”, existe, sim, floresta bem ou mal manejada. Em seguida, pretende-se, de forma genérica, mostrar que o manejo florestal pode influenciar na capacidade das florestas, de acordo com sua qualidade, sua proporção e sua posição na paisagem.
No caso de florestas nativas, a qualidade da floresta é dada, primeiramente, pelo tipo de fisionomia florestal, natural de cada região e adaptada às limitações regionais. Mas também seu estado de conservação e idade (no caso de florestas restauradas) influenciam muito na sua capacidade de oferecer serviços ecossistêmicos. Por exemplo, florestas degradadas oferecem menos serviços que florestas conservadas.
Em segundo lugar, a proporção que ocupam na paisagem é diretamente relacionada à sua capacidade de influenciar os processos. Como exemplo, não se pode esperar que florestas que ocupam 5% da área de uma bacia hidrográfica possam produzir grandes efeitos hidrológicos nessa mesma bacia. Da mesma forma, a posição das florestas está relacionada à sua função: florestas de topo auxiliam mais no processo de infiltração, enquanto florestas em encostas protegem o solo, e florestas ripárias interagem com o riacho, por exemplo.
Assim, a recomposição florestal deve ocupar, no máximo, 20% da paisagem, sendo importante que ações de conservação de água e de solo sejam implementadas nos demais usos das bacias. As florestas naturais, sim, podem contribuir, mas precisam ser bem planejadas para que suas funções sejam otimizadas. No caso de florestas plantadas, a qualidade pode ser entendida pela espécie (ou material genético), mas, da mesma forma, sua idade e o tipo de manejo empregado influenciam muito na capacidade dessas florestas.
Por exemplo, plantios de eucalipto com 2 anos de idade diferem muito em estrutura e uso dos recursos quando comparados a plantios com 6 ou 7 anos. A proporção que as florestas plantadas ocupam na paisagem também está relacionada à influência que poderá exercer nos processos. Por exemplo, é recomendado que grandes extensões de florestas plantadas sejam manejadas sob a forma de mosaico.
Na questão de posição, florestas plantadas no topo também podem auxiliar na infiltração da mesma forma que encostas auxiliam na proteção do solo, mas, em áreas ripárias, não exercem as mesmas funções que a floresta nativa e devem ser evitadas. O posicionamento deve ser considerado também na questão do planejamento de estradas e das operações de colheita.
Em resumo, levando-se em conta as limitações naturais regionais, as florestas plantadas intercaladas com florestas nativas e planejadas na escala da microbacia podem contribuir para a conservação da água. Na busca da sustentabilidade das florestas “reais”, nativas ou plantadas, devem-se evitar os encantamentos e as fantasias e focar os esforços no entendimento de suas características e do meio, o que exige mais planejamento, seriedade e equilíbrio. Não é o momento de se deixar iludir por florestas imaginárias, e sim se encantar com a engenharia florestal, que tem agora a grande oportunidade de mostrar sua capacidade de planejar, produzir e, ao mesmo tempo, conservar para garantir que todas as florestas, de fato, funcionem.