A resposta à pergunta que dá título a este artigo é afirmativa. No Brasil, a competição pela terra representa hoje um dos maiores entraves à expansão florestal, especialmente nos clusters industriais já consolidados. A elevação dos custos de produção silvicultural e os desafios para ampliar a produtividade dos plantios tornam esse cenário ainda mais complexo.
O principal vetor dessa pressão é a expansão acelerada da agricultura, que tem elevado os preços da terra e restringido o acesso mesmo em áreas com potencial silvicultural. A trajetória da agricultura brasileira ajuda a entender esse fenômeno: entre 1980 e 2024, a produção de grãos cresceu a uma taxa média de 4,4% ao ano, e a demanda por terra a uma taxa de 1,4% ao ano. Essas taxas indicam uma intensificação produtiva e uma ocupação territorial cada vez mais agressiva.
Impulsionadas por tecnologias da Embrapa, entre 2000 e 2024, a área plantada aumentou 118%, e a produção de grãos, 250%. Com esses ganhos expressivos de produtividade, a agricultura vem avançando sobre áreas antes exclusivamente destinadas à pecuária extensiva e à silvicultura, transformando a vocação e o valor dessas terras.
Esse impacto é evidente em estados como Paraná e Santa Catarina, onde se concentram os plantios de Pinus. Em apenas sete anos, entre 2017 e 2024, os preços das terras silvipastoris subiram 73% em termos reais.
No mesmo período, a área plantada com grãos cresceu 11%, e a produção, 29%. No Mato Grosso do Sul, onde a indústria de celulose de Eucalyptus cresce de forma exponencial, entre 2019 e 2025, o preço dessas terras aumentou 21%, enquanto a produção de grãos avançou 29% e a área plantada, 32%. A valorização fundiária está diretamente ligada à atratividade da agricultura — e isso afeta diretamente a silvicultura.
ÁREAS E PRODUÇÃO DE GRÃOS NO BRASIL
1980-1924 (Conab)
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Azul: Produção de Grãos (em milhões de toneladas)
Vermelho: Área (em milhões de hectares)
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E a competição pela terra tende a se intensificar. A agricultura continuará a crescer, pressionando o mercado fundiário. Mesmo as terras com vocação florestal serão disputadas, já que a própria indústria agrícola demanda biomassa certificada para atender às exigências dos mercados nacional e internacional por sustentabilidade.
Desde o fim dos incentivos fiscais nos anos 1980, a silvicultura brasileira passou a depender de investimentos industriais e do “mercado spot” (plantios independentes). Porém, com a expansão agrícola, o mercado spot passou gradativamente a perder relevância. Migrar da silvicultura para a agricultura tornou-se um negócio mais lucrativo e menos arriscado, dada a estrutura de mercado mais competitiva da agricultura e a imperfeição estrutural do mercado de madeira.
Até mesmo os investidores institucionais (TIMOs) têm sentido o impacto do custo da terra, optando por contratos de suprimento de longo prazo em terras arrendadas pela indústria. Com isso, também minimizam os riscos inerentes a um mercado “perfeitamente imperfeito”.
Em síntese, a terra deixou de ser um fator pró-competitividade da silvicultura brasileira e se tornou um desafio estratégico para o crescimento da indústria florestal.
Esse desafio se agrava com o aumento de aproximadamente 70% dos custos silviculturais, em termos reais, desde 2019, e com a queda da produtividade florestal provocada pela “marcha para o oeste” e pelas mudanças climáticas.
Diante desse contexto, quatro estratégias de ação, não excludentes, se apresentam para fazer frente ao desafio da terra:
• Expandir a silvicultura para regiões ainda não ocupadas pela agricultura: viável para o crescimento industrial, mas com florestas provavelmente menos produtivas, uma curva de aprendizado silvicultural significativa, e uma janela de oportunidade realmente curta para adquirir terras a preços baixos.
• Incorporar os custos da terra ao preço dos produtos florestais: possível até certo ponto, mas limitado pela concorrência global acirrada, em que os compradores têm um alto poder de barganha devido à falta de métricas quanto à oferta e à demanda.
• Aumentar a produtividade florestal: uma estratégia complexa e de longo prazo, especialmente diante da necessidade de se aumentar a resiliência dos clones a eventos climáticos adversos e a pragas e doenças.
• Reestruturar o mercado spot: essencial, mas de difícil execução, porque exige uma ação coordenada entre governo e indústria para viabilizar mecanismos financeiros, produtivos e de gestão que tornem o mercado competitivo.
As três primeiras estratégias já estão em andamento, em diferentes estágios de desenvolvimento. A quarta, no entanto, permanece distante de ser implementada.
No entanto, sua adoção é fundamental para que a silvicultura continue desempenhando um papel estratégico no desenvolvimento sustentável do Brasil. Especialmente quanto à sua contribuição ao superávit comercial, à redução da pressão sobre florestas nativas e ao aumento da captura de carbono.