Pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental
Op-CP-07
Reflorestar a Amazônia brasileira é um paradoxo. Esse pensamento foi marcante na região durante várias décadas, devido à abundância de floresta nativa. Entretanto, hoje, o cenário é outro, ou seja, cresce na sociedade o sentimento de conservação da floresta nativa e a necessidade de atividades econômicas ambientalmente mais sustentáveis.
O desenvolvimento da região deve considerar uma população de mais de 20 milhões de pessoas e ser compatível com a realidade regional. Esse é o grande desafio para governantes, e essa constatação não é nova. Mas a pergunta que se faz é: O que é possível ser feito? Do ponto de vista florestal, temos a utilização da floresta nativa, via seu manejo policíclico, e o aproveitamento, para o plantio florestal, das extensas áreas alteradas/degradadas por atividades antrópicas.
A reincorporação ao processo produtivo das áreas alteradas pode contribuir, significativamente, para o aumento da oferta de madeira de elevado valor econômico, e diminuir a pressão sobre as florestas nativas. A silvicultura de plantações começou na Amazônia, no final da década de 50. Naquela época, peritos da FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, iniciaram, junto com técnicos brasileiros, um trabalho de teste de espécies florestais.
Ao longo desse tempo, considerando os esforços de diferentes órgãos - Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia, SUDAM; Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, IBAMA; Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, Embrapa, e Universidade Federal Rural da Amazônia, UFRA, mais de 100 espécies foram plantadas experimentalmente, sob diferentes condições ambientais.
Muitos trabalhos foram abandonados ou perdidos ao longo dos anos, mas o conhecimento científico acumulado disponível, embora restrito a poucas espécies, é suficiente para orientar atividades econômicas. Algumas espécies como morototó (Didymopanax morototoni), paricá (Schizolobium amazonicum), tatajuba (Bagassa guianensis), quaruba verdadeira (Vochysia maxima), castanha-do-pará (Bertholetia excelsa) e cumaru (Dipterix odorata), podem ser plantadas para produzir madeira para serraria, enquanto taxi-branco (Sclerolo-bium paniculatum), para fins energéticos.
Sistemas de produção, baseados em enriquecimento de floresta secundária, plantio a pleno sol, integração lavoura-pastagem-floresta, ou sistemas agroflorestais, já podem ser usados. Mas, para que plantações florestais sejam incorporadas na paisagem amazônica, não se deve levar em conta somente o conhecimento da academia. Na prática, existem muitas experiências conduzidas, que podem fornecer lições e recomendações.
E, nesse sentido, dois livros lançados em 2006 sobre avaliação de experiências produtivas agropecuárias e florestais, praticadas na Amazônia brasileira por produtores do agronegócio familiar e empresarial, podem ser considerados como referência. O primeiro, “Silvicultura na Amazônia brasileira: avaliação de experiências e recomendações para implementação e melhoria dos sistemas”, de César Sabogal e colaboradores, avalia os motivos de sucesso e dificuldades para a prática da silvicultura, em termos familiar e empresarial.
A partir de 67, experiências visitadas nos estados do Pará, Rondônia, Amazonas e Mato Grosso, os principais obstáculos do agronegócio familiar para plantar árvores foram:
1. difícil aquisição de sementes e mudas (espécies nativas);
2. pouco conhecimento sobre o manejo de espécies;
3. baixa qualidade e freqüência da assistência técnica;
4. falta de crédito para a implementação e manutenção das experiências; e
5. presença de pragas e doenças.
Para o agronegócio empresarial, as necessidades observadas foram:
a. capacitação de pessoal sobre controle de pragas e doenças; e
b. incentivar a presença de técnicos capacitados para o plantio de espécies florestais nativas.
O segundo livro é “Recuperação de áreas alteradas na Amazônia brasileira: experiências locais, lições aprendidas e implicações para políticas públicas”, de Everaldo Almeida e colaboradores. Seu foco concentrou-se na avaliação de 30 iniciativas de recuperação de áreas alteradas, praticadas por agricultores distribuídos por todos os Estados da Amazônia brasileira. As principais lições derivadas de aspectos técnicos, socioeconômicos e ambientais foram:
1. Organização social: produtores organizados e motivados têm maiores chances de sucesso na condução das experiências;
2. Capacitação: as famílias devem ser capacitadas em diversificação de sistemas de uso do solo;
3. Assistência técnica: a informação transmitida deve ser freqüente e de qualidade;
4. Expectativas: evitar falsas expectativas entre produtores sobre os benefícios dos projetos a serem implantados;
5. Seleção de produtores: considerar aqueles com real interesse e capacidade para assumir riscos;
6. Comprometimento: deve estar presente em todas as fases da cadeia produtiva, para se evitar o paternalismo;
7. Mão-de-obra: considerar a disponibilidade na família;
8. Seleção de espécies: utilizar uma ou duas espécies de valor e com possibilidade de aceitação em mercados próximos;
9. Benecificiamento e comercialização da produção: estimular a formação de redes de produtores, para atenderem demandas de mercado e fortalecerem organizações sociais.
Em termos de reposição florestal, a realidade amazônica está aquém da demanda atual por madeira. É preciso que haja um programa de fomento florestal, que integre atividades agrícola e florestal, numa mesma unidade de produção, e que abranja os agronegócios familiar e empresarial. Dessa forma, será possível aumentar a oferta de madeira tropical a médio e longo prazo, proporcional à escala regional e com a participação de diferentes atores sociais.