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Silvio Frosini de Barros Ferraz

Professor de Manejo de Bacias Hidrográficas da Esalq-USP

Op-CP-32

Plantios florestais: transformando vilões em mocinhos

Os plantios florestais, especialmente os de eucalipto e pinus, foram, e, em alguns casos, continuam sendo, tidos como vilões para o meio ambiente. Esse estereótipo vem sendo atribuído às espécies exóticas arbóreas em geral por diversos motivos culturais, falta de informação e alguns tropeços do passado, comuns ao desenvolvimento tecnológico de qualquer processo produtivo.

Primeiramente, a cultura florestal no País é recente, sendo que florestas ainda são vistas exclusivamente como ecossistemas naturais, incluindo todos os seus atributos estéticos e, logicamente, suas funções, tão importantes para a conservação da água, dos solos, da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos em geral.

Essa “cegueira” florestal só pode ser corrigida com o tempo, com a incorporação na cultura nacional da ideia de que florestas também podem ser plantadas e manejadas comercialmente, trazendo muitos benefícios, conceitos já secularmente incorporados em países com tradição florestal.

Os plantios florestais, embora sejam ecossistemas simplificados, também são denominados de florestas, mas florestas plantadas e com todas as suas limitações nos atributos e nas funções anteriormente citadas.

Embora haja uma distinção clara e técnica entre os dois ecossistemas, culturalmente existe uma grande confusão, a qual pode causar diferentes situações conflitantes, como denúncias equivocadas a respeito de corte de árvores (plantadas para esse fim), comparações estéticas das florestas e a falsa expectativa de se buscar funções da floresta nativa em uma floresta com finalidade comercial.

Essas confusões, comuns ao público em geral, aliadas à falta de informação sobre impactos e benefícios das florestas plantadas, têm sido agravadas por situações pontuais de impacto, especialmente na água, devido a erros no processo de aprendizado do manejo florestal de espécies de rápido crescimento, falta de planejamento e não atendimento à legislação ambiental.

O cenário citado, mais frequente no passado recente (expansão dos plantios na década de 70), embora menor, ainda persiste em poucas regiões do País, mas ecoa do passado sempre que existe uma situação de conflito.

Nos últimos 40 anos, é evidente que houve imensos avanços no manejo de florestas plantadas em termos de aumento de produtividade e sustentabilidade desses ecossistemas em geral, pelo avanço tecnológico, melhoramento genético, legislação ambiental,  certificação ambiental entre outros.

Apesar disso, ainda existe uma diversidade grande de técnicas de manejo, em função do gradiente de acesso à tecnologia da cadeia produtiva envolvida. Esses avanços no manejo florestal, hoje, nos permitem afirmar que não existe floresta “ruim”, nem este ou aquele “vilão”, mas o que ainda existem em pequenas proporções são florestas plantadas mal manejadas por diversos fatores e que, sim, nesse caso, podem causar algum efeito não desejado.

Particularmente, na quantidade de água dos riachos que drenam os plantios, tema mais frequente nas discussões sobre impacto dos plantios, vários estudos mostram que os plantios reduzem a vazão a jusante, mas, observando-se a disponibilidade hídrica regional e com manejo adequado, podem-se controlar esses efeitos, minimizando-os.

Ao contrário, em regiões com disponibilidade hídrica adequada, a cobertura dos plantios florestais associados às áreas de vegetação nativa, quando manejados adequadamente, são capazes de equilibrar melhor os fluxos hidrológicos e auxiliar na conservação da biodiversidade retida nos ecossistemas nativos.

Nesse caso, estamos falando de uma mudança de paradigma importante e histórico que já pode ser observado em florestas plantadas bem manejadas, em que o ecossistema, composto por plantios e vegetação nativa são capazes de produzir e, ao mesmo tempo, conservar, ao invés de causarem impactos.

A afinidade florestal e a baixa intensidade de manejo já tornam os plantios florestais com potencial de conservação, diferentemente dos sistemas agrícolas que apresentam grande contraste em relação à vegetação florestal nativa e alta intensidade de manejo.

Mesmo assim, os sistemas agrícolas não são vistos como “vilões” por questões históricas e culturais, apesar de, frequentemente, apresentarem maiores impactos do que os plantios florestais e oferecerem menores possibilidades de serviços ecossistêmicos do que os primeiros.

Mas, então, o que é preciso para tornar os plantios verdadeiros mocinhos? É necessário encarar o desafio de planejar florestas para que sejam produtivas e também capazes de conservar o solo, a água, a biodiversidade, enfim, os serviços ecossistêmicos.

Existem inúmeros casos em que já se podem observar em campo os resultados de um bom manejo florestal; é preciso que estes se tornem cada vez mais frequentes e mostrem seus benefícios, pois já é tempo de uma mudança de percepção para que as florestas plantadas sejam vistas com outros olhos.

Esse desafio, atualmente, reflete também um momento ímpar na engenharia florestal, na qual é necessário integrar os conhecimentos de biologia, solos, clima, hidrologia e economia para encontrar as melhores soluções locais de manejo florestal, para manutenção da produtividade que estejam em sintonia com a busca pela sustentabilidade.

O momento que mais vem exigir da engenharia florestal é também motivo de orgulho para uma das únicas profissões que têm, em suas raízes, o conceito de sustentabilidade na prática e que têm, neste momento, a oportunidade de mostrar quão é capaz de “engenheirar” plantios florestais produtivos e responsáveis por materiais reconhecidamente essenciais na vida das pessoas, mas com capacidade de oferecer serviços ambientais. Esses plantios, então, poderão ser reconhecidos, cada vez mais, numa sociedade mais madura como “mocinhos”, enterrando de vez os “vilões” do passado.