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Sérgius Gandolfi

Professor de Ciências Biológicas da Esalq-USP

Op-CP-07

Restauração de florestas brasileiras: caminhos abertos, grande futuro

Os pesquisadores brasileiros que se dedicam à restauração ecológica de florestas têm buscado conhecer e organizar um grande conjunto de informações científicas, desenvolvidas no Brasil e no mundo, sobre a estrutura e dinâmica de florestas tropicais e subtropicais, de maneira a selecioná-las e interpretá-las, frente às nossas realidades.

 Esse esforço tem conduzido diferentes grupos a reunirem e ordenarem idéias em esquemas racionais distintos, que lhes servem de pano de fundo, sobre o qual os trabalhos práticos têm sido orientados e as recuperações vêm sendo feitas. Mesmo pequenos fragmentos de Mata de Brejo, de Planalto, ou Atlântica são muito diferentes de simples plantios de algumas espécies arbóreas.

A conversão de plantios em florestas funcionais depende da reconstrução local de muitas condições estruturais e de muitos processos ecológicos, sem os quais, nas paisagens agrícolas atualmente predominantes, esses plantios, em pouco tempo, converteriam-se em meros pastos arborizados. Os caminhos já trilhados e as experiências já desenvolvidas representam uma importante herança técnico-científica acumulada.

Ela reflete a opção pelo uso do conhecimento científico, em diálogo constante com a arte do executar, como ferramenta para a solução de problemas, uma tradição que os países desenvolvidos têm privilegiado no enfrentamento de questões complexas, que buscam obter melhor eficiência e menores custos. Portanto, não usar os resultados efetivos, já obtidos às custas de muitos erros, acertos e esforços, representa um retorno a um passado de pelo menos trinta anos.

Entre os avanços obtidos nessas últimas décadas, está o reconhecimento de que um projeto de recuperação diverge do simples abandono de uma área para que ela se regenere naturalmente, fato que, muitas vezes, não ocorrerá. Representa, ao contrário, o reconhecimento de que, em geral, existem um ou vários impedimentos à regeneração natural de uma dada área, que são oriundos da degradação local ocorrida ou das características do entorno atual, e que a superação dessas barreiras é um dos passos críticos para a construção de um projeto exeqüível e adequado ecológica, econômica e socialmente.

Trata-se, portanto, de intervir, mas sabendo-se como, quando e onde intervir para levantar as barreiras existentes e favorecer o eventual potencial de regeneração ainda remanescente, visando-se construir não uma floresta fugaz, que dure apenas 10 ou 15 anos, mas que se autoperpetue indefinidamente. Os trabalhos já realizados têm demonstrado que o adequado uso e combinação de um grande número de espécies arbóreas da flora regional, a rápida construção de uma fisionomia florestal e o manejo de processos ecológicos, como a competição, dispersão, etc, são ferramentas indispensáveis na obtenção de resultados efetivos, em restaurações que demandam plantios.

Todavia, em muitas situações, como em grande parte da costa brasileira, existem áreas atualmente degradadas, e paisagens no seu entorno, que mantêm ainda grande potencial de favorecer e ou acelerar a recuperação local. Nesses casos, processos ecológicos críticos ao desencadeamento da restauração daquela situação específica, como, por exemplo, a indução do banco de sementes de espécies arbustivo-arbóreas presentes no solo, devem ser identificados e favorecidos, de tal maneira que com pequenas intervenções, o potencial de regeneração identificado possa se realizar,   iniciando a recuperação com grande eficiência e baixo custo, podendo-se, inclusive, descartar a prescrição de plantios.

Se inicialmente buscavam-se práticas padronizadas, ocorreu já uma transição para a percepção de que o universo de históricos e situações de degradação varia amplamente e que cada caso necessita de soluções específicas, baseadas no conhecimento do processo natural de sucessão secundária e nos processos de dinâmica de comunidades florestais, aos quais se somam as melhores práticas agronômicas e ou silviculturais, que se fizerem necessárias.

Os muitos projetos que fracassaram em reconstituir florestas deixaram claros seus ensinamentos: projetos mal elaborados prenunciam fracassos previsíveis; projetos bem formulados, com execução e condução displicentes, convertem-se em grande perda de tempo e recursos, criando situações comumente observadas, nas quais após se obter a formação de uma capoeira, que persiste por cerca de dez anos, essa sofre uma regressão, transformando-se num pasto esparsamente arborizado, que impede novas intervenções mecanizadas, jogando os custos a patamares proibitivos.

Caracterizar corretamente os fatores de degradação existentes e os impedimentos que eles produziram na área degradada, caracterizar a capacidade do substrato em permitir o desenvolvimento de espécies arbustivo-arbóreas, avaliar o potencial de regeneração da área degradada e de seu entorno, utilizar uma grande diversidade de espécies arbustivo-arbóreas da flora regional, quando forem necessários plantios, não se constituem numa sofisticação fútil, antes previnem fracassos, reduzem custos, aumentam as probabilidades de sucesso e evitam desperdício de tempo e esforços.

Consideradas essas e algumas outras poucas questões, a condução do processo de restauração pode variar ainda de acordo com os processos ecológicos que o executor pretenda privilegiar e a escala de tempo em que os resultados devam ser obtidos, questões de ordem pessoal. De um único método antes disponível, o plantio hoje, de mais de 15 diferentes alternativas, já estão disponíveis na caixa de ferramentas do “restaurador”. Conhecê-las e combiná-las adequadamente, representa uma significativa vantagem à disposição dessa geração.