Especialista em Melhoria de Processos da International Paper
Op-CP-29
Você, que lê este artigo, já teve a curiosidade de atentar para como é a base que o suporta, o papel? Pegue o canto da folha entre os dedos e, deslizando-os, perceba sua “lisura”. Toque-o com a ponta da língua e sinta sua “colagem” através da sensação de aderência. Observe uma área não impressa contra a luz e ateste sua “opacidade” Em uma área impressa, teste o show through (“mostrar através”) tentando ver, através da folha, a impressão do lado oposto.
Examine sua “rigidez” balançando ao ar uma página e ouvindo o som carteado. Veja a “brancura” e pense como deveria ser sua “permanência” no tempo. Olhe para a qualidade da impressão e notará efeitos de outras propriedades, tais como “porosidade, absorção, tonalidade, formação”...
Na origem de tudo, está a fibra de celulose, compondo cerca de 80% da estrutura do papel e obtida da madeira de florestas plantadas que, após tratamentos mecânicos e químicos, conferem a essa base as características que a consagram como a mídia por excelência.
Avanços tecnológicos na fabricação de celulose e papel não são revolucionários, nem caminham com tanta rapidez quanto nas áreas de eletrônica, informação e bioquímica. Continuamos fazendo celulose com os mesmos processos de redução a cavacos, cozimento ou refino, lavagem branqueamento e recuperação química, típicos de quarenta anos atrás. E parece, a julgar pelas recentes solicitações de licenças ambientais, não mudará até 2018.
Evoluções marcantes podem ser contadas nos dedos: colagem alcalina permitindo uso de cargas minerais e aditivos sintéticos com melhoria de qualidade do papel; uso de dióxido de cloro, oxigênio, ozônio e peróxido em substituição ao cloro reduziu impactos ambientais e trouxe melhoria de rendimento e de resistência das fibras; equipamentos de maior confiabilidade permitiram aumentar velocidades e produções, mas passaram a exigir menor variabilidade dos insumos.
Em boa parte, essa redução de variabilidade vem sendo atendida pela simultânea evolução tecnológica florestal que, recordando, passou da exploração nativa a plantio por sementes; propagação por sementes e estaquias de indivíduos superiores; desenvolvimento de plantios clonais e, em curso, modificações genéticas, visando adequar composições químicas e morfologia de fibras.
O desafio, contudo, é produzir mais com menos e de forma sustentável; não gerar resíduos ou emissões; antever e prover as necessidades do mercado à medida que eles também evoluem. Parece-me ser imprescindível mudar a madeira e o modo como ela é processada, pois, talvez, tenhamos que produzir papel de 30g/m² com a mesma funcionalidade de um atual 75g/m².
Como será a fibra para esse produto? Utilizávamos, até 1975, eucalipto de várias espécies obtido de plantações por sementes. A idade de corte variava de 7 a 12 anos, e produzíamos uma tonelada de celulose com 4,5m3 de madeira. Hoje, plantios clonais de híbridos selecionados com idade de corte de 6 anos e variabilidade reduzida de densidade rendem a mesma tonelada com apenas 3,3m3.
Aumentamos, certamente, a produtividade, mas continuamos enfrentando variações de desempenho na fabricação de papel, ocasionadas claramente por predominância ou falta de certos clones no abastecimento, já caracterizados como classes "A, B,C", e requerendo mixagem nos programas de corte. Evidência de que a variabilidade continua. Não produzimos ainda o protótipo sonhado.
Se perguntarmos ao fabricante de papel que especificação deve ter a fibra de celulose ideal, ele dirá: tem que ser resistente, fácil de refinar, permitir drenagem, dar corpo ao papel. Todas essas propriedades são trabalháveis por outros meios no próprio processo de fabricação, no entanto, quando uma máquina atinge o limite de atuação em uma delas, tenta-se, em princípio, contornar, preferindo-se determinados clones que “trabalham melhor”.
É evidente que essa prática não pode tornar-se permanente, pois não corrige uma deficiência localizada e pode gerar desvios na evolução do processo tecnológico florestal. Uma boa e contínua interação entre as áreas tecnológicas da fábrica e da floresta poderia gerar a definição do protótipo de fibra ideal? Uma vez definida tal fibra, seriam necessários de dez a vinte anos para se ter pronto um plantio comercial.
Vale perguntar se, nesse tempo, a ciência não terá evoluído a ponto de condenar ao limbo tal projeto. Será também por isso que, até hoje, os desenvolvimentos tecnológicos foram dirigidos quase exclusivamente focando a produtividade florestal, com os ganhos na fábrica vindo a tiracolo?