Professor de Botânica da UF de Santa Catarina
Op-CP-07
Os atuais níveis de degradação ambiental exigem um posicionamento, no sentido de diminuir seu ritmo e implementar processos de restauração. A maioria dos projetos de restauração ambiental baseiam-se num contexto mecanicista, agregando, em sua quase totalidade, o conceito capitalista de produtividade, primando pela introdução de espécies arbóreas e plantios em linhas, uniformizando a área a ser restaurada.
O laboratório de Ecologia da UFSC desenvolve um método, onde se prima por modelos de conservação da biodiversidade, para a conservação da biofuncionalidade e resgate de interações entre organismos, considerando as bases ecológicas que envolvem a heterogeneidade ambiental e a sucessão natural. Esta biofuncionalidade baseia-se no princípio da nucleação, onde elementos vivos, ou não, promovem uma abertura para “eventualidades” da regeneração e colonização natural dos seres vivos – os gatilhos ecológicos.
Técnicas nucleadoras:
Transposição de solo: Consiste na seleção de áreas próximas aos locais em restauração, de onde são retiradas pequenas amostras de solo, transpondo sementes, microorganismos e nutrientes para as áreas degradadas.
A transposição de 16m2 de solos de restinga promoveu a introdução de 472 plântulas, de 58 espécies, onde 45% são herbáceas, 22% arbóreas, 16% arbustivas e 5% lianas. A introdução de bracaatinga (Mimosa scabrella), através da transposição, aos dois anos de idade, fez com que os núcleos apresentassem 43 (±10,01) indivíduos, com altura média de 2,95(±1,1) m, com um raio de 2,22 (± 0,62) m de diâmetro de cobertura do solo, estando o estrato gramináceo, substituído por uma camada de serapilheira.
Poleiros artificiais: Esta técnica consiste na colocação deestruturas que imitam galhos secos e atuam como pontos de repouso, forrageamento e caça para aves. Através da colocação de lianas vivas, estas estruturas podem imitar árvores vivas, para atrair animais com comportamento distinto e que não utilizam os poleiros secos.
Dentro desse grupo, destacam-se os morcegos, que procuram locais de abrigo para completarem a alimentação dos frutos colhidos em árvores distantes. Aves frugívoras também são atraídas por poleiros vivos, quando estes fornecem fonte de alimento. Utilizam-se árvores exóticas em áreas de preservação, para sua transformação em poleiros, através do anelamento e sua posterior morte. A principal função destes poleiros é o papel de trampolim ecológico, trazendo animais e sementes de remanescentes próximos. No Cerrado e na Floresta Estacional Semidecidual, 27 e 35 espécies de aves utilizaram, respectivamente, os poleiros, sendo que mais de 50% destas eram dispersoras de sementes.
Abrigos para a fauna: Um dos requisitos básicos para a restauração é a presença, dentro de uma comunidade em formação, de abrigos para a fauna. Esta técnica consiste no acúmulo de galhos, tocos, resíduos florestais ou amontoados de pedras, dispostos em leiras, distribuídas na forma de núcleos ou aglomerados, ao longo da área a restaurar.
Introdução de mudas: A introdução de espécies, através do plantio de mudas, é uma forma efetiva de ampliar o processo de nucleação. Recomendamos a introdução de, no máximo, 300 mudas/ha, mas que caracterizem um núcleo da espécie, com significativa variabilidade genética, capaz de formar uma população mínima viável.
Isto garante, no futuro, que suas filhas possam nuclear a espécie na paisagem. Neste sentido, as espécies selecionadas devem apresentar potencialidade de interações a médio e longo prazo, deixando, para as outras técnicas, o suprimento das espécies mais pioneiras.
Módulos de restauração: Buscando aprimorar e tornar mais efetiva a restauração ecológica de áreas ciliares degradadas no Norte do estado de Santa Catarina, a Empresa MOBASA S/A adotou as técnicas nucleadoras e incentiva o desenvolvimento destas, através de convênio da UFSC.
Para cada uma das fazendas em restauração, é elaborado um diagnóstico ambiental, e a execução da restauração é executada através da implantação de módulos de restauração. O módulo é o conjunto de técnicas com área de 2.500m2, onde 5,92% desta área é destinada à implantação das técnicas: duas transposições de galharia (18m2), dois tipos de poleiros artificiais (30m2), um poleiro de pinus anelado (seco) e dois poleiros de torre de cipó (vivo), 20 transposições de solo (20m2), 16 grupos de 5 mudas (agrupamentos de mudas nativas, com funções nucleadoras - 80m2).
Estes módulos promovem eventualidades e imprevisibilidades, dando oportunidades para que os fluxos naturais encontrem espaço para se expressarem e ampliarem as possibilidades de se restabelecer uma série de processos e contextosdo sistema como um todo. A tendência é que, nos demais espaços (94%), seja estabelecida uma complexa rede de interações entre os organismos e uma variedade sucessional, as quais poderão convergir para múltiplos pontos de equilíbrio no espaço e no tempo, fruto da abertura da eventualidade.
Considerações finais: O processo de nucleação aqui proposto representa uma nova alternativa de restauração ambiental, que contrasta com os métodos normalmente utilizados, pelo fato de priorizar os processos naturais de sucessão.
Aparentemente mais lentos, mas que representam uma base para a formação de comunidades vegetacionais, que atuarão como novos núcleos funcionais, dentro da atual paisagem fragmentada. Estes núcleos vão atuar, dependendo de sua forma, tamanho e estrutura, como corredores ou como trampolins ecológicos, dentro de uma nova perspectiva de manejo ambiental das paisagens. Dentro destas perspectivas, a restauração ambiental de áreas degradadas não se restringe a uma ação pontual, mas se trata de uma ação que, futuramente, será um importante complemento no manejo ambiental da paisagem.