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Yeda Maria Malheiros de Oliveira

Pesquisadora da Embrapa Floresta

Op-CP-55

Que sejamos sábios desta vez
As florestas brasileiras desempenham um papel fundamentalmente importante, tanto para o desenvolvimento e conservação dos recursos nacionais quanto com relação à sua contribuição para o equilíbrio climático mundial. Ops! Só na frase acima, comum em citações e raramente refutada por especialistas, há uma gama de informações, definições e critérios – esses sim – questionados por representantes de diferentes vertentes do “sistema florestal nacional”. Notemos que a Revista Opiniões foi muito sábia ao usar um termo amplo, porque “setor florestal”, “área florestal” e outros termos podem representar apenas um segmento do espectro florestal, em ótica política ou ambiental. 
 
Assim, vejamos: se, para a definição de árvore, já temos um componente político (exclui plantas perenes frutíferas arbóreas?) ou biológico (exclui palmeiras e bambus?), que influi fortemente no escopo do “ambiente” florestal, o que diremos de uma floresta? Os conceitos para a definição de florestas, razões para seu enquadramento, sejam científicos, políticos ou filosóficos, merecem uma abordagem à parte.  Mas, e resumidamente, o que é uma floresta? O que é uma floresta plantada e o que são plantações florestais? 
 
A FAO (2018), em seu documento de orientação aos países para a elaboração de seus relatórios quinquenais do Forest Resource Assessment (no caso, FRA 2020), altera, em pouco, definições elaboradas e acordadas há décadas entre os países, não porque todos os indivíduos envolvidos concordem com as terminologias, mas porque há necessidade de se usar uma terminologia única, com a qual todos possam se referir às suas realidades reportando-as em conformidade.

Mas, por que iniciei minha contribuição por esses aspectos, relacionados ao “componente florestal na paisagem brasileira”? Porque tais aspectos representam e sumarizam parte da nossa cultura, entranhada de contradições, principalmente no que se refere às florestas nativas e florestas plantadas. Mais que isso, também no que se refere ao Manejo Florestal Sustentável (MFS), tão propalado aos quatro ventos, mas com atividades proibidas em parte do nosso país (Lei da Mata Atlântica: componente madeireiro versus componente não madeireiro).

O MFS, como um conceito dinâmico e evolutivo, tem como objetivo manter e reforçar os valores econômicos, sociais e ambientais de todos os tipos de florestas, em benefício das gerações presentes e futuras (Non legally binding Instrument on all types of Forests (Assembleia Geral das Nações Unidas, 2007).
 
Com esse texto, quiz reforçar que nosso “sistema florestal” sofreu as influências de seu tempo, envolvendo crenças, influências e negociações de momento. Desde o Instituto Nacional do Pinho, passando pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (saudoso IBDF) – esses no Ministério da Agricultura – ou Plano Nacional de Florestas (PNF), Secretaria de Biodiversidade e Florestas (SBF), culminando com a criação do Serviço Florestal Brasileiro (SFB), esses criados no âmbito do Ministério do Meio Ambiente...
 
enfim, ao longo do tempo, criou-se uma dicotomia e uma necessidade de separação do joio do trigo (e com diferentes conceitos sobre o que seria joio e o que seria trigo). Tal problemática ficava ainda mais exacerbada quando se entrava no conceito das florestas nativas (naturais?), destinadas à produção ou conservação. 
 
Muito bem: agora, estamos em uma nova era, a era da construção do NOVO Serviço Florestal Brasileiro, agora vinculado ao Ministério de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA).  Muito ainda vai ser discutido, com relação à sua organização ideal e o seu papel no que se refere às florestas brasileiras. Mas eu acho que temos tempo... levamos décadas separando o que só faz sentido unido, e agora existe uma real possibilidade de considerarmos a gestão florestal com um só foco: o do desenvolvimento sob o conceito do MFS. 
 
Todos, envolvidos com o componente florestal brasileiro, estamos ansiosos para participar, contribuir, enfim concretizar o sonho de termos um locus para “chamarmos de nosso”. Que isso seja construído no MAPA, com links muito claros e de fácil diálogo com as áreas florestais, que continuarão sendo gerenciadas pelo MMA (florestas em Unidades de Conservação, entre outras). Mas nunca nos esqueçamos de que grande parte de nossas florestas estão em mãos de empresas florestais e de prorietários rurais, sejam eles pequenos, médios ou grandes. 
 
É a eles que devemos parte das explicações sobre o imbróglio criado nas últimas décadas. Foram eles que sofreram para cumprir a legislação nacional, estadual e municipal, muitas vezes sem entender o porquê de determinadas proibições. Cá entre nós, parte dos responsáveis pela implementação de tais normas também teriam dificuldade em defender tantos “não” e tão poucos “sim”, quando se pensa que cada proprietário rural detém a posse da terra, mas não dos “bens intangíveis” necessários à sobrevivência humana. 
 
Mas a nova legislação florestal nacional (Lei 12.651/2012) trouxe o Cadastro Ambiental Rural (CAR), executado com êxito pelo SFB e os Programas de Regularização Ambiental (PRA), a serem executados em âmbito estadual. Está pavimentada a rota para o desenvolvimento rural brasileiro. Saímos da ótica apenas da propriedade (com seus aspectos relacionados a Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal, por exemplo), para uma ótica de paisagem, em que tais classes de legenda, em um mapa, podem e devem ser vistos pela ótica da paisagem rural.  Há espaço – e o espaço certo – para agricultura, pecuária, florestas nativas, florestas plantadas, florestas de produção, florestas de conservação, ambientes urbanos, etc. 
 
Que se formem pontes de interlocução e, importante, que passemos a ter um Sistema de Informações Florestais cada vez mais robusto e construído com informações primárias (aquelas obtidas pelo poder público, por meio de instrumentos como o Inventário Florestal Nacional – IFN, por exemplo). Muito das nossas convicções e até parte de nossa legislação são baseados nos conhecimentos históricos e informações locais ou regionais sobre um determinado aspecto.

As informações secundárias (aquelas obtidas por outras fontes ou derivadas de informações primárias oficiais) são também bem-vindas, mas como complementação a um sistema oficial reconhecidamente confiável. Só assim poderemos reanalisar normas, critérios e decisões, adotados em nível nacional, que – eventualmente – precisam ser revisitadas. 
 
Também aqui expresso minha convicção de que, sem informação de boa qualidade, discutida e compartilhada entre os mais diversos interlocutores do “sistema florestal”, não teremos desenvolvimento. Temos que ter acesso ao que está sendo desenvolvido no mundo, seja tecnologia de ponta ou ideias criativas para a solução de velhos problemas. Mais que termos apenas acesso a tais informações pela internet, podemos conhecer seus autores, seus desenvolvedores ou apoiadores.

Tal oportunidade acontecerá de 29 de setembro a 5 de outubro, no Centro de Convenções Expo Unimed, em Curitiba-PR. Trata-se do XXV Congresso Mundial da IUFRO (União Internacional de Instituições de Pesquisa Florestal). O IUFRO 2019 está sendo organizado pelo Serviço Florestal Brasileiro e pela Embrapa, em parceria com universidades nacionais e instituições públicas e privadas. Trata-se da primeira vez que teremos um evento desse porte na América Latina, já contando com mais de 4.000 resumos submetidos, oriundos de 114 países.  
 
Somos a bola da vez e temos a oportunidade de apoiar a criação de estruturas fortes, sem o viés de visões ideológicas ou político-partidárias. Temos os instrumentos, “clima favorável” (em todos os sentidos...) e pessoal altamente gabaritado para contribuir para esse novo momento florestal brasileiro. Que sejamos sábios desta vez.