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Eduardo de Souza Martins

Diretor da E.labore Assessoria Estratégica em Meio Ambiente

Op-CP-12

Por uma agenda sociambiental para o agronegócio

Nunca o agronegócio brasileiro enfrentou um desafio tão complexo e importante na conjugação da busca por competitividade e desempenho socioambiental. A globalização impõe não só custos competitivos, mas também processos produtivos capazes de atender a requerimentos ambientais e trabalhistas verificáveis.

Ao mesmo tempo em que ocorre o aumento da demanda por produtos agrícolas no Brasil e no mundo, nossas commodities sofrem questionamentos socioambientais crescentes. A dificuldade de adequação para a nova realidade é imensa, sobretudo nas condições brasileiras, onde convivem, e muitas vezes integram-se, realidades díspares, em geral determinadas por diferenças regionais e de setores produtivos.

O desafio pode ser anunciado, utilizando o difundido conceito de sustentabilidade: Que sentido e como o agronegócio irá tratar os limites ambientais? Qual é a capacidade do setor de promover e compartilhar prosperidade? Que paisagem a agricultura no Brasil vai deixar de legado para as próximas gerações?  O tema da sustentabilidade cresceu nos últimos vinte anos, mas veio para fincar raízes e alterar o funcionamento da vida moderna.

Mesmo que o conceito, muitas vezes, seja controverso e utilizado em função das conveniências das partes envolvidas, parece inevitável lidar com os limites do uso de recursos e os comprometimentos dos bens comuns, em escalas nacional e mundial, como os recursos hídricos e a concentração de gases de efeito estufa na atmosfera.

Diante da possibilidade de crises e a necessidade de controle, o conceito de sustentabilidade, que, no início, funcionou como formulação política, facilitando entendimentos da diplomacia internacional, hoje se torna operacional, por vários caminhos. Os mecanismos de controle e comando criaram os licenciamentos e autorizações, os instrumentos econômicos e de mercado vão desde exigência de avaliações independentes, até classificações diferenciadas por índices, nos principais mercados de ações do mundo.

Para a área agrícola, o tema expressa-se de forma diversa, por exemplo, a produção orgânica, que antes era tratada com desprezo no Ministério da Agricultura, hoje dispõe de estrutura institucional dedicada, está regulamentado, mobiliza uma economia importante e crescente e seus produtos podem ser encontrados na maioria dos supermercados do país.

Mas, o conjunto dos temas que somam o ambiental e a produção rural está longe de solução satisfatória. Dispomos de uma capacidade competitiva nos agronegócios, difícil de ser superada, sobretudo se diminuirmos internamente nossa dependência por insumos, melhorarmos a logística de transportes e continuarmos investindo em tecnologia.

No entanto, estas vantagens, sempre destacadas e comemoradas, são ofuscadas, quando entra em cena a agenda socioambiental. O alcance do agronegócio sinaliza ainda para um papel estratégico, sobretudo se considerarmos sua importância na pauta de exportações, na contribuição para o PIB e no processo de integração produtiva de novos espaços econômicos do país.

Porém, as dimensões econômica e estratégica não são suficientes para alterar a contradição com a agenda socioambiental. As explicações podem ser várias, mas uma deve ser considerada com atenção: o ambientalismo brasileiro, diferente dos países desenvolvidos, tem origem e prosperou no contexto urbano e pouco criou relação com o mundo rural.

Não tivemos chance de construir uma matriz de entendimento dos problemas ambientais, a partir da perspectiva do campo, como aconteceu na Europa, no início da industrialização. Somente uma divisão como esta pode explicar nossa incapacidade de gerar entendimentos entre ruralistas e ambientalistas, em temas tão óbvios – por exemplo, em quase todos os biomas do país, os ruralistas são os maiores detentores dos remanescentes de áreas naturais, mesmo assim são raros os esforços conjuntos entre aqueles que querem preservar e os que esperam algum retorno pela preservação.

Na realidade temos, como sociedade, uma profunda dificuldade recíproca de entender e fazer entender as razões e possibilidades dos ambientalistas e ruralistas. O processo tem se agravado nos últimos tempos, com as freqüentes derrotas do setor ruralista, nas tentativas de reverter normas no Congresso Nacional, consideradas como conquista dos ambientalistas.

E também com a criminalização dos ruralistas, como os responsáveis pelo desmatamento da Amazônia e com as disputas pela liberação dos transgênicos. Os ruralistas reclamam, em alguns casos com razão, que as normas ambientais carecem de razoabilidade. Não podia ser diferente se, por exemplo, olharmos para o vai-e-vem das disputas para a mudança e revisão do Código Florestal.

Como resultado das normas sem referência de realidade, da incapacidade de convergência política e da impossibilidade do controle pelo Poder Público, o agronegócio é um dos setores de menor aderência ao arcabouço legal ambiental brasileiro. Para a reversão da situação, a primeira providência é assumirmos que a continuidade do cenário, de amplos conflitos entre ambientalistas e ruralistas, não é interessante para a sociedade brasileira.

Enfraquece um dos setores mais competitivos que dispomos. Depois, é relevante descobrir que somos capazes de construir soluções, que são favoráveis para os dois lados. Sobram exemplos que demonstram a possibilidade, como no caso do plantio direto ou da defesa da moratória do desmatamento da Amazônia, por parte da cadeia da soja.

Por fim, é necessário construir uma Agenda Socioambiental do Agronegócio e sinalizar, de forma clara, o sentido que daremos ao futuro da nossa produção agrícola – o Brasil é um dos poucos países que pode oferecer uma contribuição civilizatória, capaz de conciliar produção rural, desenvolvimento e manutenção da integridade ambiental.