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Mário Ferreira

Consultor Internacional em Silvicultura

Op-CP-03

Melhoramento genético dos eucaliptos

A indústria de produção de pasta celulósica e papel da madeira de Eucalyptus spp é a mais avançada do mundo e o Brasil é o maior produtor mundial. Como chegamos lá? Importamos os conhecimentos embalados em caixas pretas? Ou será que estamos diante dos frutos do colonialismo (ou imperialismo) imposto pelas nações mais desenvolvidas?

Nossa história começa em 1903, quando a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, necessitando atender ao consumo de 600.000 m³/ano de lenha e 1.000.000 de dormentes/ano, contrata, em 1904, Edmundo Navarro de Andrade, para organizar seus Serviços Florestais. Navarro de Andrade inicia seus trabalhos, investigando a cultura de 60 essências indígenas e 35 exóticas.

Em função deste estudo, decide optar pelos Eucalyptus spp. Em 1908, embarca para a Europa a fim de estudar a organização dos Serviços Florestais de Portugal, Espanha e Franca. Em 1909, inicia o plantio de 21 milhões de árvores. Navarro de Andrade não foi o introdutor dos eucaliptos no Brasil, pois, em 1906, Loefgren afirmava: “Já há alguns anos, o Instituto Agronômico de Campinas estava autorizado a distribuir ao público árvores, no intuito de experimentá-las em diversas zonas do Estado”... Dessa maneira, o IAC introduziu em São Paulo, pelo menos, 55 espécies de eucaliptos.

Em 1911, tendo como base os resultados obtidos pelos Serviços Florestais da Cia. Paulista, o Governo de São Paulo cria o Serviço Florestal do Estado, e indica Navarro de Andrade para ser seu Superintendente. Em função desse pequeno histórico, pode-se concluir que a Cultura dos Eucaliptos foi introduzida para suprir a demanda por madeira não atendida pela vegetação natural, já tão degradada pelos ciclos do café e da cana, e pelas carências energéticas, oriundas da primeira grande guerra.

Em 1925, Navarro de Andrade vai aos Estados Unidos e leva consigo amostras de madeira de Eucalyptus saligna e E.tereticornis (aos 15 anos de idade), para estudar o possível aproveitamento das espécies na produção de polpa e papel. É o início da indústria brasileira de celulose e papel de fibra curta, aqui representada pela Cia. Suzano.

Em 01 de Dezembro de 1941, faleceu Navarro de Andrade. No mesmo ano, a Cia, contando com a colaboração do Eng. Agr. Carlos Arnaldo Krug, do IAC de Campinas, estabeleceu o Programa de Melhoramento Genético do Eucalipto, pioneiro mundialmente. Após o falecimento de Navarro, Armando Navarro Sampaio deu continuidade aos trabalhos, contando com a colaboração efetiva de Rubens Foot Guimarães e de Asdrúbal Silveira Alves.

Para melhor entendimento, o Melhoramento Genético era caracterizado pela seleção de árvores superiores e suas descendências. As sementes superiores, produzidas nos Hortos da Cia, eram básicas para todos os programas de plantios da época, e a elas eram associadas novas técnicas de manejo. A associação de métodos de seleção e novas práticas de manejo permitiram atingir rendimentos, variando de 18 a 30 m³/ha/ano.

Em 1960, com a estatização das empresas ferroviárias, seus Serviços Florestais e suas pesquisas foram desativados. Em 1966, com o advento da Lei dos Incentivos Fiscais para o florestamento e reflorestamento, havia necessidade de estudos mais detalhados, pois, pela lei, novas áreas ecológicas, não tradicionais aos plantios com espécies exóticas, eram prioritárias ao programa.

Em São Paulo, existiam 600 a 700 mil hectares plantados com E.saligna (60%), E.urophylla = “E.alba” de Rio Claro (30%) e outras espécies (10%). As sementes mais procuradas eram as da Cia Paulista, mas não atendiam à demanda para um plantio de 400 mil ha/ano. Em 1968, um grupo de empresas, visando atender suas necessidades de sementes e de novos materiais genéticos, estabelece convênio específico com a Universidade de São Paulo, através da Escola Superior de Agricultura Luís de Queiroz, criando o Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais, Ipef.

A mais importante ação do Ipef, em 1970, foi dar suporte à importação de sementes australianas de E.grandis, de procedência ecologicamente semelhantes às áreas de plantio no Brasil. Surge, dessa maneira, E.grandis (Coff’s Harbour, NSW). Os novos plantios oriundos das sementes importadas, utilizando técnicas modernas de preparo do solo, tais como adubação, tratos culturais e combate às pragas elevaram os rendimentos para 30 m³/ha/ano.

Para poder determinar quais as espécies e procedências mais adequadas, o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal - hoje Ibama, juntamente com a FAO (Prodepef), Embrapa e empresas florestais, intensificam as coletas de sementes nas zonas de ocorrência natural dos eucaliptos. Nos plantios que utilizavam as sementes da Cia. Paulista, intensificou-se a seleção de árvores superiores, resistentes ao cancro dos eucaliptos. Constatou-se que, em sua maioria, essas árvores eram híbridas, não adequadas à produção de sementes. A partir de 1976, os estudos da propagação vegetativa dessas árvores passam a ser prioritários.

Em 1979, os primeiros plantios clonais foram instalados.  Inicia-se a silvicultura intensiva clonal brasileira. Os rendimentos que haviam atingido os patamares de 30 a 40 m³/ha/ano, iriam atingir 45 a 50 m³/ha/ano. O consumo específico de madeira para a produção de 1 tonelada de polpa era de 4,2 m³. Esperava-se, através da seleção de clones de alto rendimento em celulose, baixar o consumo específico para 3,7 toneladas.

Hoje, a silvicultura intensiva brasileira é modelo para muitos países em desenvolvimento e, por que não, desenvolvidos. O programa de melhoramento genético, que era totalmente voltado para a produção de sementes superiores, hoje cede lugar à seleção clonal, e já se pensa ativamente em transgênicos. Como participante ativo de todas essas etapas, pergunto:

 

  • Qual será o tipo de arvore do futuro?...Especializada para um só produto industrial?
  • Quantas áreas e solos marginais irão existir para o plantio com árvores exóticas?
  • Como será mantida a produtividade dos novos plantios?
  • A manutenção da variabilidade genética das populações de árvores, como será mantida?
  • Toda seleção intensiva, sem futuras recombinações, poderá conduzir o programa clonal a um beco sem saída.