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César Augusto Valencise Bonine

Gerente Executivo de P&D da Suzano

OpCP63

Forests, genolyptus e eucagen: sinergia da genômica florestal
A palavra “sinergia”, de origem grega (synergia, syn = "união" e -ergía = "unidade de trabalho"), é muito empregada na biologia para definir processos fisiológicos na associação de dois ou mais órgãos, sistemas ou elementos anatômicos, cujo resultado seja a execução de um movimento ou a realização de uma função orgânica; mas também na farmacologia, em especial na combinação de dois ou mais medicamentos, com resultado esperado superior a cada um dos componentes, separadamente.

Também na área de negócios, o emprego desse conceito acontece quando uma equipe une forças e competências para trabalhar em grupo na resolução de uma questão em comum. Assim, podemos dizer que sinergia é o ”esforço coletivo e solidário que busca um melhor resultado do que aqueles obtidos individualmente”, ou ”a busca de objetivos comuns através da união simultânea dos membros de um grupo”.
 
Não por coincidência, trazer esse tema para a discussão neste momento, em que vemos um esforço do mundo em buscar soluções para a pandemia do SARS-CoV-2, com união de esforços entre concorrentes no setor de fármacos, por exemplo, é reforçado pela comemoração, no segundo semestre, dos 20 anos de uma das mais inovadoras e sinérgicas iniciativas científicas do setor florestal brasileiro até então, que foi a inserção definitiva do eucalipto na era genômica.

Em novembro de 2001, era lançado pela Fapesp – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo −, com a participação de quatro empresas florestais paulistas – Duratex, Ripasa, Suzano Papel e Celulose  e Votorantim Celulose e Papel –, em conjunto com três das principais universidades públicas paulistas, Universidade de São Paulo (Esalq), Universidade de Campinas (Unicamp) e Universidade Estadual Paulista (Unesp-Botucatu), o projeto FORESTs: Eucalyptus Genome Sequencing Project Consortium. 
 
A proposta de sequenciamento de parte do genoma do eucalipto ia na carona de três bem-sucedidas iniciativas lideradas pela Rede Organização para Sequenciamento e Análise de Nucleotídeos – ONSA (da sigla em inglês), instituto virtual de genômica que reuniu, inicialmente, 30 laboratórios de instituições de pesquisa do estado de São Paulo, financiados pela mesma Fapesp. 
 
O mundo, naquela época, estava na fase final da corrida para o sequenciamento completo do genoma humano, e a Rede ONSA já tinha entregue os genomas da Xylella fastidiosa (bactéria causadora do amarelinho dos citros), o genoma da cana-de-açúcar e o genoma humano do câncer. Assim, as quatro empresas privadas participavam desse projeto com o objetivo de melhorar a matéria-prima utilizada na produção de papel, celulose e chapas de madeira. 

Muito mais que apenas o aporte financeiro, o que se viu nas discussões entre os pesquisadores das universidades e das empresas privadas foi um enorme esforço para a construção de um projeto em que fossem aportadas informações sobre os melhores materiais genéticos de cada empresa, as melhores técnicas de coleta de informações genômicas, as melhores técnicas de sequenciamento e, principalmente, de bioinformática, para montagem das informações produzidas. Foi um trabalho exaustivo e que não teria êxito se não fosse o esforço conjunto e sinérgico de todos os envolvidos.

Em paralelo, aproveitando o momento oportuno da Era Genômica, outra iniciativa, complementar ao Projeto FORESTs e de âmbito nacional, surgiu no início do ano seguinte, em 2002. Novamente, num esforço sinérgico incrível, nascia o Projeto Genolyptus. Vinte e três instituições, entre universidades, instituições de pesquisa e empresas privadas, lideradas pela brilhante mente do Dr. Dario Grattapaglia, se uniram para desenhar um projeto tão ou mais auspicioso que o FORESTs. 

Além da proposta de sequenciar partes do genoma de espécies de eucaliptos, o Projeto Genolyptus se propôs a gerar novos híbridos, jamais produzidos pelo homem, montando o que foi, à época, o “maior experimento florestal do mundo”, segundo o  Jornal da Unicamp, em novembro de 2002.

O projeto Genolyptus recebeu o nome de ”Rede Genolyptus”, dada sua amplitude e complexidade, e contou com a participação de treze empresas florestais - Aracruz, Bahia Sul, Celmar, Cenibra, International Paper, Jari, Klabin/Riocell, Veracel, Lwarcel, Votorantim Celulose e Papel, Rigesa, Zanini Florestal e Instituto Raiz - Portugal. Da academia, fizeram parte oito das principais instituições de ensino e pesquisa do Brasil - Universidade Católica de Brasília, Universidade Estadual de Campinas, Universidade Estadual de Santa Cruz, Universidade Federal de Goiás, Embrapa, Universidade Federal de Lavras, Universidade Federal de Viçosa e Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
 
O projeto contou com coordenação de pesquisadores das empresas e das universidades, gerando uma rede de experimentos que foi instalada de Norte a Sul do Brasil e que ainda hoje é referência para a seleção de árvores superiores ou para novos estudos genéticos. Os pesquisadores sequenciaram trechos de genes de eucalipto, organizando um dos maiores bancos de genes de uma árvore. 

Durante a condução do projeto, os participantes se reuniam periodicamente para discutir os detalhes do andamento do projeto. Eram ricos momentos de compartilhamento de conhecimento, realinhamento de ações, prestação de contas, visitas a laboratórios e experimentos de campo, enfim, momento de todos os participantes ”elevarem a barra” de um novo e promissor conhecimento, literalmente ao nível do DNA.

Como complemento das duas iniciativas brasileiras de estudo do genoma do eucalipto, em julho de 2007, o Departamento de Energia
dos Estados Unidos (DOE) anunciou a aprovação da proposta da rede internacional Eucagen (Eucalyptus Genome Network), liderada por três países, entre eles o Brasil, para o sequenciamento completo do genoma do eucalipto. Era a primeira árvore de interesse
comercial a ter seu genoma completamente sequenciado. 
 
A árvore escolhida para ter seu genoma totalmente conhecido foi um exemplar de Eucalyptus grandis, genuinamente brasileiro até no nome, o BRASUZ1, produzido pela Suzano Papel e Celulose. O estudo analisou o genoma de 640 milhões de pares de bases de nucleotídeos do eucalipto e contou com a participação de mais de 80 cientistas de 30 instituições espalhadas pelo mundo.
 
E os frutos dessas três iniciativas – Projeto FORESTs, Rede Genolyptus e Eucagen – não ficaram restritos a gerar conhecimentos científicos. A grande maioria dos pesquisadores em melhoramento genético das empresas florestais brasileiras atualmente, vários professores das principais universidades do País e alguns executivos das empresas florestais tiveram participação nesses projetos.
 
Um conceito que parecia impossível, de concorrentes compartilharem conhecimentos, recursos financeiros, estruturas de laboratório e campo e, principalmente, materiais genéticos superiores, teve êxito, gerou frutos e só foi possível com lideranças engajadas e espírito de trabalho em equipe. Sinergia colocada em prática.