Hughes Robert de Lamennais, filósofo, escritor e político francês que morreu em 1854, escreveu uma frase que cabe bem aos nossos tempos e à temática deste artigo: “Se é possível acabar com o passado por meio do esquecimento, não se acaba o futuro por meio da imprevidência”. O Brasil se encontra num estágio depressivo em função da conjuntura atual, assim, tratar o futuro com otimismo ou pessimismo não vem ao caso, mas persistir em uma direção exaustivamente estudada terá mais chance de sucesso e previdência.
As vantagens comparativas de suas florestas plantadas podem ter levado o Brasil a uma zona de conforto, e isso tornou países concorrentes mais competitivos e próximos. Diversos especialistas, em distintos fóruns, previam a diminuição dessa distância, e as virtudes do segmento não seriam suficientes para manter a competitividade. Entre outras evidências, a ausência ou descontinuidade de políticas governamentais adequadas, agravadas pelo hiato de décadas do lócus institucional do Setor de Florestas Plantadas no Ministério do Meio Ambiente, que não ofereceu políticas adequadas a uma atividade produtiva, sustentável e de longo prazo.
Um bom exemplo é a experiência do segmento de florestas de pínus, que sofre hoje uma estagnação em sua área plantada. O legado de 50 anos de silvicultura, pós incentivos fiscais e a formação de extensas áreas de florestas de pínus no Sul e Sudeste do Brasil, trouxe consigo o surgimento de uma próspera indústria de papel e celulose e a mudança bem-sucedida da matéria-prima da indústria madeireira extrativista baseada na araucária.
Essa indústria madeireira foi responsável por uma imensa transformação empresarial, desde o manejo das florestas até a formação de mão de obra especializada. Contudo, para não “acabar com o passado por meio do esquecimento”, sugere-se um olhar mais atento para as décadas de 1980 e 1990, marcadas pela enorme sobreoferta de madeira de pínus. Os produtos do manejo florestal não tinham preço, comprava-se madeira a US$ 1.00 a tonelada, e a rentabilidade do negócio era inexistente, o desestímulo era geral.
No final da década de 1990 e boa parte da década passada, assistiu-se a uma verdadeira e positiva revolução. Uma indústria madeireira renovada e emergente, com capacidade de agregar valor ao produto, com domínio e posicionamento no mercado externo, registrou taxas crescentes de demanda por madeira muito acima da oferta sustentável; surgiu aí a expressão “apagão florestal”. Foi o primeiro ciclo, em décadas de atividade, em que a produção pulverizou-se, as florestas de pínus passaram a ser uma opção de investimento para as pessoas físicas que viam nesse ativo uma forma de garantir uma aposentadoria.
Fundos de investimentos internacionais e nacionais procuravam ativos, atraídos pela rentabilidade viabilizada por uma rede de consumidores pulverizados e capazes de agregar valor à madeira. O setor experimentou o tão almejado estágio de percepção do ganha-ganha pelas partes interessadas, esvaziamento de pressões sociais mais agudas e relações mais saudáveis com as comunidades. Mario Henrique Simonsen dizia que, “se a inflação aleija, o câmbio mata”, e, nos últimos dez anos, volumes expressivos de produção dessa então próspera indústria deixaram de ser exportados majoritariamente pelo efeito cambial.
Novamente o setor atravessa um período de sobreoferta em algumas classificações de madeira; as jovens florestas cresceram e não encontram mercado e preços para remunerar seus investimentos, e, com isso, pequenos investidores estão saindo do mercado, desestimulados pelo alto preço da terra e baixos preços de venda. “Não se pode acabar o futuro por meio da imprevidência”; já se sabe pelo passado recente que a tendência será a falta de madeira na próxima década se as condições não mudarem, e esse é um claro e preocupante indicador de perda de competividade no futuro próximo.
Algumas regiões experimentam um período expansionista e promissor, como é o caso de Mato Grosso do Sul, contudo, sem esquecer décadas passadas, a região teve extensas áreas plantadas sem aproveitamento industrial. Dizia-se, na época, “formem-se as florestas que as indústrias virão”. Ato contínuo, essa visão foi derrubada pelo redirecionamento da política governamental da época. Em contrapartida, Minas Gerais atravessa também uma sobreoferta de madeira pelo enfraquecimento da demanda da indústria siderúrgica, repetindo o ciclo na década de 1990.
Os ciclos econômicos sempre existirão, a defasagem em atividades de longo prazo tem explicação na teoria econômica e não é exclusividade do setor, várias commodities, como minério, carvão mineral, aço entre outros, estão atravessando um severo período de ajustes. Especialistas não se arvoram prever quanto tempo grandes potências continuarão a influenciar o comportamento das commodities, nem prever a rentabilidade atual no início da cadeia e nível de suporte ao longo do tempo.
De certo, a boa notícia é que existe um mercado com potencial de crescimento a médio e longo prazo para todas as cadeias produtivas de florestas plantadas, apesar de todas as suas dificuldades agregadas. O traço cultural do Brasil preza pelo direcionamento do governo, e o setor não deixará de ser reativo às demandas dos governos em todas as esferas, contudo a tendência é que os estímulos governamentais continuem tímidos na construção de um plano estruturado de longo prazo. Não se fala em subsídios ou financiamento, mas inteligência programática para o setor.
O que há de novo: as associações de classe, agora mais profissionalizadas, compreendem a perda coletiva de competitividade e esforçam-se em construir uma agenda para mitigar as causas. A nova governança dos interesses do setor não se resume à presença construtiva e consistente no ambiente legislativo e executivo em todos os níveis, mas, por uma atuação mais holística, desde relacionamento com outras associações, ONG´s, academia e setores produtivos que apoiam as cadeias do segmento.
A jornada da competitividade passará pela revisão dos processos dentro das empresas, pela liderança de uma agenda envolvendo todos os segmentos de florestas plantadas e persistência em retirar os pontos que obstruem esse desenvolvimento. Com esses esforços, espera-se cobrir as lacunas da falta de proatividade e visão de futuro e assim dar a oportunidade da “realidade de médio e longo prazos para a floresta plantada no Brasil”; “não acabar com o futuro por meio da imprevidência”, mas um exercício de sobrevivência e de previdência.