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Alexandre de Vicente Ferraz

Coordenador executivo do PTSM – Programa Cooperativo sobre Silvicultura e Manejo do IPEF

Op-CP-57

Evolução do preparo de solo em plantações florestais
Nos primórdios da humanidade, o solo era visto apenas como algo abaixo da superfície da Terra, que fornecia suporte para movimentação e habitação. Após séculos de avanço científico, o solo passou a ser definido de acordo com a área de interesse. Para a engenharia civil, o solo é todo o material da crosta terrestre que não oferece resistência à escavação mecânica; por outro lado, para a edafologia, o solo é uma massa natural capaz de suportar a vida na superfície da Terra, tal como as plantas.
 
No segmento florestal, a principal função do preparo de solo é reduzir o seu adensamento (fenômeno natural) ou compactação (ação antrópica), diminuindo sua resistência mecânica à penetração das raízes finas e grossas das árvores, além de elevar o volume de poros do solo e sua capacidade de armazenamento de água.  O revolvimento do solo na linha ou cova de plantio possibilita o rápido crescimento radicular e, consequentemente, um maior aproveitamento da água e nutrientes adjacentes ao torrão das mudas após o seu plantio e fertilização.
 
Há cerca de 70 anos, o preparo de solo seguiu os mesmos moldes aplicados à agricultura convencional, com uso de grades (leves ou pesadas) e arados de disco em área total. Nessa época, por exemplo, os resíduos florestais oriundos da colheita da madeira eram enleirados e queimados para a limpeza da área, expondo o solo ao risco de erosão. 
 
Com o advento do cultivo mínimo (anos 1990), o preparo do solo ficou restrito às linhas de plantio, e os resíduos florestais (ex. folhas, galhos e casca oriundos da colheita e serapilheira) passaram a ser mantidos sobre a superfície do solo. Consequentemente, passou a ser um desafio realizar o preparo do solo perante um terreno repleto de obstáculos (ex. tocos e resíduos florestais), o que reduziu o rendimento operacional e, de certa maneira, comprometeu a homogeneidade e a qualidade das operações florestais (ex. variação elevada da profundidade de estrondamento do solo e distribuição de fertilizantes durante a subsolagem). 
 
Apesar dessas dificuldades, o cultivo mínimo revolucionou a silvicultura brasileira e tem sido fundamental para a sustentabilidade do negócio florestal, principalmente por atenuar significativamente os processos erosivos e permitir maior armazenamento de água no solo; diminuir a perda de nutrientes do ecossistema, gerando redução dos custos com fertilização; além de auxiliar no controle de plantas daninhas. Por proteger o solo da erosão e da compactação, a manutenção dos resíduos florestais no sítio de cultivo permitiu também o realinhamento dos sulcos de plantio no sentido do declive e reduziu  a necessidade de preparo intensivo do solo. Isso propiciou maior aproveitamento do terreno e aumento dos rendimentos operacionais, sobretudo nas regiões com relevo acidentado
 
Atualmente, os implementos mais usados em áreas com cultivo mínimo são os subsoladores, cuja haste pode variar em tamanho (30 a 120 cm de comprimento), forma de ação (positiva ou negativa) e ângulo de “ataque”; além das coveadoras duplas para áreas declivosas ou com obstáculos físicos em excesso (ex. tocos de grande dimensão ou elevada massa de resíduos). Por meio de pesquisas, algumas empresas buscaram, nos Estados Unidos, equipamentos mais robustos para enfrentar um problema que se tornou comum com o acúmulo de rotações de cultivo, ou seja, a presença de uma maior quantidade de tocos e resíduos lenhosos sobre a superfície do solo. 
 
Conhecido por alguns como “preparo de solo especializado”, o uso de sistemas de georreferenciamento (ex. Real Time Kinematic - RTK) e do subsolador florestal Savannah ou similar, com lâmina V-Shear e trator de esteira (ex. D6 ou D8), permitiu o preparo e o realinhamento das linhas de plantio em áreas dominadas por tocos de 3ª ou 4ª rotação, além de aproveitar áreas anteriormente subutilizadas (ex. “linhas mortas” de plantio) e aumentar o tamanho dos talhões, elevando os rendimentos operacionais dos tratos silviculturais subsequentes (ex. fertilização e irrigação).

Para áreas declivosas e solos friáveis (ex. textura arenosa), alguns equipamentos recém-desenvolvidos são capazes de preparar minimamente o solo, como a coveadora Rotree, que também efetua a fertilização de base e a aplicação de herbicida pré-emergente em uma única operação. 
 
Para que o preparo de solo atinja qualidade satisfatória, há uma série de condições edafoclimáticas oportunas no momento da subsolagem, tal como o teor de umidade do solo (fruto da interação entre o regime pluviométrico e o teor de argila). Em regiões com solos coesos, por exemplo, o momento destinado à subsolagem é normalmente limitado a uma fração do ano, quando o período chuvoso se inicia.

Por isso, para adequar-se ao planejamento e logística operacional (ex. frente de colheita e disponibilidade local de máquinas), algumas empresas têm optado por realizar o preparo de solo antes da colheita. Apesar do trânsito de máquinas durante a extração da madeira, a subsolagem pré-colheita tem proporcionado resultados surpreendentes quando bem planejada e com os devidos cuidados (ex. tráfego das máquinas bem definido, afim de evitar a compactação do solo), ampliando a janela de plantio.
 
Baseada em uma grande demanda energética, a extração de tocos e raízes grossas com implementos robustos tem sido frequentemente debatida nos fóruns florestais, principalmente ao considerar suas repercussões sobre a prática do cultivo mínimo, bem como os benefícios operacionais com a eliminação desses “obstáculos” e sua relação com os custos de reforma.

Vale destacar que o aproveitamento da biomassa florestal subterrânea para produção de energia pode ser interessante, considerando que aproximadamente 20% da biomassa seca da árvore encontra-se alocada no toco e em raízes grossas. Todavia há algumas questões a serem respondidas ainda, como: é possível utilizar esses equipamentos para extrair tocos e raízes de grandes dimensões (ex. oriundos de plantios mais velhos)? Essa prática será sustentável ao longo do tempo? 
 
Independentemente das inovações tecnológicas, os princípios básicos do preparo de solo não devem ser negligenciados, ou seja, deve-se considerar no planejamento e na recomendação técnica: o relevo do terreno (plano ou declivoso); o tipo de solo (ex. friável ou coeso); o momento e a época de subsolagem, considerando o ciclo de cultivo (pré ou pós-colheita) e as condições climáticas (seco ou chuvoso); o sistema de cultivo (mínimo ou mais intensivo); os tipos de implemento e tratores disponíveis para a operação; bem como a profundidade de estrondamento do solo almejada. Deve-se lembrar que a principal função do preparo de solo é o seu mínimo revolvimento para que as raízes possam se desenvolver e, rapidamente, colonizarem o perfil do solo.