Chefe Geral da Embrapa Florestas e Líder do Projeto Florestas Energéticas
Op-CP-12
A madeira é um forte componente na atual matriz energética brasileira, pois setores importantes, como o agronegócio, a siderurgia e outros segmentos industriais são, ainda, altamente dependentes desse insumo que, em muitas regiões do país, é utilizado como fonte energética básica no preparo de alimentos. Em que pesem tais circunstâncias, a matriz energética mundial, principalmente a brasileira, depende, grandemente, dos combustíveis fósseis.
As facilidades apresentadas pelos combustíveis derivados do petróleo, em diferentes períodos, afetaram diretamente o uso da madeira como fonte de energia, e não propiciaram condições para um desenvolvimento tecnológico, que colocasse em patamares mais elevados as tecnologias de sua conversão em energia. O desenvolvimento do setor florestal brasileiro vem se baseando em tecnologias que asseguram às florestas plantadas excepcionais índices de produtividade.
Tal desenvolvimento concentrou-se nos empreendimentos destinados ao abastecimento das indústrias de celulose, painéis de madeira e siderurgia. Estima-se que quase a metade de toda a madeira consumida no Brasil destina-se ao suprimento energético, principalmente na forma de lenha e carvão vegetal. Infelizmente, uma enorme quantidade da madeira utilizada ainda provém de florestas nativas, e a sua conversão carece de compromissos tecnológicos, econômicos ou ambientais.
Motivados pela demanda e pela pressão da sociedade, para que o uso de fontes energéticas sejam renováveis e ambientalmente corretas, o aperfeiçoamento das atuais tecnologias e a busca de novas rotas tecnológicas e de produtos energéticos tornaram-se imprescindíveis. Para o estabelecimento de um programa de P&D, com vistas à geração de energia limpa a partir da biomassa, a Embrapa estabeleceu quatro vertentes:
1. biodiesel,
2. álcool,
3. florestas energéticas, e
4. espécies alternativas e resíduos ao desenvolvimento de projetos, em rede nacional.
O projeto “Florestas Energéticas” estabeleceu parcerias com setenta instituições, entre universidades, empresas privadas, setor industrial, institutos de pesquisa, cooperativas, associações e unidades do Sistema Embrapa. A forte relação da Embrapa Florestas com essas instituições, ao longo do tempo, tem propiciado significativo aporte de recursos, treinamentos e investimentos aos programas de P&D, muito contribuindo para dotar o país de tecnologias e conhecimentos de silvicultura e manejo florestal, situando-o como referência mundial nessa área de conhecimento.
Além disso, esta parceria propiciou a aquisição de material e implantação do maior banco de germoplasma ex-situ de Eucalyptus do mundo, material básico para a ampliação da área plantada e para o desenvolvimento de tecnologias de conversão da biomassa em energia, assim contribuindo para o crescimento sustentável do país.
No Brasil, a área plantada com espécies de eucalipto é de, aproximadamente, três milhões de hectares, cuja madeira é destinada, principalmente, aos setores de celulose e papel, siderurgia e energia. Com exceção do setor de celulose e papel, os demais deparam-se, atualmente, com forte desequilíbrio entre a oferta e a procura de madeira, gerando um déficit, que vem sendo suprido por florestas nativas.
O crescimento da demanda e a oportunidade de uso, com vantagens econômicas, da biomassa florestal deverão agravar ainda mais o desequilíbrio entre a oferta e a procura atuais. Para o atendimento da atual demanda de madeira para energia, são necessárias ações em, pelo menos, dois pontos cruciais:
1. a expansão da área com florestas plantadas, e
2. o desenvolvimento de tecnologias mais eficientes, na conversão da biomassa em energia. Muitas tecnologias, atualmente usadas, são arcaicas e ineficientes.
Por exemplo, os fornos de carbonização, denominados rabos-quentes, são energeticamente ineficientes, apresentam baixa taxa de conversão, desperdiçam os finos de carvão, a moinha, e também os vapores da pirólise e o licor pirolenhoso, além dessa tecnologia não ser ambientalmente amigável.
Existe, assim, a necessidade de tecnologias mais eficientes e ambientalmente sustentáveis. Aposta-se no desenvolvimento e/ou adaptação de tecnologias, hoje em estado embrionário, como a compactação de biomassa florestal, a produção de bio-óleo, celulignina, álcool e outros derivados de alto valor agregado, que devem promover o aumento da densidade energética da biomassa e uma logística competitiva de transporte.
O projeto “Florestas Energéticas”, ora desenvolvido pela Embrapa Florestas e parcerias, é composto de outros projetos componentes, estruturados em uma plataforma em rede, com vistas à promoção de sinergismos, fluxos de recursos e de informações, visando integrar as instituições para a construção compartilhada do seu planejamento e gestão.
Os objetivos e metas do referido projeto visam dar uma estrutura ao setor energético de base madeireira, tornando-o sustentável, em termos econômicos e ambientais. Assim, a oferta de sementes e outras formas de propágulos de espécies nativas e exóticas, bem como o desenvolvimento e/ou adaptação de tecnologias apropriadas ao estabelecimento de plantios para a produção de energia, em quantidade e qualidade, é de vital necessidade, principalmente para regiões onde a atividade florestal não é tradicionalmente feita.
No campo da tecnologia, serão desenvolvidas pesquisas sobre:
1. qualidade da madeira de florestas plantadas e/ou nativas manejadas para aplicações energéticas;
2. aperfeiçoamentos e inovações no campo da compactação de resíduos florestais e madeireiros;
3. aperfeiçoamentos e inovações de equipamentos usados para combustão direta da madeira, em ambientes residenciais e em pequenos empreendimentos industriais;
4. utilização de madeira termorretificada para aplicações energéticas;
5. desenvolvimento de um novo sistema de produção de carvão vegetal, e
6. avaliar as tecnologias de conversão energética propostas pelo projeto, usando modelagens estruturadas em dados experimentais. O aproveitamento de produtos com maior valor agregado é um fator a considerar e o caráter multidisciplinar e avançado das pesquisas desenvolvidas ampliarão as fontes sustentáveis de energia, favorecendo a exploração de rotas tecnológicas, onde ainda é prematura a definição de produtos e processos. Isto traduz o objetivo de viabilizar a obtenção de biocombustíveis, tais como álcoois, aldeídos e cetonas, via processamento químico e bioquímico, por intermédio de pirólise rápida, acidólise e via enzimática, bem como celulignina catalítica da madeira e obtenção de outros bioprodutos.
O tema possui um forte caráter tecnológico, sendo o lado científico relacionado, principalmente, com a caracterização fisico-química dos produtos, instrumentação de biorreatores para fermentação semi-sólida, seleção de linhagens mutantes e a otimização da produção de celulases. Nesta linha, há possibilidades de geração de grandes quantidades de informações inovadoras sobre a aplicação das tecnologias propostas, para a bioconversão das matrizes de ligninocelulose (pirólise, pré-hidrólise ácida, oxidação parcial, produção de enzimas em biorreatores instrumentados, hidrólise enzimática e fermentação alcoólica).
O processo de geração de conhecimentos e tecnologias para o aproveitamento da biomassa como fonte energética deve atentar às questões ambientais e de sustentabilidade social, onde o uso de biomassa florestal contribuirá para a minimização da emissão de gases do efeito estufa e balanço neutro entre emissões e captura de gases poluentes.
Destaca-se a possibilidade real do envolvimento de produtores familiares e empresariais no processo de produção de biomassa, produtos energéticos e participação ativa no mercado de crédito de carbono, além dos efeitos que as tecnologias de transformação mais eficientes deverão exercer na manutenção dos recursos naturais e na promoção de trabalho, emprego e renda, pelo estabelecimento de cadeias produtivas viáveis e competitivas.
A reunião de multicompetências nacionais e multinacionais em torno do tema Florestas Energéticas deverá, ainda, indicar processos que permitam ao país a definição de modelos de produção-industrialização de energia da madeira, em escalas regionais. A estratégia é o desenvolvimento de redes otimizadas de pesquisa, onde se busca o desenvolvimento de uma inteligência coletiva, com o cuidado de preservação da inteligência individual, tanto em relação aos recursos humanos, como às instituições envolvidas.
O Brasil ocupa uma posição privilegiada, em termos de biodiversidade e de capacidade de gerar recursos renováveis em grande escala. As condições climáticas e ambientais favorecem altas produções agrícolas e florestais. Além disso, existe uma forte tendência mundial em priorizar pesquisa e desenvolvimento, na direção de tecnologias que contribuam para conferir maior sustentabilidade ambiental, maior qualidade de energia e segurança de fornecimento, como, por exemplo, as oportunidades para a produção de etanol por hidrólise de material lignocelulósicos, utilizando a hidrólise ácida e a enzimática, a partir da biomassa florestal.