Imagine uma floresta de eucalipto sendo formada sem perda de produtividade, sem necessidade de subsolagem, preparo de solo nem compra de mudas e ainda a um custo 30 a 40% inferior ao de uma implantação convencional. Esse é o manejo de talhadia. Apesar de promissora, essa técnica ainda é subutilizada no Brasil, e ainda existem muitas oportunidades de estudos e, também, desafios.
De maneira geral, as principais espécies de eucaliptos utilizadas pelas empresas florestais têm satisfatória capacidade de brotação. Com a consolidação da técnica de clonagem, a partir do final dos anos 1990 e início dos anos 2000, foi possível aumentar a produtividade florestal e a homogeneidade das florestas, o que permite a obtenção de florestas homogêneas também a partir da talhadia.
Há um paradigma entre os produtores florestais de que a produtividade da primeira talhadia é 20% menor que a primeira rotação, e uma segunda talhadia resultaria em nova perda de 20%. No entanto, é importante considerar fatores como clima, pragas e doenças entre as rotações. Historicamente, a condução de brotação foi uma estratégia para redução de custos em momentos de crise, mas sem os devidos tratos culturais, como adubação e manejo de pragas, resultando em perdas de produtividade.
O manejo de talhadia deve ser decidido antes do corte da floresta. Se há clones com maior produtividade, é necessário comparar o custo da madeira desses novos clones com o custo da condução da talhadia, que tem uma produção 30 a 40% mais barata. Em geral, a depender do ganho de produtividade, a comparação entre talhadia e alto fuste poderá indicar preferencialmente a reforma de áreas mais próximas da fábrica e recomendar a talhadia em áreas mais distantes.
Clones suscetíveis a doenças como Ceratocystis sp não devem ser usados, pois podem transmitir doenças através dos equipamentos de corte. Também devem ser eliminados clones com problemas de quebra por ventos, susceptibilidade a déficit hídrico ou que a qualidade da madeira não atenda às especificações do negócio. Definido o manejo de talhadia, a colheita deve favorecer o surgimento dos brotos, com corte a 10 cm do solo e resíduos dispostos na entrelinha.
Os primeiros brotos surgem entre 40 e 50 dias no período chuvoso e entre 60 e 80 dias no período seco. Se a taxa de sobrevivência for baixa, o talhão deve ser destinado à reforma.
A seleção e desbrota de hastes garantem o crescimento vigoroso. São deixadas uma haste em cada cepa ou duas nas bordaduras (3 primeiras plantas) e, também, adjacentes às falhas para compensação da população de plantas aproveitamento da área.
Quanto ao momento de realização desta atividade, pode ser classificada como precoce (realizada entre 3 e 5 meses e entre 1,5 e 2,0 m de altura), convencional (realizada entre 6 e 12 meses e entre 3,0 e 4,0 m de altura) ou tardia (realizada acima de 12 meses ou acima de 4,0 m de altura). Resultados de pesquisas apontam ganhos de até 10 a 20% em volume quando se utiliza a desbrota precoce. Independentemente da forma escolhida, esta atividade é exclusivamente manual, com baixo rendimento operacional, dependente de pessoas treinadas e exigindo elevado esforço físico dos colaboradores.
Vivemos num cenário com baixa disponibilidade de trabalhadores rurais. Sendo assim, um importante desafio para ampliar o manejo de talhadia é o desenvolvimento de métodos mecanizados ou semimecanizados. Talvez este seja um dos grandes gargalos para a ampliação da área de condução nas empresas.
Após a desbrota, o controle do "broto-ladrão" também pode ser necessário, mas não há consenso sobre o impacto dessas brotações secundárias nem sobre a técnica de eliminação dos mesmos, podendo ser química ou manual.
Após a realização da desbrota, devemos realizar as fertilizações conforme análise de solos e produtividade esperada. Geralmente, a primeira adubação é realizada com NPK+micros, a segunda com NK+B ou K+B além de aplicações de cálcio e magnésio a partir de calcário dolomítico ou compostos enriquecidos obtidos da produção de celulose.
De maneira geral, são utilizadas, para os cálculos de fertilização, as mesmas taxas de recuperação de nutrientes entre os regimes de talhadia x implantação/reforma, porém é possível que a talhadia seja mais eficiente devido ao sistema radicular já estabelecido na cultura. Existe a oportunidade de avaliarmos a realização de adubação única ao invés de duas coberturas.
Outro ponto bastante interessante é que algumas áreas a talhadia não têm respondido a adubações fosfatadas, principalmente aquelas plantadas em primeira rotação com fontes reativas como o GAFSA ou ARAD. Uma hipótese pode ser o fato de o sistema radicular já desenvolvido armazenar parte do fósforo da primeira rotação ou então, por explorar maior volume de solo, conseguir recuperar formas não-lábeis do nutriente.
De acordo com a Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), a produtividade média de madeira do Brasil em 2021 foi de 38,9 m³/ha/ano com casca. Nesta produtividade, além da madeira, são produzidos cerca de 10 a 13 t/ha de casca; 11 a 15 t/ha de copa (galhos+folhas); 20 a 30 t/ha de serrapilheira (litter); e 20 a 35 t/ha de raízes. Em sistemas de colheita cut-to-lenght que utiliza os equipamentos harwester + forwarder, todo este material permanece na área, contribuindo com a cobertura do solo e manutenção da umidade da área, além de ajudar com a liberação de nutrientes e matéria orgânica do solo. A talhadia se beneficia de todos estes efeitos por não necessitar de preparo de solo nem enleiramentos.
Estudos realizados por institutos de pesquisa nacionais e internacionais demonstraram que, em idade adulta, as raízes do eucalipto podem atingir até 15 metros de alcance lateral e que cerca de 95% da biomassa do sistema radicular estaria até 2 metros de profundidade. Após o corte do eucalipto, parte deste sistema radicular acaba senescendo para a emissão das novas brotações.
Agora vamos comparar com uma implantação ou até mesmo uma reforma: Considerando que cada muda recém-transplantada é capaz de explorar um volume de solo de 64 L (40 x 40 x 40 cm), enquanto uma cepa de eucalipto seria capaz de acessar água e nutrientes em cerca de 450.000 L de solo (15 x 15 x 2 m). Mesmo se considerarmos que 50% das raízes poderiam senescer após o corte da árvore, ainda assim teríamos uma diferença significativa entre o volume de solo acessado pela talhadia em comparação com reforma ou implantação.
Em solos arenosos de cerrado, onde há maior déficit hídrico, a talhadia pode reduzir o impacto da baixa retenção de água e nutrientes e diminuir a dependência de fertilizantes minerais. Precisamos continuar a estudar o consumo de água da talhadia em comparação com implantações e, também, os efeitos na qualidade da madeira.
A maior sustentabilidade desse sistema de manejo torna a talhadia uma alternativa viável para o futuro da silvicultura.