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Gladys Margarita Mogollón Briceño

Chefe do Laboratório Nacional de Produtos Florestais da Universidad de Los Andes, Venezuela

Op-CP-08

Transferência da produção de celulose e papel para o hemisfério sul: entre o céu e o inferno?

Nos últimos anos, o mercado mundial de madeira e celulose vem expandindo-se aceleradamente. Isso levou os países do norte, especialmente os da América do Norte (EUA e Canadá) e da Europa, como Finlândia, Suécia, Espanha e Portugal, entre outros, a dirigirem suas vistas para desenvolver suas indústrias em direção aos países do sul, especialmente, os da América do Sul, como Brasil, Argentina, Uruguai e Chile.

Levaram em conta o fato da produção nessas regiões oferecer mais vantagens comparativas, em relação ao hemisfério norte, em virtude desses países apresentarem uma infra-estrutura de vias, portos, telecomunicações, mas, sobretudo, água abundante e condições favoráveis de terreno, além dos grandes espaços disponíveis, o rápido crescimento das árvores e a mão-de-obra barata.

Mas, por outro lado, também no hemisfério norte apresentam-se grandes limitações, devido às poderosas e duras exigências das agências de controle do meio ambiente, assim como a escassez de terrenos aptos ou disponíveis para o estabelecimento de plantações que alimentem a indústria de produção de polpa.

Junto a isso, a situação de estagnação econômica, que se deu até muito poucos anos, em algumas regiões da América do Sul, fez com que se visse a implementação dessas plantas, como uma oportunidade para sair de tal estagnação, levando-se em conta que estas se converteriam em geradoras de “progresso” nas zonas onde estão assentadas, umavez que constituem fontes de emprego e de desenvolvimento econômico.

O que fez com que a idéia da constituição ou formação dessas plantas nos países da América do Sul tenha sido aceita com beneplácito pela maioria dos habitantes longínquos às zonas nas quais se veio implantando tais plantas e, em outros casos, tenha propiciado uma enorme disputa entre Argentina e Uruguai, pela instalação, neste último, de duas plantas de celulose.

Com efeito, o Uruguai, que possui plantas de celulose e papel de mediano tamanho, conta, a partir de 2007, com a gigantesca Botnia de Finlândia, que investirá US$ 1,2 bilhão para elaborar até 1 milhão de toneladas de pasta de celulose anualmente, com previsões de exportações para a China, a Europa e os Estados Unidos. A segunda planta é da empresa espanhola Ence, que investirá 600 milhões de dólares para produzir 500.000 toneladas e, eventualmente, chegar às 600.000 toneladas de celulose.

As duas estão situadas na cidade de Fray Bentos, a 300 quilômetros a oeste sobre o rio Uruguai, divisa com a Argentina, em frente à província de Entre Rios, de onde partiram os mais fortes protestos contra estas empresas, que incluíram bloqueios de pontes, afetando não só o tráfico comercial, mas o de pessoas e veículos.

Contudo, a partir deste ano e apesar dessas disputas, tudo parece indicar que o Uruguai será competidor nas exportações de celulose. Por todo o exposto, não paira dúvidas de que a indústria de produção de celulose e de papel constitua uma extraordinária fonte de riqueza e desenvolvimento econômico.

Por exemplo, durante o ano de 2006, os despachos mundiais de celulose incrementaram-se em 1,75 milhão de toneladas. Deste total, 55% teve como destino o mercado da Ásia, sendo a China o principal país de destino, ao receber a metade desta porcentagem. Os preços internacionais da celulose exibiram, durante o ano de 2006, uma trajetória sustentada pelo aumento de preço, tendendo a se estabilizar perto do final do ano, em particular no mercado de fibra curta, ante a expectativa do ingresso no mercado de novas plantas e ampliações de capacidade, principalmente no Chile e no Brasil.

Os preços internacionais da celulose fibra longa (pinho) apontaram, no mês de dezembro de 2006, um aumento de US$ 130 (+ 22%), sobre o preço observado em dezembro do ano anterior. Este importante aumento, como já afirmamos, sustentou-se num aumento da demanda por este tipo de celulose. Por outro lado, os preços internacionais da celulose fibra curta (eucalipto) acumularam, até o final daquele ano, um aumento de US$ 80 (+ 14%), em relação a dezembro de 2005, pela mesma razão.

Para se ter uma idéia da imensa importância da exploração deste item,  para a economia de alguns países da América do Sul, teria que se dizer que a Argentina, o Brasil e o Chile, que são os principais países produtores, exportaram, em 2005, quase US$ 3,5 bilhões em pasta de celulose. Segundo a Câmara de Comércio Uruguaia-Argentina, por ordem de produtores-exportadores, essa cifra separa-se da seguinte maneira:

 

  • Brasil: US$ 2.033.620.779
  • Chile: US$ 1.204.619.557
  • Argentina: US$ 158.812.874

Como se pode ver, são cifras que, para qualquer país do mundo, constituiriam uma grande contribuição para sua economia e desenvolvimento. Pois bem, apesar da grande contribuição que outorga a produção e exportação da pasta de celulose na geração de empregos e na saúde econômica destes países, dentro de suas regiões, não deixou de haver murmuradores que não concordam que estas plantas produtoras de celulose continuem sendo implantadas em seus territórios.

Por exemplo, e a propósito das duas fábricas mencionadas a se instalarem no Uruguai, tanto os habitantes desse país, como os da Argentina - com maior ênfase neste último, participaram de grandes protestos, em virtude de que são da idéia de que a instalação de ambas as fábricas trarão, como conseqüência, a contaminação do leito do rio binacional.

Um deles foi o escritor Eduardo Galeano, quem, a propósito de uma mobilização que se realizou contra a instalação dessas duas grandes fábricas de celulose na beira do rio Uruguai, disse estas palavras à multidão, que assistia a mesma: “Há decisões que se tomam em 15 minutos, mas que têm conseqüências durante séculos”.

E mais tarde agregou, desta vez se dirigindo às autoridades governamentais: “Antes de tomar uma decisão que nos parece grave e que pode implicar no envenenamento do rio e na redução do pouco húmus que nos resta na terra, isto que vai apodrecer as águas e secar as terras, que é a experiência triste que deixaram as fábricas de celulose no Chile e na Argentina. Antes de tomar uma decisão… pensem muito no que vão fazer”

Outra das razões que alegam aqueles que se opõem à instalação destas fábricas na América do Sul é a de que a monocultura florestal expulsa a população rural, já que ocupa o último lugar na geração de empregos, ou seja, apenas quatro trabalhadores para cada mil hectares. Enquanto seis postos de trabalho são gerados na pecuária, oito da cultura do arroz e, no extremo oposto, 133 trabalhadores para cada mil hectares da horticultura, 165 da vinicultura e 211 da avicultura.

Além do que, assinalam que o avanço dos cultivos florestais impede os trabalhadores rurais de continuarem cultivando suas terras, porque ressecam o solo, fazendo as fontes de água desaparecerem, tornando as terras inaptas para a agricultura. Por outro lado, afirmam que os trabalhadores florestais são mal pagos e trabalham em condições de quase escravidão.

Também declaram que a monocultura de eucaliptos - principal árvore para a produção de celulose, veio deslocando o cultivo de outros itens, para eles mais importantes, como, por exemplo, os cereais, como trigo, cevada, linho e girassol. Os centros de pesquisas do mundo e da região, desenvolveram, nos últimos anos, tecnologias que permitem a produção de polpa, com padrões “mais amigáveis” com o meio ambiente, isto, contudo, em alguns casos, não é entendido pelos grupos que se opõem à mudança norte-sul.

Como se pode ver, existe uma luta de conflitos que, na minha opinião, deve ser dirimida da melhor maneira possível, com a implementação de reuniões entre todas as partes afetadas, que possibilitem a unificação de critérios. O ideal seria que as empresas e os segmentos governamentais, que promovem a instalação destas fábricas produtoras de celulose, reúnam-se com os movimentos ambientalistas e com os segmentos governamentais encarregados da proteção e conservação do ambiente, em honra à produção de pasta de celulose nos países do sul, para que esta produção gerem os menores impactos possíveis ao ambiente e à sociedade, em seu conjunto, e que, no final das contas, haja a maior quantidade de beneficiados, tanto de um lado, como do outro.