Me chame no WhatsApp Agora!

Maurel Behling

Pesquisador de Sistemas Integrados de Produção - iLPF da Embrapa Agrossilvipastoril

Op-CP-40

Árvores na iLPF
A inclusão de pastagens e árvores em áreas agrícolas ou a inclusão de árvores e culturas agrícolas em pastagens é ferramenta útil na recuperação de áreas degradadas, bem como um meio para garantir a sustentabilidade do sistema de produção. As raízes das forrageiras e das árvores exploram camadas mais profundas em ambiente permanentemente protegido pela cobertura vegetal, evitando as perdas de nutrientes por lixiviação e de solo por escorrimento superficial.

No sistema integrado, o componente arbóreo atua na diminuição da energia cinética da chuva, reduz o escoamento da água, favorece a infiltração no solo (ambiente favorável, capaz de fechar o ciclo solo-água-planta) e a recarga do lençol freático. A água armazenada no solo será usada pelas culturas e também irá alimentar o manancial que abastece os rios na seca, garantindo uma vazão mais constante. 


Por exemplo, no primeiro ano de monitoramento do volume de perda de solo e o escoamento da água da chuva, realizado pelo pesquisador Cornélio Alberto Zolin (Embrapa Agrossilvipastoril), em um experimento de iLPF conduzido em Sinop-MT (2012), onde foram comparados o solo descoberto, lavoura (sucessão soja e milho com braquiária), integração lavoura-floresta, pastagem, silvicultura (eucalipto) e mata nativa, o volume de água escoado foi menor no sistema de iLF quando comparado à área apenas com lavoura.

Enquanto na sucessão de soja na safra de milho com braquiária na safrinha, o escoamento foi de 2,4 % do total precipitado; no sistema silviagrícola, esse número foi de apenas 1,7 %. Em um local onde chove cerca de 2.000 mm/ano, isso representa 14 litros de água a mais infiltrados a cada m2 e 140 mil litros de água a mais disponíveis no solo por hectare. 
As árvores contribuem para aumentar a eficiência de utilização de nutrientes do sistema iLPF através da intensificação da ciclagem biogeoquímica. Enquanto a soja produz, em média, 133 kg de carbono para cada kg de fósforo (P) aplicado no solo, na teca (Tectona grandis), duas toneladas de C são alocados na biomassa para cada kg de P; já o eucalipto produz 11,6 toneladas de C para cada Kg de P aplicado ao solo.

No geral, as árvores têm menor demanda absoluta ou relativa de nutrientes do que as culturas agrícolas e, se manejadas adequadamente, possibilitam uma maior eficiência de utilização das fontes de nutrientes utilizadas na adubação das culturas intercalares. 
A eficiência de uso de água também é superior nas espécies florestais. Enquanto as culturas anuais, de forma geral, produzem menos de um grama de matéria seca (MS) por litro de água, exceção para a cana, que produz 1,8 gMS/L de água, nas espécies florestais, ela é superior a 1,0 gMS/L de água.

O Eucalipto grandis
por exemplo, tem uma eficiência de uso da água entre 1,9 até 6,1 gMS/L de água, eficiência superior a qualquer cultura agrícola. O eucalipto tem alta eficiência de uso da água e pode absorver de 800 a 1.200 mm por ano e pode produzir 1 kg de madeira com 350 litros de água, enquanto algumas espécies nativas podem utilizar em torno de 2.500 litros; já o milho demanda, em média, cerca de 1.000 litros de água para produzir 1 kg de grãos, e a soja, 1.800 litros.
 
Assim, podemos afirmar que devemos plantar árvores em sistema de integração lavoura-pecuária-floresta para elevar a sinergia e aumentar a eficiência do sistema de produção e também para melhor conservação do solo com a utilização de faixas de árvores como barreira para redução do escorrimento superficial, permitindo a infiltração de água no solo e a recarga do lençol freático.
 
O sombreamento excessivo das culturas agrícolas e forrageiras com o crescimento das árvores, o que de fato é verdade, caso não sejam manejadas de forma correta, é o principal fator a gerar polêmica na introdução de árvores em sistemas integrados. A desrama (poda dos ramos) e o desbaste são duas importantes práticas de manejo das árvores no sistema iLPF, sendo realizadas principalmente para aumentar a luminosidade para as culturas que estão intercaladas, seja pastagem ou lavoura.

A intensidade e a frequência das desramas e dos desbastes irão depender da espécie e do arranjo utilizado. Na iLPF, uma boa sugestão é planejar e manejar as árvores com vistas à exploração multiuso do povoamento. Assim, obtêm-se rendas intermediárias, e o problema do sombreamento excessivo é minimizado. 
No entanto, na definição do arranjo e modalidade de iLPF que será implantada, devemos perguntar: qual a melhor espécie florestal para o sistema? Certamente, a melhor espécie será aquela que possui mercado garantido para os seus produtos, seja adaptada às condições edafoclimáticas da região e haja domínio dos seus tratos silviculturais.

Nesse aspecto, as espécies exóticas levam vantagem e possuem alta produtividade e tecnologia adaptada às condições subtropicais e tropicais. As espécies nativas possuem um potencial ainda não explorado devidamente, não possuem mercado consolidado e também sofrem concorrência com madeira de florestas nativas de diâmetros maiores. O eucalipto, composto por seus diferentes clones, é, sem dúvida, a espécie mais plantada nas áreas que adotam a estratégia iLPF no Brasil por atender aos requisitos citados.

 
Além da existência de mercado para os produtos gerados, a escolha da espécie florestal deve ser pautada também na distância em que a propriedade está do mercado consumidor. Produtos de menor valor agregado, como lenha, biomassa e cavacos (eucalipto), tem seu plantio restrito a um raio entre 100 e 200 km. Já a exploração do eucalipto para madeira serrada permite que o mercado consumidor esteja a distâncias maiores. A utilização de espécies de maior valor agregado, como a teca, permite ao produtor estar a uma distância superior aos 2.500 km do porto para exportação da madeira para a Índia, logística permitida somente por madeiras de alto valor agregado.
 
Um exemplo de propriedade que faz iPF como adição de renda é a Fazenda Bacaeri, em Alta Floresta-MT, distante 2.700 km do porto de Paranaguá-PR, pertencente à Bacaeri Florestal Ltda (Sócio-gerente Antônio Francisco dos Passos). A fazenda possui 1.200 ha de plantio homogêneo de teca (Tectona grandis) e uma área de 6.700 ha com pecuária para recria e engorda de animais, tanto da raça Nelore (predominante) quanto animais de cruza incerta, comprados de criadores da região.

A área com sistema silvipastoril é de 450 ha com teca. A estratégia de iPF utilizada é consórcio da forrageira B. brizantha (cv Marandu) com teca cultivados em diferentes configurações (15x6, 18x3, 20x2,5, 20x3 e 22x3 m); 
a entrada dos animais jovens (recria), no sistema, ocorre entre os seis meses e um ano após o plantio das árvores. A Fazenda Bacaeri irá implantar, anualmente, cerca de 350 ha/ano até atingir 100% da área de pecuária com sistema silvipastoril. No prazo de 20 anos, fecha-se um ciclo de plantio, e será estabelecido o ciclo de corte e replantio.
 
Atualmente, a fazenda possui instalada uma serraria para o desdobro da madeira, obtida dos desbastes dos plantios homogêneos, para exportação de blocos de diferentes bitolas (3x3" a 5x6"), com o preço FOB/m³ variando entre US$ 420 e US$ 600, respectivamente. A experiência com o plantio puro e o acompanhamento do crescimento das árvores no sistema silvipastoril permitiram à Bacaeri realizar projeções de receitas que possam ser geradas no sistema iPF.

No cenário pessimista, com custos de implantação e manutenção elevados, pequeno crescimento das árvores e o preço da madeira bem abaixo do esperado, é gerada uma receita de R$ 10,55 ha/ano mais a receita obtida anualmente com a pecuária de corte (R$ 300,00 ha/ano).

No cenário otimista, com custos de implantação e manutenção bem menores, adequado crescimento das árvores e o preço esperado da madeira, é gerada uma receita de R$ 16.222,22 ha/ano 
mais a receita obtida anualmente com a pecuária (R$ 300,00 ha/ano). No cenário real, é gerada uma receita de R$ 2.655,55 ha/ano mais a receita obtida anualmente com a pecuária. 

Recomenda-se para quem pretenda iniciar o sistema que seu projeto seja elaborado com base nas projeções do cenário conservador, com uma receita de R$ 1.301,11 ha/ano mais a receita obtida anualmente com a pecuária, minimizando o lucro e maximizando os custos. Os cenários projetados são interessantes, ressalvadas as condições extremas, ou seja, a receita de R$ 16.000,00 ha/ano dificilmente será alcançada, mas também o produtor precisa errar muito para que ele tenha um sistema de iPF com uma receita negativa.

A coexistência de sistemas, muito bem estruturados, de produção de grãos, carne ou leite e produtos madeireiros e não madeireiros é um dos fatores que contribuem, de forma determinante, para que a estratégia iLPF seja adotada para aumentar a produtividade e a competitividade da agropecuária brasileira. Dessa forma, se visualiza que, em um futuro próximo, a convivência sustentável da atividade agrícola, pecuária e silvícola seja a regra da agropecuária brasileira, e não uma exceção.