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Moacir José Sales Medrado

Diretor da Medrado & Consultores Agroflorestais Associados

Op-CP-18

Nada é sozinho, nada é para sempre, nenhum problema é exclusivamente jurídico.

A Constituição brasileira assegura a sustentabilidade dos biomas e o repasse às futuras gerações de um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado. Por isso a sociedade exige um bom Código Florestal, sem o qual será impossível compatibilizar essa conquista com a reprodução ampliada e o consumismo do modelo capitalista atual.

Um instrumento que compatibilize desenvolvimento e preservação. Um Código dinâmico, que absorva, ao longo do tempo, o amadurecimento da sociedade e os avanços do conhecimento das ciências agrárias e biológicas. Afinal de contas, conforme Calmon de Passos, “nada é sozinho”, “nada é para sempre”, “nenhum problema é exclusivamente jurídico”.

No entanto, as mudanças somente deverão ocorrer a partir de um embate político, cabendo ao direito dar concreção ao que for conquistado. Por consequência, considero legítima a discussão atual e por isso contribuirei para ela. Restringir-me-ei, no entanto, dado ao pequeno espaço, ao ambiente rural e a comentários sobre alguns pontos da discussão sobre Reserva Legal (RL) e Área de Preservação Permanente (APP).

Primeiramente, acho que a vinculação do desmatamento zero para o bioma amazônico à desobrigação da reposição de RL e APP nas regiões de agricultura consolidada é um grande equívoco de algumas lideranças do agronegócio e de setores do governo. Isso representa transformar o país numa fazenda, cuja RL e APP será a Amazônia.

O argumento reproduz a posição de alguns países - os principais responsáveis pelo desflorestamento do planeta - que tentam repassar para os detentores de importantes florestas primárias remanescentes a tarefa de manter a cobertura florestal necessária ao equilíbrio ambiental global.

Entendo também que a possibilidade de flexibilização do uso de áreas de topo de morro e de inclinações superiores a 45o não deva ser vinculada ao tipo de produtor (familiar ou empresarial) e sim a situações de riscos sociais (insuficiência de alternativas de renda para as famílias e/ou desestabilização da economia municipal).

Mesmo assim, ela só deverá ser permitida quando o uso atual contemplar espécies perenes lenhosas para exploração madeireira em regime especial de exploração (cortes em faixas alternadas, por exemplo), fruteiras perenes lenhosas tradicionalmente plantadas (nativas e/ou exóticas) e sistemas agroflorestais. Outra posição que defendo está relacionada à definição da exigência de RL nos biomas.

Entendo que nem a exuberância da vegetação nem a extensão do bioma deverão basear o estabelecimento da porcentagem de RL nas propriedades rurais. A única justificativa para que a RL na floresta amazônica seja sempre superior à dos outros biomas é nossa incapacidade histórica de recuperar, mesmo progressivamente, a cobertura vegetal dos biomas que já degradamos.

Assim, o bioma Amazônia passa a ser uma espécie de “fiança” para nossos projetos de recuperação. Por isso, pensando no longo prazo, sou adepto da criação de uma espécie de contabilidade ambiental, que promova uma equalização à medida que forem sendo recuperadas as coberturas vegetais dos outros biomas.

No que diz respeito à possibilidade de compensação de RL, discordo da ideia de utilização de áreas fora do bioma. A compensação deve ser feita no mesmo bioma, em ecossistema semelhante ou em outro ecossistema, desde que feita por aquisição, seguida de doação ao Estado de área confrontante com uma Unidade de Conservação Integral.

Sou contra a proliferação de Códigos estaduais, mas entendo que, em relação a alguns parágrafos, desde que não gere incompatibilidade com os valores constitucionais de maior relevância, o Código poderia se fixar no geral, deixando que os Estados legislem quanto ao particular. O artigo 2º, no que tange à largura das faixas de proteção de rios, é um exemplo, dadas as peculiaridades estaduais: declividade das encostas adjacentes aos cursos de água; textura e espessura dos solos.

Essa é inclusive uma postulação da Embrapa. P
or fim, recomendo que o poder público, ao financiar seus institutos de pesquisas, exija a condução de projetos sobre APP, RL e silvicultura de nativas, com intuito de fortalecer o estoque de conhecimentos necessários para melhor qualificar embates políticos sobre o Código - que certamente ocorrerão nas próximas décadas - e a recuperação dos biomas.

Não agindo assim, permitirá que a pesquisa pública, nesse particular, passe a ser financiada por organizações não governamentais com interesses unilaterais. Isso, inclusive, está prestes a ocorrer com a Embrapa. A arrecadação proveniente de multas ambientais poderiam ser a fonte financiadora dessa importante linha de pesquisa.