Professor de Ecologia e Restauração Florestal da UF de Viçosa
Op-CP-03
A silvicultura brasileira para produção de celulose e papel passou por um notável desenvolvimento tecnológico nas últimas décadas, fruto de grandes investimentos em pesquisa, que resultou em expressivo aumento da produtividade média de eucalipto, ou seja, de cerca de 10 m3/ha/ano, na década de 1960, para mais de 40 m3/ha/ano, na atualidade. Contudo, no contexto ambiental, essas florestas plantadas sempre estiveram no centro de uma grande discussão sobre seus possíveis impactos ambientais.
Aos reflorestamentos de Eucalyptus, tem sido atribuída, ainda que sem muita fundamentação científica, uma parcela da degradação ambiental de algumas regiões do país, como alterações na quantidade de água nas microbacias, empobrecimento dos solos e redução da biodiversidade. Parte dessa rejeição ambiental, na realidade, teve origem no histórico do reflorestamento no Brasil, que, mediante incentivos fiscais, grandes áreas foram reflorestadas sem muito critério ecológico, havendo casos de substituição de florestas nativas, por florestas plantadas.
Felizmente, desde o final da década de 1980, vem ocorrendo grande mudança de postura ambiental na silvicultura brasileira, na qual empresas, universidades e instituições de pesquisas têm procurado aliar o objetivo de aumento na produtividade de madeira, com a adequação ambiental das áreas de produção. Toda essa preocupação ambiental tem visado atender a uma sociedade mais consciente e a mercados externos cada vez mais exigentes, em que florestas nativas ou plantadas são consideradas essenciais para amenizar fenômenos como efeito estufa, aquecimento global e escassez de água.
Nessa nova tendência da silvicultura para produção de celulose e papel, que não é exclusiva do Brasil, mas sim mundial, uma grande preocupação das empresas tem sido a conservação e a recuperação dos recursos naturais. Assim, passaram a fazer parte do vocabulário empresarial do setor metas como certificação florestal, manejo sustentável, uso múltiplo e recuperação de áreas degradadas.
Como as propriedades rurais destinadas à produção de madeira para celulose e papel ocupam grandes áreas, estas passaram a ser manejadas numa visão holística, na qual se procura conciliar as áreas produtivas com fragmentos de florestas nativas, formando um grande mosaico florestal. O arranjo dessas florestas nativas, numa matriz de reflorestamento homogêneo, tem sido, atualmente, planejado no sentido de conectar fragmentos florestais, visando a conservação e restauração da biodiversidade, com benefícios ecológicos para a própria floresta de produção, através do controle biológico de determinadas pragas e conservação do solo e da água na propriedade.
Com a crescente inclusão na atividade florestal de pequenos proprietários rurais, através de programas de fomento, abre-se também uma nova perspectiva de recuperação de áreas degradadas, em que tais produtores devem ser estimulados a restaurar florestas, em áreas de preservação permanente. Nessas pequenas propriedades, a implantação de florestas de uso múltiplo e de sistemas agroflorestais em áreas degradadas, a exemplo de pastagens improdutivas, configura-se como boa alternativa econômica, social e ambiental.
Para auxiliar programas de gestão ambiental das empresas florestais, vários modelos de recuperação de áreas degradadas têm sido desenvolvidos. E a grande contribuição para o desenvolvimento desses modelos tem sido dada por fundações de integração universidade-empresa, como a Sociedade de Investigações Florestais, vinculada à Universidade Federal de Viçosa (UFV), e por outras instituições como a Esalq-USP e a Embrapa-CNPF.
Os modelos mais recentes de recuperação de áreas degradadas têm buscado duas metas bem definidas: a redução dos custos de implantação e manutenção e a sustentabilidade das florestas restauradas. Estes dois objetivos têm sido mais facilmente atingidos através da utilização, nos projetos de restauração, de elevado número de espécies nativas, obviamente respeitando-se aspectos como abundância e raridade natural das espécies, grupo sucessional, seletividade a gradientes ambientais, etc.
E, para atingir tais metas, modelos ecológicos de restauração, como transposição do banco e da chuva de sementes e semeadura direta, entre outros, têm gerado resultados promissores. Nos modelos de restauração, através de reflorestamentos mistos com espécies nativas, muito do conhecimento já adquirido pela silvicultura tradicional tem sido aproveitado, mas vários ajustes ainda precisam ser feitos, dada a heterogeneidade de respostas das diferentes espécies.
Deve-se destacar que, numa matriz de reflorestamento comercial, a conservação e restauração de fragmentos florestais tendem a ser mais fáceis do que numa matriz de monoculturas agrícolas e pastagens, já que na primeira situação o entorno da floresta restaurada é também uma floresta, ainda que homogênea, funcionando como filtro e minimizando efeitos de borda.
Além disso, o próprio eucalipto pode ser utilizado na recuperação de áreas degradadas, em razão da sua capacidade de rápido crescimento, em condições de baixa fertilidade do solo, formando florestas catalisadoras de espécies arbóreas nativas em seu sub-bosque. Para concluir, do ponto de vista da recuperação ambiental, a silvicultura brasileira para celulose e papel apresenta-se bastante promissora nas próximas décadas, já que se vislumbra a intensificação de um cenário de elevada produtividade dos reflorestamentos, em consonância com a conservação e restauração das florestas nativas e, por conseqüência, dos recursos hídricos e edáficos, bem como da biodiversidade como um todo.