Pesquisador do Instituto Florestal de São Paulo
Op-CP-07
Os reflorestamentos com espécies nativas têm se realizado, principalmente, por obrigação estabelecida na legislação ambiental, e a argumentação para sua realização fundamenta-se na restauração das funções de proteção ao solo e à água e, também, no restabelecimento da diversidade biológica e dos processos ecológicos dos ecossistemas originais.
Entretanto, com as previsões acerca do aquecimento global pelo efeito estufa, outro serviço ambiental passou a ser esperado destas florestas: a neutralização do carbono em excesso na atmosfera. A pesquisa em restauração florestal, que ainda se estrutura como área da ciência, passou, então, a encarar um outro desafio, que é quantificar esse serviço ambiental, prestado pelos diferentes modelos de plantio, em diferentes situações ambientais, e discutir a eficácia dessa estratégia na redução dos níveis de carbono da atmosfera.
Considerando que a possibilidade de remuneração da fixação do carbono atmosférico pode se constituir em um interessante instrumento de estímulo à restauração de florestas nativas, o Instituto Florestal do Estado de São Paulo, através do Projeto de Recuperação de Matas Ciliares, em parceria com a Universidade Federal do Paraná, tem realizado pesquisas em áreas reflorestadas, para desenvolver métodos de quantificação e monitoramento do carbono fixado pelas árvores.
Nossas primeiras estimativas, feitas com base em equações alométricas, para estimativa de biomassa em florestas tropicais, mostram que o potencial de fixação de carbono em reflorestamentos com árvores de várias espécies nativas depende muito dos solos e das espécies utilizadas. Em solos menos férteis (Neossolos Quartzarênicos), onde ocorriam os cerrados, a taxa de fixação de carbono, quando escolhidas as espécies nativas de melhor desempenho, é de cerca de 1,3 t/hectare/ano.
Nos solos mais férteis (Latossolos Vermelhos Euférricos), o rendimento médio dos reflorestamentos feitos com espécies nativas sobe para 5,2 t/hectare/ano. Resultados parciais de nossas últimas pesquisas, baseados na pesagem de árvores inteiras, mostram que se for também contabilizada a biomassa das raízes das árvores, devem ser adicionados mais 25% em biomassa aos reflorestamentos, de modo que as estimativas de captura de carbono passariam, então, a variar ente 1,6 e 6,5 t/hectare/ano, a depender da fertilidade do solo.
Outra informação nova e importante diz respeito à variação da capacidade de fixação de carbono entre as espécies de árvores, em função de seu ritmo de crescimento. Aos 20 anos de idade, uma árvore de crescimento rápido (como angico e peito-de-pombo, por exemplo) teria armazenado por volta de 450 quilos de carbono; uma de crescimento moderado (canafístula, por exemplo) teria fixado cerca de 110 quilos e uma de crescimento lento (como a aroeira ou o pau-marfim) teria fixado 35.
Com base nessas informações, o planejamento dos reflorestamentos de restauração poderá contemplar mais uma variável, que é o potencial diferenciado entre áreas e espécies, para fixação do carbono. Desta forma, projetos em áreas com baixíssima produtividade devem ter prioridade para restauração de processos ecológicos, e outras, onde os solos são melhores, podem ter como objetivo principal a fixação de carbono, além dos outros serviços ambientais, referentes à proteção dos solos, à produção de água e à recuperação da biodiversidade.
Passam a ter maior importância as espécies que tenham crescimento rápido e que também sejam atrativas à fauna. Além de propiciarem rápido acúmulo de biomassa e, por conseqüência, de carbono, também promoverão a chegada de novas espécies, através de animais dispersores, que freqüentarão suas copas, em busca de frutos. Modelos de reflorestamento com alta densidade deste tipo de árvores, sem que sejam excluídas outras de desenvolvimento lento ou moderado, otimizariam os serviços ambientais, esperados de uma floresta em restauração.
Com relação aos aspectos legais, se nas áreas de preservação permanente, a legislação atual não deixa margem a muitas opções em termos de uso da floresta restaurada, nas reservas legais, que todas as propriedades devem ter, o reflorestamento pode ser planejado com mais flexibilidade e agregar, ainda, a possibilidade de exploração sustentada da madeira, após o vencimento do período de creditação do carbono, que pode ser de, no máximo, 30 anos.
Os reflorestamentos com espécies nativas, portanto, devem passar a ser vistos com pragmatismo, de modo que as novas possibilidades apontadas pelas pesquisas sejam, de fato, utilizadas para promover ganhos ambientais amplos. Projetos não devem restringir suas metas ao retorno da diversidade biológica da floresta, sem considerar a possibilidade de oferecer produtos e serviços ambientais diversificados e a possibilidade de recompensar aqueles que decidiram investir em uma atividade que se configura como de interesse coletivo.
De acordo com os acordos internacionais que regulam a concessão de certificados para a comercialização dos estoques de carbono, os aspectos citados acima são condições obrigatórias para os projetos que se candidatarem a receber créditos, pelo seqüestro de carbono.
Finalmente, é importante ressalvar que os projetos candidatos à remuneração pela fixação passam por um longo e caro processo de certificação, sendo analisados, inclusive, por organismos internacionais. Pequenos reflorestamentos só possuem alguma chance de serem remunerados, caso sejam apresentados em conjunto e, portanto, iniciativas que promovam a associação de pequenos refloresta-dores são um primeiro passo fundamental para viabilizar sua certificação.