Professor de Controle de Incêndio Florestal da Universidade Federal do Paraná
Op-CP-11
O IPCC - Painel Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas, chegou recentemente à conclusão de que: “a temperatura média da superfície da Terra aumentou cerca de 0,6°C, durante o século XX; as temperaturas mínimas da atmosfera estão aumentando; a cobertura de neve e a extensão de gelo marinho têm diminuído; o nível dos mares está aumentando; a concentração de gases de efeito estufa continua em ascendência, devido às atividades humanas e às temperaturas globais; e o nível dos mares continuará aumentando, de acordo com as projeções feitas através de modelos de simulação.
Vários modelos de Circulação Geral da Atmosfera projetam um incremento da temperatura média mundial entre 0,8 e 3,5°C, até o ano 2100, mudança muito mais rápida que qualquer outra verificada nos últimos 10.000 anos. Também se prevê que aumente a freqüência e a gravidade dos acontecimentos extremos de caráter meteorológico e climático, o que levará a uma alteração dos regimes de incêndios.
As evidências indicam que as secas, cada vez mais freqüentes, produzirão mais incêndios florestais de grande intensidade, com conseqüências sobre a perda da cobertura vegetal, a desertificação e a diminuição da absorção de carbono pelos ecossistemas terrestres”. As tendências projetadas dos impactos provocados pelas mudanças climáticas globais sobre a cobertura vegetal e os regimes de incêndios, da mesma forma que as tendências demográficas e socioeconômicas observadas, sugerem que os incêndios florestais continuarão tendo um papel fundamental na destruição da cobertura vegetal, resultando em um aumento na ocorrência de desastres ecológicos e humanitários, relacionados com o clima, tais como: a erosão do solo e as grandes inundações.
Em outras palavras, o aumento da gravidade dos incêndios florestais está contribuindo para a variação climática global e a variação climática global está contribuindo para o aumento da gravidade dos incêndios florestais. Diante desse quadro, os organismos ambientais liderados pela FAO, através da EIRD - Estratégia Internacional para Redução de Desastres, e o GFMC - Centro Mundial de Monitoramento de Incêndios Florestais, têm empreendido esforços, desde 2006, para a elaboração de um documento que facilite e organize as atividades de uso e manejo do fogo em escala global, para reduzir os efeitos dos incêndios e queimadas sobre a atmosfera e, conseqüentemente, para atenuar as mudanças climáticas.
Esse documento, denominado “Código de Manejo do Fogo”, estabelece os objetivos, princípios gerais e ações estratégicas para planejar, organizar e administrar uma agência ou organização segura, efetiva e eficiente no manejo do fogo. O Código engloba todas as atividades de manejo do fogo: o sistema de alerta de incêndios (índices de perigo de incêndios); a detecção, a mobilização e combate aos incêndios florestais, e até o uso apropriado do fogo natural ou causado pelo homem, para manter os valores ecológicos; o uso do fogo para reduzir o acúmulo de combustíveis vegetais e de resíduos procedentes de atividades comerciais ou não; e a restauração e reabilitação de ecossistemas danificados por incêndios.
Outras organizações ligadas à proteção ao meio ambiente também têm buscado alternativas para manejar o fogo adequadamente, nos diversos tipos de vegetação, com a finalidade de diminuir e mitigar os impactos do fogo, principalmente sobre a atmosfera. É o caso da TNC - The Nature Conservancy, que lançou um programa em escala mundial, em 2006, sobre manejo do fogo, denominado “Iniciativa global para o manejo do fogo”, com o objetivo de apresentar uma metodologia para integrar os programas de prevenção e combate aos incêndios, de uso do fogo, de conservação da biodiversidade e recuperação das áreas queimadas.
Estes dois exemplos ilustram bem a preocupação mundial com o aumento da freqüência e intensidade dos incêndios e os efeitos decorrentes destes eventos sobre o clima da terra. E no Brasil, como os diversos setores da sociedade organizada têm enfrentado esse problema? Que iniciativas, em escala nacional, podem ser citadas como exemplos de êxito no controle dos incêndios e queimadas? Será que a dimensão deste problema é menor que nas outras regiões do mundo?
Os dados mais recentes da Rede Sul-americana de Incêndios Florestais mencionam que, na América do Sul, estima-se que ocorreram cerca de 290.000 incêndios florestais nas últimas três décadas, afetando uma área de 51,7 milhões de hectares. O problema, portanto, é grave. E o Brasil, ocupando 50% da área da América do Sul é responsável por, pelo menos, metade dessas ocorrências.
Quais os dados oficiais sobre o número de incêndios registrados e a área queimada no Brasil? Não dispomos dessa informação simples e básica para desenvolver qualquer programa de manejo do fogo. Na verdade, as dificuldades de se estruturar um programa nacional de manejo do fogo começam com a inexistência de um banco de dados ou um cadastro com informações detalhadas sobre as ocorrências de incêndios, nos diversos tipos de vegetação que cobrem o país.
Os dados oficiais sobre ocorrências de incêndios no Brasil restringem-se, exclusivamente, às unidades de conservação federais e de alguns estados. Mesmo assim, muitas vezes incompletas ou inconsistentes, devido às dificuldades de acesso aos locais atingidos. O estabelecimento de um sistema de registro de informações sobre as ocorrências de incêndios é condição prioritária para subsidiar qualquer programa nacional de manejo do fogo. Enquanto esse primeiro passo não for dado, não será possível estabelecer uma política de manejo do fogo adequada e coerente com a realidade de cada região do Brasil e, com certeza, com mais chance de êxito.